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Crítica - Teatro

Peça converte a cena em música para os olhos

Elenco brasileiro de "A Dama do Mar", dirigida pelo americano Robert Wilson, realiza trabalho com perfeição

LUIZ FERNANDO RAMOS CRÍTICO DA FOLHA

No limiar entre realidade e sonho. "A Dama do Mar" de Robert Wilson, encenada a partir da adaptação de Susan Sontag (1933-2004) da peça de Henrik Ibsen (1828-1906), reitera o inconfundível estilo do artista norte-americano.

Ao converter a cena, literalmente, em música para os olhos, alcança uma teatralidade singular, confundida com todas as outras artes.

Fiel ao mesmo projeto estético há mais de 40 anos, Wilson produz espetáculos de uma beleza acachapante.

Nesta versão brasileira de montagem estreada em 1998, na Itália, não há nada de novo. Mas trata-se, ainda assim, de uma obra imperdível.

Ibsen publicou a "Dama do Mar" em 1888 e, no ano seguinte, já a viu encenada em capitais europeias. Na montagem de Londres, Elida, a heroína, foi encarnada pela italiana Eleonora Duse (1858-1924).

Elida é uma personagem típica do dramaturgo norueguês. Filha do faroleiro em uma ilha, casa-se com um médico viúvo quando se vê órfã. A ação começa quando, dez anos depois, um marinheiro que amou no passado reaparece e a obriga a optar entre o casamento seguro e a incerteza da vida no mar.

Ibsen já arrisca aqui alguns dos voos metafísicos de suas últimas peças. Trabalha, por exemplo, a associação do mar ao inconsciente humano e evoca, no conflito da protagonista, a figura mítica da sereia.

É daí que Sontag parte em sua operação de desmonte do original. Radicaliza ao sugerir uma potência anfíbia em Elida e projetar o marinheiro como um espécime dos peixes. Escreve sob medida para a estética de Wilson e suprime dois dos personagens da peça, reduzindo os seus cinco atos a um conjunto de quadros isolados.

Cada "tableau" permite ao encenador exercer sua especialidade, que é a variação constante da paleta de cores do fundo luminoso. Com um mínimo de objetos, apenas cadeiras desenhadas por ele próprio, Wilson formaliza nos atuantes uma gesticulação contida, que intensifica suas falas em choque direto com o seu teor coloquial.

Esta direção evita que os intérpretes incorram em registros naturalistas. Ao mesmo tempo, porque se trata de Ibsen, mesmo filtrado por Sontag, e não de uma proposta antidramática na raiz, o resultado soa maneirista. A dramática de Ibsen não se funde à poética cênica de Wilson, e ambas se estranham.

A grande vitória dessa "A Dama do Mar" brasileira é o desempenho de atrizes e atores nela envolvidos. Cúmplices do encenador americano, realizam com perfeição seu projeto e dão ao público o prazer de assistir a uma produção dele falada em português.

Eis uma boa oportunidade de experimentar, sem legendas, um mergulho nas águas encantadas de um grande artista do século 20.


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