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23/05/2003
-
09h23
do Guia da Folha
O trabalho mais recente do cineasta Spike Lee, "A Última Noite", começa arrepiando: os créditos iniciais surgem em meio aos canhões de luz que marcam o vazio deixado pelo World Trade Center. Em combinação com a levada jazzística e hip hop da trilha sonora do trompetista Terence Blanchard, a abertura já indica que a Nova York aqui é a sobrevivente. E o cinema ainda registrou pouco essa cidade assustada e ensimesmada.
Essa é uma das melhores obras de Lee. É cinema bem narrado, de imagens vigorosas e temas contundentes. Como o título brasileiro evidencia melhor do que o original ("A 25ª Hora"), a ação se passa numa única noite. É a última em liberdade de Monty Brogan (Edward Norton, de "Clube da Luta") --na manhã seguinte, ele passa a cumprir pena de sete anos por tráfico de drogas. Em suas últimas horas, ele tenta desamarrar todos os nós de sua vida.
Baseado em romance de David Benioff, o roteiro do próprio arquiteta um expressivo drama de redenção. Essa via-sacra traduz o espírito das coisas na "grande maçã mordida". Há um delírio sintomático, perto do final, no qual Brogan declara seu ódio a todos os cidadãos nova-iorquinos. É a irascibilidade típica de Lee. Mas ele está mais conciliatório. Sinal de maturidade?
A cidade de Nova York, registrada aqui entre a poesia cool de "Manhattan" e o capitalismo selvagem de "Wall Street", faz parte da obra de Lee e serve de fundo para seu segundo drama "branco" --o primeiro é o também admirável "O Verão de Sam" (99). E mais até do que neste filme, "A Última Noite" se beneficia do elenco. Norton, co-produtor ao lado de Tobey Maguire ("Homem-Aranha"), é responsável por tirar o projeto do papel. Brogan é mais um personagem poderoso em sua galeria. Ele é coadjuvado com brilho por nomes como Brian Cox ("X-Men 2") e Philip Seymour Hoffman ("Embriagado de Amor").
Há concessões à estereotipia --a caracterização dos "vilões" traficantes-- e o final ameaça resvalar no melodrama religioso. Mas texto e direção seguram a onda e fecham essa obra de absoluta contemporaneidade com chave de ouro.
Spike Lee retrata Nova York pós-atentado em "A Última Noite"
CHRISTIAN PETERMANNdo Guia da Folha
O trabalho mais recente do cineasta Spike Lee, "A Última Noite", começa arrepiando: os créditos iniciais surgem em meio aos canhões de luz que marcam o vazio deixado pelo World Trade Center. Em combinação com a levada jazzística e hip hop da trilha sonora do trompetista Terence Blanchard, a abertura já indica que a Nova York aqui é a sobrevivente. E o cinema ainda registrou pouco essa cidade assustada e ensimesmada.
Essa é uma das melhores obras de Lee. É cinema bem narrado, de imagens vigorosas e temas contundentes. Como o título brasileiro evidencia melhor do que o original ("A 25ª Hora"), a ação se passa numa única noite. É a última em liberdade de Monty Brogan (Edward Norton, de "Clube da Luta") --na manhã seguinte, ele passa a cumprir pena de sete anos por tráfico de drogas. Em suas últimas horas, ele tenta desamarrar todos os nós de sua vida.
Baseado em romance de David Benioff, o roteiro do próprio arquiteta um expressivo drama de redenção. Essa via-sacra traduz o espírito das coisas na "grande maçã mordida". Há um delírio sintomático, perto do final, no qual Brogan declara seu ódio a todos os cidadãos nova-iorquinos. É a irascibilidade típica de Lee. Mas ele está mais conciliatório. Sinal de maturidade?
A cidade de Nova York, registrada aqui entre a poesia cool de "Manhattan" e o capitalismo selvagem de "Wall Street", faz parte da obra de Lee e serve de fundo para seu segundo drama "branco" --o primeiro é o também admirável "O Verão de Sam" (99). E mais até do que neste filme, "A Última Noite" se beneficia do elenco. Norton, co-produtor ao lado de Tobey Maguire ("Homem-Aranha"), é responsável por tirar o projeto do papel. Brogan é mais um personagem poderoso em sua galeria. Ele é coadjuvado com brilho por nomes como Brian Cox ("X-Men 2") e Philip Seymour Hoffman ("Embriagado de Amor").
Há concessões à estereotipia --a caracterização dos "vilões" traficantes-- e o final ameaça resvalar no melodrama religioso. Mas texto e direção seguram a onda e fecham essa obra de absoluta contemporaneidade com chave de ouro.
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