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31/01/2003 - 17h30

Fafá de Belém mergulha nas raízes com novo CD

AUGUSTO PINHEIRO
da Folha Online

No CD "O Canto das Águas", lançado pela Secult (Secretaria de Cultura do Pará) e pela Warner, Fafá de Belém mergulhou nas suas raízes paraenses.

Elza Lima/Reprodução
Foto de Fafá de Belém que está no encarte do CD
A cantora interpreta músicas de ilustres compositores do Estado amazônico, como Sebastião Tapajós, Nilson Chaves, Paulo André e Ruy Barata, Nego Nelson e Waldemar Henrique.

Entre elas, algumas já gravadas por Fafá, como "Este Rio É Minha Rua", que virou hino não-oificial do Pará, e "Pauapixuna". "A música paraense tem o movimento das águas", diz a cantora.

O CD abarca do erudito folclórico de Waldemar Henrique ("Uirapuru"), um dos maiores compositores do Pará, ao carimbó (ritmo local com influência indígena) mais rasgado, como na homenagem ao Mestre Verequete, passando por bolero e merengue.

O encarte de luxo traz belas fotos da cantora na ilha do Marajó, coloridas e preto-e-branco, com assinatura de Elza Lima. O figurino, cheio de referências regionais, é do conterrâneo André Lima, que apresentou hoje sua coleção na São Paulo Fashion Week.

Fafá, que lançou também o CD "Piano e Voz", se diz plural. "Eu não sou uma pessoa linear, sou uma confusão", afirma, com seu bom humor habitual.

Leia a seguir a entrevista concedida, por telefone, à Folha Online.

Folha Online - Por que a volta às raízes?
Fafá de Belém
- Chega uma hora em que o cordão umbilical atinge tal tensão que o único caminho é o do retorno, do reencontro. Essa minha caminhada começa com "Vermelho", quando eu reencontro a Amazônia através de Manaus, e vai me levando de volta à intimidade da terra. E esse projeto do Paulo Chaves [secretário de Cultura do Pará], de registro da música de compositores paraenses, é fabuloso. Já houve registros de Waldemar Henrique, Maestro Cupijó, Verequete, Sebastião Tapajós, Jane Duboc, do carimbó de Marapanim, do Mestre Lucindo. Nós discutimos muito sobre qual seria o meu projeto. Primeiro, seria cantar Belém. Depois, cantar sob o ponto de vista de vários autores do Pará. Até que chegamos a esse que eu acho o mais completo e que me emocionou muito fazer.

Folha Online - Foi difícil escolher o repertório?
Fafá
- Muito difícil. Quem finalizou o repertório foi o Roberto Santana, produtor do meu primeiro disco, o cara que me descobriu. Eu entreguei na mão dele porque para mim era muito difícil finalizar esse repertório, era muita coisa, muita emoção, muita gente. Levei pra ele o grosso, e ele fechou o repertório.

Folha Online - Você se preocupou em ter uma diversidade de ritmos?
Fafá
- Minha preocupação era que não ficasse um CD regional, mas um disco de compositores paraenses, sem nenhum componente "folclórico" ou "regional". Então, você tem a cumbia, o merengue, o bolero, o carimbó. Não é disco de música regional. Isso que é genial. É um disco de compositores paraenses. Essa é a grandeza desse disco.

Folha Online - Algumas das canções do CD já haviam sido gravadas por você, como "Este Rio É Minha Rua" e "Pauapixuna". Houve um cuidado em interpretá-las de uma maneira diferente?
Fafá
- De fazer um outro olhar, porque se passaram 26 anos desde que eu gravei as músicas. De trazer um outro olhar mesmo para realizá-las.

Folha Online - O que mais lhe seduz na música paraense?
Fafá
- É um componente muito forte: nós temos em tudo o movimento das águas. Nós sempre temos na navegação melódica um movimento de águas. Dois dos maiores autores paraenses, que me perdoem todos os outros, são Paulo André e Ruy Barata, a dupla mais perfeita. E eles são a força das águas.

Folha Online - Você lançou o CD com uma temporada de shows no Theatro da Paz, em Belém. Você pretende viajar pelo Brasil com esse espetáculo?
Fafá
- Isso faz parte de um projeto, mas estamos precisando de um patrocinador, porque não é um espetáculo barato. Ele só faz sentido se for apresentado da forma que foi montado lá [em Belém], com 23 músicos, cenário, figurinos, tudo do jeito que foi feito lá.

Folha Online - Você acha importante um projeto como esse para divulgar a música paraense pelo Brasil?
Fafá
- Acho fundamental fazer uma turnê com esse espetáculo. Mas tem que haver captação de recursos, e a gente está pensando em correr atrás.

Folha Online - Você acha que o Brasil ainda desconhece a Amazônia e, mais especificamente, a cultura e a música amazônicas?
Fafá
- Completamente. O Brasil ainda confunde a Amazônia com a região Nordeste, mistura tudo. Não sabe direito o que é, não conhece a nossa culinária. Acho que o europeu conhece mais.

Folha Online - Conhece mais também os compositores paraenses...
Fafá
- O Nilson Chaves, por exemplo, faz turnês na França. O Sebastião Tapajós faz na Alemanha.

Folha Online - Waldemar Henrique é conhecido na Europa...
Fafá
- No mundo todo, menos aqui. Acho que é hora de começar a olhar com carinho para esse autor.

Folha Online - Você acha que o ciclo da borracha (1850-1910) deixou alguma marca na música paraense?
Fafá
- A fase áurea da borracha nos trouxe toda a influência erudita. Foi o que nos fez ver as óperas, os balés etc. Isso tudo obviamente se misturou. Assim como a Segunda Guerra Mundial nos trouxe o jazz. Então, houve essa mistura feliz porque nós somos muito receptivos.

Folha Online - E tem a influência caribenha também...
Fafá
- Essa está ali, pulsa com a gente. Mas eu acho que as duas influências mais importantes foram a música erudita, européia, que veio no final do século 19, e depois o jazz, a música americana, que veio no final dos anos 40. Então isso entra fundamentalmente na nossa formação musical.

Folha Online - Você tem acompanhado a nova geração de músicos, compositores e cantores paraenses?
Fafá
- Eu tenho ido muito a Belém, então eu vejo muita gente. Vejo a Andréa Pinheiro cantando muito bem. Gosto muito do Trio Manari, que é maravilhoso, faz uma percussão fantástica. O Almirzinho Gabriel tem um disco muito interessante também. Acho que, junto com os que já estavam, que são grandes compositores, como Nilson Chaves, Paulo André, Nego Nelson, tem uma nova leva. E hoje nós temos também onde ver essa nova leva de compositores, coisa que não existia há oito anos.

Folha Online - Você também lançou o CD "Piano e Voz", mais intimista. Como você conciliou o lançamento de dois trabalhos com propostas diferentes?
Fafá
- Porque eu sou isso, sou muito plural. Eu sou uma mistura de coisas, eu sou essa confusão mesmo. Foi muito natural cantar "Voz e Piano" e cantar "O Canto das Águas". Eu nasci no meio da música. Não havia preconceito, as pessoas tinham prazer de cantar. Não tinha "isso eu toco", "isso eu não toco". Acho que isso é fundamental, essa pluralidade na minha carreira, que não tem nada de linear. Assim como eu não tenho nada de linear. Eu não sou uma pessoa linear. Pelo contrário, sou plural, sou uma confusão, sou politicamente incorreta [risos]. Sou uma mistura de coisas. Acho que é isso que dá esse meu tom. Então, ter feito esse CD, sem nenhuma modéstia, foi uma coragem imensa, um desafio.

Folha Online - Você se refere ao "Piano e Voz"?
Fafá
- Eu falo de lançar os dois juntos. Isso que foi a grande ousadia. O "Piano e Voz", por exemplo. Como eu cantei a vida inteira? Acompanhada de instrumentos. Desde os 9 anos, em Salinas [balneário paraense], a gente passava oito, dez horas tocando com instrumento musical. Isso para mim é muito corriqueiro. Então, o nosso olhar, quando se pensou no "Piano e Voz", era diminuir o tamanho do "Maria de Fátima", o CD anterior, com orquestra, mas mantendo a graça e a delicadeza.
 

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