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10/07/2002 - 02h48

Beth Carvalho e Lobão respondem a artigo do cantor Caetano Veloso

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BETH CARVALHO
LOBÃO
especial para a Folha

A numeração de discos é uma luta histórica e amarga da classe artística há mais de 30 anos, que gerou uma série de episódios no sentido de regulamentá-la, seguidos proporcionalmente de outros tantos no sentido de coibi-la violentamente, tendo inclusive um veto do então presidente Médici no apagar das luzes do seu mandato, tornando a reação à lei da numeração um resquício sombrio da ditadura militar.

A intransigência monomaníaca da indústria fonográfica em reprimir a ampla discussão do universo representado pelos direitos autorais sempre foi de conhecimento público.

Antes de entrar no mérito da questão propriamente dita, não há como deixar de lado a seguinte pergunta: como nosso colega Caetano Veloso, que, ao deixar incluir seu nome na lista de apoio à numeração de CDs, subscrevendo nossa representatividade, vem agora a público [em artigo publicado na Ilustrada no último dia 6 de julho] protestar veementemente contra esta empreitada, sem ao menos ter tido a elegância de retribuir às nossas circulares, aos nossos e-mails, aos nossos exaustivos telefonemas enfim, rejeitando todos e quaisquer esclarecimentos e premissas dessa árdua e complexa luta que é a efetivação desse projeto de lei?

E com o agravante de sempre frisarmos a todos os participantes que a união da classe é de fundamental importância e que todos devem ser esclarecidos sobre os acontecimentos, sobre tudo o que está se passando, com o compromisso inequívoco de não emitir nenhuma opinião pública sem antes falar com nosso núcleo para esclarecer qualquer dúvida ou discordância. Portanto é inaceitável a explicação de Caetano Veloso sobre o seu "parcial" entendimento da proposta.

Vamos aos fatos: o corpo do projeto de lei da deputada federal Tânia Soares (PC do B-SE) faz menção apenas à obrigação de numerar obras artísticas, literárias e científicas e quanto à assinatura do autor. É evidente que não pode se tratar de autógrafos distribuídos nos milhares de exemplares firmados de próprio punho. Isso seria absurdo.

Há meios tecnológicos de fazê-lo. Será que o presidente do Banco Central fica em seu gabinete assinando as milhões de cédulas que circulam no país? É nessa ingenuidade que querem insistir?

É muito interessante observar Caetano preocupado em dar importância à justificação do projeto de lei, como um pintor mais preocupado com a moldura do que com o próprio quadro em si.

É a lei e só a lei e seus efeitos posteriores que nos interessam e indubitavelmente nos beneficiarão. Se há idiossincrasias na justificação do projeto, isso não nos concerne, pois se tratam de algo que não será utilizado pela lei e, portanto, se tornam absolutamente irrelevantes no presente momento do ponto de vista legislativo.

Mesmo assim, é de admirar a indignação de Caetano mediante a suspeita de irregularidades na indústria fonográfica. Ora, é exatamente por falta da devida instrumentação jurídica que ficamos eternamente "suspeitando".
Quanto ao fato de estarmos ou não seguros de a lei ser eficaz, bem, sem ela é evidente que tudo continuará como está.

Da forma com que vem sendo explicado exaustivamente à classe artística e à opinião pública em geral, existem várias empresas que possuem métodos de numeração já demonstrados, todos com perfeita exequibilidade. Por que não tentar levar a cabo algo que beneficia tanto o direito autoral e legitima inclusive a luta das gravadoras contra a pirataria? Pirataria que certamente nós também repudiamos.

Realmente não se numera discos nos Estados Unidos, isso também tem sido arguido, contudo foi apenas uma justificação ao projeto de lei que, como disse, não influenciará no desdobramento posterior dos efeitos da lei.

Existe uma certa resistência internacional contra a numeração, pois quem controla esse negócio são as chamadas "big five" _as cinco grandes gravadoras onipresentes em todo o planeta. Em razão disso, reunimo-nos com o governador do Rio Grande do Sul, Olívio Dutra, e pleiteamos a criação do Fórum Mundial da Música, a ser realizado já em 2003 no seio do Fórum Mundial Social, para um amplo debate sobre direito autoral internacional, identidade cultural e tudo o que está relacionado ao show business.

Você, Caetano, desde já está convidado, juntamente com as grandes gravadoras. Será um prazer tê-lo conosco para conversar com a sua classe. O diálogo é imprescindível e não há nada de rebelde ou radical em exigir mais respeito e mais direitos para a nossa classe.

Infelizmente há indícios em todo o mundo de suspeitas contra a indústria fonográfica.

Quanto a seu pedido de veto da lei ao presidente da República, isso causou-nos espanto, dado que desde sempre você foi um dos defensores da numeração.

Nós temos mais conhecimento do processo até aqui, uma enorme responsabilidade nas costas e ninguém é criança para ser admoestado dessa maneira, sem que tenha havido nem sequer um pedido de esclarecimento a nós sobre o assunto.

A numeração de CDs é viável sim! É barata e factível. A lei pode e deve ser aperfeiçoada e suplementada. É evidente que há que se abrir licitações, analisar métodos, aperfeiçoar logísticas sem a inferência do terrorismo de um suposto rigor pétreo de um só artigo (o projeto de lei) que se resume a duas frases. Quantos parlamentares, políticos e advogados já não consultamos nesse processo? Será que a Câmara dos Deputados, o Senado, o Ministério da Justiça, o Ministério da Cultura e todos os técnicos que analisam o processo são ingênuos ou ineptos?

Caetano Veloso, você que é tão afeito a leis de trânsito não percebe que nós artistas somos pedestres felizes diante da possibilidade de atravessar uma avenida de ameaças com o sinal verde que a lei nos acena? Por que você quer avançar o sinal vermelho na carona de uma jamanta da indústria do disco? Não somos heróis, Caetano, estamos apenas reivindicando um legítimo direito. Um direito que é de todos nós.

Dê sua opinião:
  • Você acha que a numeração acaba com a pirataria?


  • Leia o artigo de Caetano Veloso:
  • Não quero fazer parte dessa turma, diz Caetano Veloso

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