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22/10/2006
-
10h36
MARCELO BILLI
da Folha de S.Paulo
O ganhador do Prêmio Nobel de Economia deste ano, Edmund Phelps, 73, afirma que o programa Bolsa Família, do governo brasileiro, "parece correto". Para ele, "é impossível superestimar a importância da educação". O economista, professor da Universidade Columbia, viveu no Brasil durante pouco mais de um trimestre, em 1993, quando esteve na Fundação Getulio Vargas.
Conhece São Paulo, Rio de Janeiro e Bahia, mas não arrisca fazer avaliação sobre a economia brasileira. Diz Phelps que sua rotina não mudou muito desde que soube ter ganhado o prêmio de US$ 1,37 milhão e que está apenas um pouco mais ocupado "concedendo entrevistas".
Ele defende o sistema de metas de inflação, apesar de dizer que, em momentos de tensão muito grande, é razoável que o Banco Central abandone a meta temporariamente em prol de objetivos mais importantes. Inflações crônicas, que assombraram grande número de países até pelo menos a década de 1980, são um problema do passado. "As pessoas entendem que não há nada que nós podemos fazer com inflação que não possamos fazer sem inflação." Leia a seguir os principais trechos de entrevista concedida por Phelps, por telefone.
FOLHA - Como se sente um ganhador do Nobel?
EDMUND PHELPS - Eu não posso falar em geral, mas apenas de mim mesmo. Foi um grande alívio. Eu não tenho mais que pensar nisso. A vida não mudou muito. Eu estou muito ocupado dando entrevistas, continuo dando aula e tenho que planejar os próximos meses. Eu estou extremamente ocupado, só isso. Bom, eu estou sempre ocupado, mas agora eu estou muito ocupado.
FOLHA - O sr. ganhou o prêmio por trabalho que acabou sendo uma das bases da maneira como os bancos centrais de todo mundo entendem e combatem a inflação. Episódios de inflação crônica praticamente desapareceram depois dos anos 1990. Nós podemos considerar esses episódios problemas do passado?
PHELPS - Eu acho que sim, a inflação não é mais aceitável. O público não fica feliz quando os governos causam inflação. Quando a inflação sobe devido a forças de mercado, as pessoas esperam que o governo lide com a situação e combata a inflação, eliminando-a.
FOLHA - Mudou a percepção das pessoas?
PHELPS - As pessoas entendem que não há nada que nós podemos fazer com inflação que não possamos fazer sem inflação. Ela não é um instrumento útil para nada. Claro que, às vezes, é conveniente aceitar uma pequena aceleração da inflação. Desde que fique claro ser uma coisa temporária. Mas inflação crônica não é mais aceitável.
FOLHA - No Brasil, como em vários outros países emergentes, temos um sistema de metas de inflação. O sr. o considera um bom regime?
PHELPS - Eu não sei como é o regime de metas de inflação no Brasil. Minha visão é que, em tempos normais, quando nada particularmente novo tenha ocorrido e quando o nível de incerteza é normal, é perfeitamente razoável para o Banco Central seguir alguma regra de política monetária e é perfeitamente razoável que essa regra inclua uma meta de inflação, como 2%, no caso dos EUA. Mas, em períodos anormais, quando novos tipos de choque tenham ocorrido na economia e quando há grande incerteza a respeito de quais serão as conseqüências do choque, talvez o melhor seja jogar fora a regra e abandonar a meta temporariamente. Isso não significa que o BC deva encorajar a inflação durante o período, mas só que ele deve ter objetivos mais importantes naquele momento.
FOLHA - Existe uma meta muito baixa, que acabe sendo contraprodutiva, ou, quanto menor a inflação, melhor?
PHELPS - Nós não sabemos que taxa de inflação é uma taxa muito baixa. Há algumas vantagens em ter uma taxa de inflação na vizinhança de 1%, 2% ou 3% por ano. Certamente nós não queremos chegar a menos de 1% por ano. Pelo menos eu não recomendaria conduzir uma experiência para ver o que ocorre.
FOLHA - O sr. é a favor de subsídios públicos para complementar a renda de trabalhadores com salários muito baixos. No Brasil, temos um programa que dá subsídios às famílias pobres para que mantenham seus filhos na escola.
PHELPS - É um subsídio para incentivar as crianças a ficarem na escola? Parece-me correto. Eu concordo que educação é muito importante para o desenvolvimento econômico. É impossível superestimar a importância da educação. Você não pode introduzir novas tecnologias em uma economia, novos produtos, novos meios de produzir, a menos que você tenha indivíduos que tenham educação abrangente que os capacite a lidar com a inovação. Talvez, eu estou apenas fazendo uma conjectura, a falta de uma base educacional seja parte da razão pela qual o desenvolvimento econômico no Brasil não tenha ocorrido tão rápido como o esperado há 20 anos.
FOLHA - Em um dos seus artigos, o sr. argumenta que não existe prova de que redução de impostos sobre a folha de pagamento ajude a aumentar o emprego, uma idéia quase consensual no Brasil...
PHELPS - O que eu disse é que no início haveria um incentivo para as pessoas entrarem no mercado de trabalho e permanecer nele. Mas, em reposta ao aumento do salário maior, as pessoas iriam economizar mais e acumular mais riqueza. Depois, a queda nos impostos não pareceria tão boa, em relação à riqueza acumulada, quanto parecera no período em que os impostos foram cortados. Quando você olha para a Europa e vê aquelas altas taxas, você fica tentado a dizer que o problema da Europa é esse. Mas a Europa teve três décadas para se ajustar a essas taxas. Não se pode argumentar que o emprego na Europa vai mal por causa dos impostos. Você pode dizer que todos os benefícios criados pelo Estado de bem-estar formam uma criação artificial de riqueza social, que torna a vida mais confortável, mas que também tem efeitos prejudiciais ao emprego.
FOLHA - No mesmo artigo, o sr. faz críticas aos economistas que considera neoliberais...
PHELPS - Não sou a favor de um governo zero, sou a favor de subsídios para salários baixos e a favor de regulação rigorosa dos mercados. Creio que há enormes e importantes papéis que o governo tem que cumprir. Sou simplesmente a favor do capitalismo. Contra o corporativismo europeu e contra o socialismo da Europa do Leste.
Especial
Leia o que já foi publicado sobre inflação
Leia o que já foi publicado sobre Edmund Phelps
Inflação é coisa do passado, diz Nobel
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da Folha de S.Paulo
O ganhador do Prêmio Nobel de Economia deste ano, Edmund Phelps, 73, afirma que o programa Bolsa Família, do governo brasileiro, "parece correto". Para ele, "é impossível superestimar a importância da educação". O economista, professor da Universidade Columbia, viveu no Brasil durante pouco mais de um trimestre, em 1993, quando esteve na Fundação Getulio Vargas.
Conhece São Paulo, Rio de Janeiro e Bahia, mas não arrisca fazer avaliação sobre a economia brasileira. Diz Phelps que sua rotina não mudou muito desde que soube ter ganhado o prêmio de US$ 1,37 milhão e que está apenas um pouco mais ocupado "concedendo entrevistas".
Ele defende o sistema de metas de inflação, apesar de dizer que, em momentos de tensão muito grande, é razoável que o Banco Central abandone a meta temporariamente em prol de objetivos mais importantes. Inflações crônicas, que assombraram grande número de países até pelo menos a década de 1980, são um problema do passado. "As pessoas entendem que não há nada que nós podemos fazer com inflação que não possamos fazer sem inflação." Leia a seguir os principais trechos de entrevista concedida por Phelps, por telefone.
FOLHA - Como se sente um ganhador do Nobel?
EDMUND PHELPS - Eu não posso falar em geral, mas apenas de mim mesmo. Foi um grande alívio. Eu não tenho mais que pensar nisso. A vida não mudou muito. Eu estou muito ocupado dando entrevistas, continuo dando aula e tenho que planejar os próximos meses. Eu estou extremamente ocupado, só isso. Bom, eu estou sempre ocupado, mas agora eu estou muito ocupado.
FOLHA - O sr. ganhou o prêmio por trabalho que acabou sendo uma das bases da maneira como os bancos centrais de todo mundo entendem e combatem a inflação. Episódios de inflação crônica praticamente desapareceram depois dos anos 1990. Nós podemos considerar esses episódios problemas do passado?
PHELPS - Eu acho que sim, a inflação não é mais aceitável. O público não fica feliz quando os governos causam inflação. Quando a inflação sobe devido a forças de mercado, as pessoas esperam que o governo lide com a situação e combata a inflação, eliminando-a.
FOLHA - Mudou a percepção das pessoas?
PHELPS - As pessoas entendem que não há nada que nós podemos fazer com inflação que não possamos fazer sem inflação. Ela não é um instrumento útil para nada. Claro que, às vezes, é conveniente aceitar uma pequena aceleração da inflação. Desde que fique claro ser uma coisa temporária. Mas inflação crônica não é mais aceitável.
FOLHA - No Brasil, como em vários outros países emergentes, temos um sistema de metas de inflação. O sr. o considera um bom regime?
PHELPS - Eu não sei como é o regime de metas de inflação no Brasil. Minha visão é que, em tempos normais, quando nada particularmente novo tenha ocorrido e quando o nível de incerteza é normal, é perfeitamente razoável para o Banco Central seguir alguma regra de política monetária e é perfeitamente razoável que essa regra inclua uma meta de inflação, como 2%, no caso dos EUA. Mas, em períodos anormais, quando novos tipos de choque tenham ocorrido na economia e quando há grande incerteza a respeito de quais serão as conseqüências do choque, talvez o melhor seja jogar fora a regra e abandonar a meta temporariamente. Isso não significa que o BC deva encorajar a inflação durante o período, mas só que ele deve ter objetivos mais importantes naquele momento.
FOLHA - Existe uma meta muito baixa, que acabe sendo contraprodutiva, ou, quanto menor a inflação, melhor?
PHELPS - Nós não sabemos que taxa de inflação é uma taxa muito baixa. Há algumas vantagens em ter uma taxa de inflação na vizinhança de 1%, 2% ou 3% por ano. Certamente nós não queremos chegar a menos de 1% por ano. Pelo menos eu não recomendaria conduzir uma experiência para ver o que ocorre.
FOLHA - O sr. é a favor de subsídios públicos para complementar a renda de trabalhadores com salários muito baixos. No Brasil, temos um programa que dá subsídios às famílias pobres para que mantenham seus filhos na escola.
PHELPS - É um subsídio para incentivar as crianças a ficarem na escola? Parece-me correto. Eu concordo que educação é muito importante para o desenvolvimento econômico. É impossível superestimar a importância da educação. Você não pode introduzir novas tecnologias em uma economia, novos produtos, novos meios de produzir, a menos que você tenha indivíduos que tenham educação abrangente que os capacite a lidar com a inovação. Talvez, eu estou apenas fazendo uma conjectura, a falta de uma base educacional seja parte da razão pela qual o desenvolvimento econômico no Brasil não tenha ocorrido tão rápido como o esperado há 20 anos.
FOLHA - Em um dos seus artigos, o sr. argumenta que não existe prova de que redução de impostos sobre a folha de pagamento ajude a aumentar o emprego, uma idéia quase consensual no Brasil...
PHELPS - O que eu disse é que no início haveria um incentivo para as pessoas entrarem no mercado de trabalho e permanecer nele. Mas, em reposta ao aumento do salário maior, as pessoas iriam economizar mais e acumular mais riqueza. Depois, a queda nos impostos não pareceria tão boa, em relação à riqueza acumulada, quanto parecera no período em que os impostos foram cortados. Quando você olha para a Europa e vê aquelas altas taxas, você fica tentado a dizer que o problema da Europa é esse. Mas a Europa teve três décadas para se ajustar a essas taxas. Não se pode argumentar que o emprego na Europa vai mal por causa dos impostos. Você pode dizer que todos os benefícios criados pelo Estado de bem-estar formam uma criação artificial de riqueza social, que torna a vida mais confortável, mas que também tem efeitos prejudiciais ao emprego.
FOLHA - No mesmo artigo, o sr. faz críticas aos economistas que considera neoliberais...
PHELPS - Não sou a favor de um governo zero, sou a favor de subsídios para salários baixos e a favor de regulação rigorosa dos mercados. Creio que há enormes e importantes papéis que o governo tem que cumprir. Sou simplesmente a favor do capitalismo. Contra o corporativismo europeu e contra o socialismo da Europa do Leste.
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