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10/01/2001 - 04h03

Ex-interno do Juquery, é destaque no museu Osório Cesar

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FABIO CYPRIANO, da Folha de S.Paulo

O artista plástico Ubirajara Ferreira Braga começou a pintar tardiamente, aos 58 anos. Isso após passar por tratamentos de choque, ao ter sido internado como esquizofrênico, no Hospital Psiquiátrico do Juquery, em 59. No dia 20 de novembro passado, Ubirajara morreu praticamente desconhecido, apesar de suas obras representarem quase 30% do acervo do museu Osório Cesar, que faz parte da instituição.

"Como pintor, ele poderia ter o mesmo reconhecimento que o Arthur Bispo do Rosário", diz à Folha a professora de pós-graduação na Escola de Comunicações e Artes da USP Maria Heloisa Corrêa de Toledo Ferraz.

Autora do livro "Arte e Loucura" (Lemos Editorial), lançado no ano passado, Maria Heloisa acompanhou a trajetória artística de Ubirajara, iniciada em 86, quando começou a participar do Ateliê de Arte. O espaço foi reorganizado no instituto em 86, com a participação de Maria Heloisa. O Juquery já havia possuído um ateliê de artes, criado pelo médico Osório Cesar (leia texto abaixo), mas que foi desmontado.

"O Ubirajara teve um desenvolvimento artístico muito rápido; em pouco tempo percebemos que ele estava acima da média", diz Maria Heloisa.

Ubirajara foi indicado por psiquiatras ao ateliê porque circulava livremente pelo Juquery e tinha sido pintor de paredes na juventude.
Hoje, o museu Osório Cesar, a versão paulista do Museu de Imagens do Inconsciente (implantado por Nise da Silveira no Rio, em 1952), possui em seu acervo 2.615 telas de Ubirajara.

Certamente o artista produziu muito mais, mas durante um período encontrou uma forma de vender suas obras, o que é proibido no Juquery, e com isso não há como saber o número exato de sua produção.

Pelas manhãs, Ubirajara ia até o setor de terapia ocupacional, onde os pacientes produzem artesanato, o que é permitido que seja vendido. Já à tarde, ele trabalhava no ateliê. "Ele costumava dizer que pela manhã fazia arte para ser vendida", conta Maria Heloisa.

Com o tempo, ele desistiu de frequentar o setor de terapia ocupacional e ia apenas ao ateliê, onde chegava às 7h, antes ainda que os funcionários. Era o único que frequentava o local todos os dias e ainda reclamava que o espaço não abria nos fins-de-semana.

A vontade de ser reconhecido como artista era tamanha que Ubirajara chegou a mandar imprimir, na gráfica do Juquery, um cartão de visitas que indicava "artista plástico" e o endereço do hospital psiquiátrico.

No ano passado, Ubirajara foi tema do documentário "A Soltura do Louco", patrocinado parcialmente pelo Instituto Itaú Cultural e dirigido por Cristian Cancino e Bernardo de Castro.

O documentário revela que Ubirajara estava em condições de ser liberado, mas a própria família não o aceitava. Nascido em Santos, ele procurou, com a equipe do documentário, sua irmã na baixada, que não o recebeu.
Ele também tinha intensa produção literária e pretendia lançar um livro. Os textos, tema de pesquisas em curso, também pertencem ao museu Osório Cesar.

Na mostra organizada pelo Juquery, em comemoração dos cem anos do instituto, no Sesc Pompéia, em 98, com curadoria de Maria Heloisa, Braga foi o grande homenageado. Das 85 telas expostas, nove eram suas, o artista com maior representação.

Entretanto o artista não teve suas obras apresentadas nem no módulo Imagens do Inconsciente, da Mostra do Redescobrimento, nem na exposição "Brasil, Psicanálise e Modernismo", que foi encerrada no Masp no último domingo. Nas duas mostras, a artista Aurora Cursino dos Santos representou o Juquery. "Acho uma injustiça; provavelmente isso ocorreu porque ele ainda estava vivo. O Ubirajara merecia uma homenagem em vida.
Acompanhei a trajetória do Arthur Bispo e, infelizmente, foi a mesma história", diz Maria Heloisa.
 

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