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21/04/2002 - 09h30

Quinta República Francesa já teve diferenças ideológicas claras

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MÁRCIO SENNE DE MORAES
da Folha de S.Paulo

Os dois principais candidatos à Presidência da França, o presidente Jacques Chirac (centro-direita) e o premiê Lionel Jospin (centro-esquerda), não conseguiram mostrar aos eleitores que têm plataformas de governo distintas e bem definidas -com uma visão específica do futuro do país.

Todavia esse fenômeno é relativamente novo na história da Quinta República Francesa, que teve início em 8 de janeiro de 1959, com o general Charles De Gaulle. Afinal, até 1995, quando Chirac chegou à Presidência ao derrotar Jospin, as disparidades ideológico-programáticas eram significativamente mais claras.

"Jamais houve uma disputa presidencial tão monótona quanto a atual. Os eleitores não vêem diferença entre os candidatos e acabam optando pelo voto de protesto", analisou Jean-Luc Parodi, diretor da Fundação Nacional de Ciência Política (Paris).

De Gaulle, fundador da Quinta República -após a promulgação de uma nova Constituição-, encarnava a direita francesa (bem menos conservadora que a americana). Ademais, ele também era o general que tinha conseguido colocar a França entre os vencedores da Segunda Guerra Mundial e, assim, carregava toda a dimensão política que isso representava.

"De Gaulle tinha uma personalidade muito forte. Todos os franceses sabiam que ele era a personificação da direita e de uma visão específica do futuro. Assim, em 1965, quando o general bateu [François" Mitterrand no pleito presidencial, todos tinham consciência de que optavam por um modelo", apontou Parodi.

Embora considerado de direita, reiteradas vezes, De Gaulle enfrentou os EUA e marcou posição nos mais variados assuntos, como o papel que a França deveria desempenhar dentro da Otan. Essa crise levou a França a retirar-se da organização militar integrada da aliança, em 1966. Ela só voltou a ocupar o posto nos anos 90.

Apesar do turbilhão que marcou a cena política francesa em 1968, a eleição de 1969 -ocorrida após a renúncia de De Gaulle (por causa da derrota de sua proposta de reforma institucional num plebiscito)- opôs candidatos de direita: o vencedor Georges Pompidou e Alain Poher.

Com a morte de Pompidou, em 1974, um novo pleito presidencial foi realizado. O candidato de direita, Valéry Giscard d'Estaing, derrotou -com um programa considerado frágil- seu principal oponente de esquerda, Mitterrand, por uma margem estreita.

Depois de um governo conturbado, Giscard d'Estaing foi batido por Mitterrand, em 1981. "À época, Mitterrand apresentou um programa abrangente, que continha 110 pontos. Ele defendia uma verdadeira guinada à esquerda", disse Olivier Dabène, professor licenciado de ciência política do Instituto de Estudos Políticos de Aix-en-Provence (sul).

Mas os 14 anos de Mitterrand na Presidência e o advento da coabitação [situação em que o presidente é de um partido e o premiê, de outro", em 1986, parecem ter exaurido o arrojo dos candidatos. Assim, desde a eleição presidencial de 1995, as diferenças ideológicas se tornaram mínimas.

Agora a situação agravou-se, e mais de 70% dos eleitores não vêem grande diferença entre ambos. Para os analistas ouvidos pela Folha, a impressão dos eleitores encontra respaldo na realidade. Segundo Parodi, "nunca houve programas de governo tão similares entre os principais candidatos à Presidência", o que consolida o desinteresse do eleitorado.

As razões desse desencanto são as mais variadas, além da semelhança das plataformas. Entre elas há a quase absoluta ausência de suspense, pois Chirac e Jospin deverão enfrentar-se no segundo turno, em 5 de maio. Trata-se, ademais, de figurinhas carimbadas da cena política francesa -com décadas de exposição.

Além disso, como a União Européia estabelece critérios específicos para seus membros no que concerne a metas econômicas, nenhum dos dois pôde enfatizar as poucas singularidades de seus programas, já que elas se concentram na política fiscal. Assim, ambos são forçados a manter o objetivo de 3% de crescimento e só divergem em temas menores.

Resta, portanto, uma dúvida: ou o pleito presidencial marcará o fim da atual geração de políticos ou ele constituirá o apagar das luzes de uma era que privilegiava o debate ideológico-programático.

 

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