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28/04/2003 - 03h39

Rogério Duarte reúne escritos inéditos em livro "Tropicaos"

PEDRO ALEXANDRE SANCHES
da Folha de S.Paulo

"Eu sou o tropicalismo." A frase vaidosa não é de Caetano Veloso nem de Gilberto Gil, mas do artista gráfico, poeta, professor universitário e escritor também baiano Rogério Duarte, 64.

Nem é assim tão vaidosa. Se o tropicalismo for de fato Rogério Duarte, será também a curva que marca sua própria história pessoal. De ícone pop de sucesso como artista gráfico entre 63 e 68, passou a torturado como agitador comunista pelo regime militar, banido nas "matas baianas" pelo AI-5, esquizofrênico internado em hospícios nos 70, antiícone do ostracismo daí por diante.

Citado por Elio Gaspari no livro "A Ditadura Envergonhada" como co-protagonista de um dos episódios-símbolo que conduziriam ao terror pós-AI-5, Duarte publica agora pela primeira vez testemunho de punho próprio.

No livro "Tropicaos", reúne fragmentos e reconstituições de uma extensa obra literária inédita em que, tomado de medo da perseguição militar, ele ateou fogo no início dos anos 70.

Daquilo só restou o mais importante: um depoimento sobre a prisão e a tortura escrito no calor da hora, que só sobreviveu à fogueira porque havia sido antes confiado, sigilosamente, ao psicanalista Hélio Pellegrino.

Colocando-se num meio de caminho entre os tropicalistas mortos (Torquato Neto, Hélio Oiticica) e os "ricos" (Caetano e Gil), Rogério Duarte defende poeticamente a tese de que o verdadeiro tropicalismo nem chegou a acontecer, reprimido e assassinado que foi pelo AI-5. Leia a seguir trechos de sua entrevista à Folha, por telefone, de Salvador.

Folha - Você teve que ser convencido a transformar seus escritos num livro?
Rogério Duarte -
É, para dizer a verdade acho aquilo tudo um monte de baboseira. Não dou o menor valor àquilo. Tive uma obra literária à qual me dediquei profundamente até uma certa época. Quando fui preso e obrigado, por medo da repressão, a queimar tudo o que havia escrito, restaram apenas fragmentos. Aquilo é uma ruína (ri).

Folha - Por que você queimou?
Duarte -
Foi uma espécie de repressão introjetada, não um medo direto de que os militares descobrissem aquilo. Simplesmente fiz um círculo de pólvora e queimei tudo. Foi um ato de automutilação, talvez determinado pela introjeção da própria ditadura.

Também minha obra gráfica é de fragmentos. Ela foi destruída nessa época, dessa vez não por mim. Eu fazia todos os cartazes políticos da União Nacional dos Estudantes, agitação e propaganda para jornais operários. Deixei tudo isso na mão de um parente que nem quero mencionar. Achou que aquilo podia sujar a barra dele.

Com o AI-5 fui banido, vivi em completa clandestinidade na Bahia entre 68 e 70. Voltando ao Rio, passei por internações em hospícios e uma porção de coisas que o livro narra. Sou um cara destruído pela ditadura, mesmo, pelo menos em termos da minha obra.

Leia mais:
  • Duarte define Caetano e Gil como colegas "ricos"
  • Dor e poesia sem pieguice dão tom de "Tropicaos"

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