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Questão de renda

Endividamento das famílias e falta de vigor da economia brasileira dão impulso aos candidatos de oposição

FLÁVIA MARREIRO DE SÃO PAULO

Separadas por uma rua estreita no Jardim Novo Horizonte, no pobre extremo sul de São Paulo, duas Maria de Lourdes, uma dona de uma loja de cosméticos e a outra vendedora de tapioca, se queixam de seus negócios.

A comerciante Maria de Lourdes, 62, há dois meses fechou uma das duas lojas de cosméticos que tinha -a que havia aberto em 2012, animada com o resultado da primeira, montada oito anos antes.

As vendas caíram, e a comerciante entrou 2014 no vermelho. Ficou devendo no cheque especial e já está no segundo empréstimo para cobri-lo. O cartão conjunto com o filho foi bloqueado.

Lourdes não vai votar em ninguém, enquanto, no caixa, seu filho Marcos, 38, adianta que não vota em Dilma Rousseff. Estuda escolher, no segundo turno, Marina. "Mas ela ainda não me convenceu."

Se sua decisão final for pela ambientalista, Marcos fará parte dos 65% dos eleitores de Marina que dizem, segundo o Datafolha, que sua renda é insuficiente ou que lhe falta dinheiro. Entre os que escolhem Dilma, a taxa cai para 57%.

Entre os eleitores de Marina, 25% se consideram mais endividados agora que em 2011, acima da média nacional, de 21%. As cifras mostram que a insatisfação com a renda e o endividamento dão impulso à oposição.

"Falta dinheiro para um passeio. Antes, eu fazia festa de aniversário para os meninos. [...] Se até o Eike Batista caiu para a classe média, quem dirá nós!", brinca ele.

PREÇO DO COCO

Do outro lado da rua, a tapioqueira Maria de Lourdes, 38, conta por que hesita em votar de novo em Dilma. Ela esteve a ponto de fechar o quiosque por causa do aumento do coco, o recheio mais popular do seu produto. "Falei para meu marido: 'Se passar de R$ 100 o saco de cocos, eu desisto'. Tenho de comprar manteiga, embalagem. Tudo aumentou."

O preço do coco refluiu, mas o susto e a inflação (8,29% para bebidas e alimentos em SP nos últimos 12 meses, segundo o IBGE) lhe deixaram marcas. Ela diz que o governo Lula foi melhor e quer ouvir mais sobre Marina para se decidir.

"Se eu disser que está bom como antes, é mentira. Mas eu analisei bem e vou votar na Dilma", diz Cláudia Costa, 42, dona de um salão de beleza na mesma rua em que trabalham as Lourdes. Ela conta que, depois de dias de dúvida, escolheu a petista, apesar de o movimento, nos últimos anos, deixar a desejar. "As meninas que vêm aqui têm que pagar faculdade, o dinheiro aperta. Agora fazem mais unha em casa, dão um jeitinho para vir aqui a cada 15 dias", diz ela, que dispensou funcionárias e adiou planos de ampliação.

O economista Luiz Carlos Mendonça de Barros, ex-ministro do governo FHC e colunista da Folha, diz que há "estoque" de bem-estar, com aumento da renda, apesar de em ritmo menor, e desemprego no mais baixo nível histórico.

O "fluxo", contudo, mudou de sinal: maior inflação, estagnação na criação de vagas, desaceleração nos serviços e retração no crédito.

A renda da população manteve crescimento real, mas em ritmo menor. Em 2013, o rendimento médio do trabalho cresceu 3,8%, ante 5,6% em 2012. Já o juro médio para as famílias chegou a 43,1% em agosto, segundo o Banco Central -tão alto quanto em 2011.

Seguindo a leitura de Mendonça de Barros, Marcos, as duas Lourdes e Cláudia teriam captado a piora no "fluxo".

O x da questão, diz ele, é saber quantos já o fizeram e se a oposição saberá capitalizar o desconforto latente até a eleição. "Se a eleição fosse daqui a um ano, o governo ia estar mal."


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