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13/07/2004 - 03h16

Ex-baixista do Blondie revê anos de paz e amor

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ALEXANDRE MATIAS
free-lance para a Folha

Os Beatles na Índia, Mick Jagger com o peito tatuado no programa "Rock'n'Roll Circus", Timothy Leary usando o "Livro Tibetano dos Mortos" como base de seu "A Experiência Psicodélica", Jim Morrison escolhendo o nome de seu grupo a partir do livro "As Portas da Percepção" de Aldous Huxley, hippies celebrando a natureza coletivamente. Meros flashbacks dos anos 60? Não é isso que vê Gary Lachman.

Ex-baixista do grupo Blondie (quando era conhecido como Gary Valentine), Lachman revê os anos de paz e amor com olhos pouco deslumbrados no livro "Turn Off Your Mind - The Mystic Sixties and the Dark Side of the Age of Aquarius" (Desligue Sua Mente - Os Místicos Anos 60 e o Lado Obscuro da Era de Aquário). E remonta a psicodelia dos anos 60 não como o caleidoscópio tecnicolor que entrou para a história do pop, mas como um lento e avassalador resgate do ocultismo, relacionando os hippies com a nova geração vislumbrada por Madame Blavatsky no fim do século 19, os Merry Pranksters de Ken Kesey com a "Viagem ao Oriente" de Herman Hesse e o ácido lisérgico com o cogumelo Amanita muscaria, que seria a religião mais antiga do planeta. Em entrevista por e-mail, Lachman falou sobre o assunto de seu livro.

Folha - Como você percebeu a conexão entre a psicodelia e o resgate do ocultismo nos anos 60?
Gary Lachman -
Se você observar a cultura pop dos anos 60, verá que, por volta de 66 e 67, alguns elementos daquilo que chamamos de "ocultismo" estavam renascendo. Isso começou em Paris, em 1960, com o livro "Le Matin des Magiciens" (A Manhã dos Mágicos, de Louis Pauwels e Jacques Bergier). Mas logo se espalhou pela Inglaterra e pelos EUA. Pude perceber isso em lugares como os quadrinhos da Marvel, graças a personagens como o Dr. Estranho. Os próprios X-Men, que não eram "ocultistas", funcionavam como precursores dos hippies: eram adolescentes mutantes.

Folha - Como você entrou em contato com o ocultismo da época e como isso influenciou o livro?
Lachman -
Eu nasci em 55, tinha nove ou dez anos quando essas coisas estavam começando. Comecei a perceber isso em filmes, programas de TV, quadrinhos e em livros de literatura fantástica da época. Os livros do Conan começaram a ser republicados em 1966; depois, houve a redescoberta de H.P. Lovecraft. Em 67 e 68, as pessoas estavam falando em tarô, terceiro olho, viagens astrais e coisas do tipo. Comecei a me interessar seriamente em 1972, quando um amigo meu me deu uma cópia do "Sidarta", do Hermann Hesse.

Folha - Das principais redescobertas mágicas dos anos 60 --como Aleister Crowley, Hermann Hesse e Tolkien--, qual você considera a mais bem-sucedida de todas?
Lachman -
Os livros de Tolkien começaram a ser republicados nos anos 50, mas não tiveram um grande impacto até que uma edição pirata de "O Senhor dos Anéis" saiu nos EUA. Hesse foi imensamente popular --praticamente todo mundo que eu conhecia tinha pelo menos um de seus livros. Crowley era conhecido nos anos 60, mas não teve um grande impacto até a década seguinte. Mas o trabalho de Tolkien é claramente o mais popular de todos, ainda mais com os filmes e afins.

Folha - Qual popstar dos anos 60 esteve mais envolvido com o desconhecido? Será que até aí os Beatles são o nome mais influente?
Lachman -
Os Beatles eram as pessoas mais famosas do mundo, mas não estavam tão interessados em ocultismo como estavam em misticismo oriental. Os Rolling Stones estavam muito mais envolvidos com o lado negro, como os Doors. Os Beach Boys se envolveram com o Charles Manson. Mais tarde, o Led Zeppelin se associou a Crowley e Tolkien.

Folha - Você descreve o movimento new age como uma evolução natural do interesse dos anos 60 pelo oculto. Como relaciona isso com o atual interesse pelo assunto --franquias como "O Senhor dos Anéis" e "Harry Potter", seriados como "Buffy" e "Charmed"?
Lachman -
As pessoas sempre se interessaram por "magia", e é provável que continuem a se interessar. A diferença é que hoje o ocultismo é um dos muitos estilos de vida alternativos, enquanto nos anos 60 era um dos poucos. Nunca assisti a "Buffy", mas acho que o interesse pelos livros de Potter, por mais comercial que seja, é geralmente um bom sinal.

Folha - Você mostra que filmes como "Matrix" são apenas novos disfarces para o ocultismo voltar ao imaginário comum. Fale um pouco sobre as formas sob as quais o oculto é vendido atualmente.
Lachman -
"Matrix" lida com idéias gnósticas sobre a natureza da realidade. Os antigos gnósticos acreditavam que vivemos em um mundo "falso", e o objetivo de práticas ocultistas e espirituais é escapar deste para um mundo "real". Todo o jargão de computador é basicamente uma fantasia de vitrine, para tornar a história contemporânea. Mas o roteiro básico é eterno. O objetivo da magia é escapar da grande ilusão.

Folha - No fim do livro, você acena que a Era de Aquário não lida só com luz do sol e euforia tecnicolor e que pode ser sombria e doentia.
Lachman -
Os elementos sombrios dos anos 60 estão presentes na filosofia "faça o que quiseres" retirada de Crowley e na cessão àquilo que me refiro como "forças estranhas", que foi alertado por Hesse. Isso não quer dizer que o oculto é sombrio e deve ser evitado, mas que a ética liberalista pode facilmente se tornar uma espécie de agressividade fascista. Isso pode ser encontrado em boa parte das políticas radicais da época. "Faça o que quiseres" pode se tornar facilmente "faço o que eu gosto". Não é que algum tipo de conservadorismo seja preferível, mas muitas pessoas tinham um entendimento superficial das idéias com que estavam se envolvendo.

TURN OFF YOUR MIND
De:
Gary Lachman
Editora: Disinformation
Quanto: US$ 14 (cerca de R$ 42, 430 págs.), na www.amazon.com

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