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16/05/2004
-
03h20
DÉBORA YURI
da Revista da Folha de S.Paulo
Para ir bem numa prova, o aluno precisa:
a. Estudar
b. Ter aparelho de celular
c. Usar óculos de sol
d. Comprar um palmtop ou calculadora
e. Qualquer uma das anteriores
Acertou quem cravou a alternativa "e" por mais estapafúrdia que ela pareça: todas as opções citadas acima estão valendo na busca daquilo que as gerações passadas chamavam de "nota azul". É a velha cola que todo mundo conhece, mas agora em nova roupagem.
A geração atual não abandonou os métodos mais rudimentares, como o papel escondido no estojo e fórmulas rabiscadas no tênis, mas ganhou o reforço da tecnologia --celulares que enviam textos e fotos, computadores de mão e calculadoras que transmitem mensagens por raios infravermelhos e o universo inesgotável de trabalhos que podem ser garimpados na internet.
"Colar hoje não é mais "pescoçar" a prova do outro. Existe a evolução da espécie", diz Alexandre*, 15, aluno do 1º ano do colégio Bandeirantes, que costuma receber o gabarito dos testes pelo celular. Quem envia é um colega que sai da sala antes e passa as respostas do banheiro da escola ou de uma lanchonete próxima.
O Bandeirantes, é bom dizer, proíbe que os alunos fiquem com celulares durante as provas. "Mas nós deixamos escondido no bolso. (...) Nenhum professor nos revista", conta Alexandre.
Nos trabalhos extraclasse, sai o telefone e entra a internet, já que é possível achar textos sobre qualquer tema com uns poucos cliques de mouse. "É a coisa mais comum: copiam, colam e imprimem o trabalho. Uma vez, pedi uma pesquisa sobre instrumentos náuticos e recebi seis textos exatamente iguais numa mesma classe", conta Denise Mendes, 40, professora do colégio Pentágono.
A trapaça hi-tech não é um fenômeno brasileiro. Nos EUA, o assunto virou motivo para uma campanha nacional anticola e foi parar nas páginas --e até na capa-- de grandes jornais. "Colar com aparelhos eletrônicos é a última moda nas salas de aula americanas", disse Peter McLaren, 56, professor da Escola de Educação da UCLA (Universidade da Califórnia em Los Angeles) à Revista.
Cardápio
Em escola pública, o dinheiro é mais curto e o celular, menos usado. "Não tenho grana para isso. Fico nas minhas colinhas antigas: escrevo nas pernas e uso calça que abre do lado, grudo um papel nas costas da menina da frente e cubro", conta Marina*, 16, da Escola Estadual Fernão Dias.
Depois de 11 anos colando, nada mais normal que a prática chegue também à faculdade. Na FGV (Fundação Getúlio Vargas), o computador de mão faz a festa. "A gente coloca capítulos inteiros no Palm e depois faz transferência de arquivos por infravermelho para os outros", conta Cristina*, 26, que faz especialização em administração.
Pais & mestres
De tão disseminado, o hábito de colar não chega a enfrentar grandes obstáculos éticos ou atrair muita condenação, nem mesmo entre os pais. "Não dá para evitar. (...) Acho até que faz parte do perfil do adolescente, de desafiar as regras", acredita a relações-públicas Regina H. da Silva Botelho, 45, mãe de dois adolescentes.
Para muitos educadores, a trapaça deve ser creditada aos equívocos da metodologia de ensino. "O conhecimento não precisa ficar retido na memória. Ele está no livro e pode ser consultado", diz o pedagogo Antonio G. da Costa, 54, que já trabalhou em projetos do Unicef (órgão da ONU).
Muitos educadores, porém, não acreditam na possibilidade de a escola funcionar sem provas. "A nota tem de ser aplicada conforme o potencial do aluno, e a prova ainda é a melhor forma de avaliá-lo", diz Myriam Tricate, 61, diretora do colégio Magno.
Longe das discussões "sérias", a cola é encarada pelos estudantes como algo comum no cotidiano e que poupa tempo para aproveitar o presente. "Aqui na Poli, ou você estuda ou vive. A gente corta no meio, tenta fazer os dois." Nem ele nem seus colegas acreditam que isso vá interferir em suas carreiras. "Essas fórmulas estão no livro, você não precisa decorar", diz Cláudio*, aluno da USP.
* Nomes trocados para preservar os personagens ouvidos
Colar ficou mais fácil com as novas tecnologias
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da Revista da Folha de S.Paulo
Para ir bem numa prova, o aluno precisa:
a. Estudar
b. Ter aparelho de celular
c. Usar óculos de sol
d. Comprar um palmtop ou calculadora
e. Qualquer uma das anteriores
Acertou quem cravou a alternativa "e" por mais estapafúrdia que ela pareça: todas as opções citadas acima estão valendo na busca daquilo que as gerações passadas chamavam de "nota azul". É a velha cola que todo mundo conhece, mas agora em nova roupagem.
A geração atual não abandonou os métodos mais rudimentares, como o papel escondido no estojo e fórmulas rabiscadas no tênis, mas ganhou o reforço da tecnologia --celulares que enviam textos e fotos, computadores de mão e calculadoras que transmitem mensagens por raios infravermelhos e o universo inesgotável de trabalhos que podem ser garimpados na internet.
"Colar hoje não é mais "pescoçar" a prova do outro. Existe a evolução da espécie", diz Alexandre*, 15, aluno do 1º ano do colégio Bandeirantes, que costuma receber o gabarito dos testes pelo celular. Quem envia é um colega que sai da sala antes e passa as respostas do banheiro da escola ou de uma lanchonete próxima.
O Bandeirantes, é bom dizer, proíbe que os alunos fiquem com celulares durante as provas. "Mas nós deixamos escondido no bolso. (...) Nenhum professor nos revista", conta Alexandre.
Nos trabalhos extraclasse, sai o telefone e entra a internet, já que é possível achar textos sobre qualquer tema com uns poucos cliques de mouse. "É a coisa mais comum: copiam, colam e imprimem o trabalho. Uma vez, pedi uma pesquisa sobre instrumentos náuticos e recebi seis textos exatamente iguais numa mesma classe", conta Denise Mendes, 40, professora do colégio Pentágono.
A trapaça hi-tech não é um fenômeno brasileiro. Nos EUA, o assunto virou motivo para uma campanha nacional anticola e foi parar nas páginas --e até na capa-- de grandes jornais. "Colar com aparelhos eletrônicos é a última moda nas salas de aula americanas", disse Peter McLaren, 56, professor da Escola de Educação da UCLA (Universidade da Califórnia em Los Angeles) à Revista.
Cardápio
Em escola pública, o dinheiro é mais curto e o celular, menos usado. "Não tenho grana para isso. Fico nas minhas colinhas antigas: escrevo nas pernas e uso calça que abre do lado, grudo um papel nas costas da menina da frente e cubro", conta Marina*, 16, da Escola Estadual Fernão Dias.
Depois de 11 anos colando, nada mais normal que a prática chegue também à faculdade. Na FGV (Fundação Getúlio Vargas), o computador de mão faz a festa. "A gente coloca capítulos inteiros no Palm e depois faz transferência de arquivos por infravermelho para os outros", conta Cristina*, 26, que faz especialização em administração.
Pais & mestres
De tão disseminado, o hábito de colar não chega a enfrentar grandes obstáculos éticos ou atrair muita condenação, nem mesmo entre os pais. "Não dá para evitar. (...) Acho até que faz parte do perfil do adolescente, de desafiar as regras", acredita a relações-públicas Regina H. da Silva Botelho, 45, mãe de dois adolescentes.
Para muitos educadores, a trapaça deve ser creditada aos equívocos da metodologia de ensino. "O conhecimento não precisa ficar retido na memória. Ele está no livro e pode ser consultado", diz o pedagogo Antonio G. da Costa, 54, que já trabalhou em projetos do Unicef (órgão da ONU).
Muitos educadores, porém, não acreditam na possibilidade de a escola funcionar sem provas. "A nota tem de ser aplicada conforme o potencial do aluno, e a prova ainda é a melhor forma de avaliá-lo", diz Myriam Tricate, 61, diretora do colégio Magno.
Longe das discussões "sérias", a cola é encarada pelos estudantes como algo comum no cotidiano e que poupa tempo para aproveitar o presente. "Aqui na Poli, ou você estuda ou vive. A gente corta no meio, tenta fazer os dois." Nem ele nem seus colegas acreditam que isso vá interferir em suas carreiras. "Essas fórmulas estão no livro, você não precisa decorar", diz Cláudio*, aluno da USP.
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