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15/04/2003 - 03h05

Gil apóia projeto de criminalização do jabá; rádios se opõem

PEDRO ALEXANDRE SANCHES
LAURA MATTOS


da Folha de S.Paulo

Está em gestação um projeto de lei que irá agitar a indústria fonográfica e as rádios: a criminalização do jabá (execução de música mediante pagamento).

A proposta está sendo elaborada pelo deputado federal Fernando Ferro (PT-PE) e deverá ser apresentada ao Congresso ainda no primeiro semestre deste ano.

O objetivo do parlamentar é proibir que as emissoras cobrem para inserir uma música em sua programação, o que, segundo ele, tira o espaço de artistas iniciantes.

A iniciativa já ganhou o apoio do ministro Gilberto Gil (Cultura) e a oposição das rádios, que lucram com esse esquema de divulgação.

Segundo a Folha apurou, grandes redes de rádio chegam a cobrar até R$ 20 mil para inserir uma música de lançamento em sua programação. As gravadoras negam a existência de jabá, e a Associação Brasileira dos Produtores de Discos, que as congrega, afirma que não se pronuncia sobre o assunto porque o projeto de lei ainda não existe.

Entre artistas consultados pela reportagem, a maioria adota postura cautelosa, mas com posicionamento a princípio favorável à criação da lei. "O bacana do momento é que se sente finalmente um movimento de representação efetiva das demandas da classe musical. Não é à toa que estão retirando os esqueletos de dentro dos armários", diz Lulu Santos.

No ano passado, o cantor havia criticado a lei que pedia a numeração dos CDs, visando um maior controle da indústria fonográfica (a regra foi aprovada e entra em vigor no próximo dia 22).

Lenine, um dos que encamparam a luta pela numeração, hoje fica do mesmo lado de Lulu:

"Sou completamente contra o jabá. As concessões de rádios têm regras, e uma delas é que o veículo pode comercializar seus intervalos. Negociar o tempo destinado à veiculação de trabalho artístico são outros quinhentos".

O compositor embute em sua crítica a questão de as rádios veicularem música sem avisar seus ouvintes de que se trata de matéria paga, às vezes até disfarçando-a de parada de sucessos.

Os termos da lei do jabaculê estão sendo discutidos com Lobão, já conhecido pela oposição a essa prática, comum em AMs e FMs. O músico diz que quer incluir na redação do projeto "a criminalização do jabá, designando punições severas como multa, perda de concessão da emissora e prisão".

Na semana passada, Lobão apresentou a proposta do projeto de lei a Gilberto Gil e obteve seu aval. O assunto foi debatido numa reunião de exposição dos primeiros cem dias de governo para a classe artística, na segunda-feira da semana passada, no Rio.

"Muito bem, Lobão, você está um garotão", brincou Gil, quando o cantor apresentou, dentre vários planos para a cultura, a intenção de coibir o jabá.

O ministro, segundo sua assessoria de imprensa, demonstrou apoio ao projeto, principalmente porque quer estimular os artistas a se mobilizar e a propor soluções para o que consideram problemas do meio.
A aprovação de Gil também selou a reconciliação entre ele e Lobão, que havia criticado sua escolha para o Ministério da Cultura.

Merchandising

O deputado Fernando Ferro afirmou à Folha que o problema do jabá é que ele força o consumo na indústria fonográfica. "Os ouvintes consomem uma operação financeira, e não uma opção de programação."

Além do pagamento informal de jabá, Ferro rejeita também os métodos mais modernos do esquema, a chamada "verba de divulgação", paga pelas gravadoras às rádios com nota fiscal.

"Esse é um nome cínico dado à mesma operação, que força mercados e exclui artistas que não tenham estrutura para tanta concorrência", afirmou.

Segundo ele, as rádios teriam pelo menos a obrigação de deixar claro que determinada música está sendo tocada mediante pagamento. "Seria uma maneira de dividir o espaço editorial do publicitário, deixando claro que a seleção da música foi resultado de negociação financeira."

Antonio Rosa Neto, presidente do GPR (Grupo dos Profissionais do Rádio) não concorda com a separação e compara o jabá de rádio ao merchandising nas novelas.

"Se o consumidor souber que alguém pagou para aquele produto entrar na história, a propaganda perde a força. Da mesma forma seria se o ouvinte soubesse que uma música está no ar porque houve pagamento."
Para o parlamentar, essa distinção seria obrigatória, principalmente pelo fato de TVs e rádios serem concessões públicas.

Rosa Neto também refuta esse argumento. "Emissoras são empresas e têm de faturar."

Ferro afirma que vai se basear na legislação de outros países em relação ao jabá. Ele já pediu o texto da lei norte-americana à embaixada dos Estados Unidos, onde a prática é chamada "payola".

Lá, ficou célebre a investigação promovida nos anos 60 pelo Congresso Nacional contra empresários musicais como Dick Clark e DJs como Alan Freed, que haviam desempenhado papel fundamental na ascensão do rock'n'roll e do rhythm'n'blues nas paradas.

Os congressistas estavam convencidos de que as rádios só tocavam rock porque eram subornadas com dinheiro -ou seja, jabá. Investigado, Alan Freed declarou-se culpado no tribunal, teve sua carreira arruinada e abriu precedente para um controle rigoroso da questão no país.
 

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