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Depoimento

Nada melhor para exercitar a esperança que ser palmeirense

DENISE FRAGA COLUNISTA DA FOLHA

Eu já andava de olho no Palmeiras quando conheci meu marido. Me apaixonei pelo time, por aquele homem de um metro e noventa gritando de joelhos no tapete da sala e a alma italiana desta cidade que pôs um visgo no meu pé. Sou flamenguista de nascença, mas palmeirense pelo coração. Tive o coração invadido pelo choro de uma criança segurando o jornal quando foi vendido o Leivinha e tive também o Ademir da Guia num porta retrato mantido na estante. O amor e a felicidade de voltar aos estádios louca por um time foram forjando esta nova e legítima palmeirense. Gosto de futebol. Não entendo muito, mas sou mulher que detecta um impedimento.

Nosso primeiro rebento já voltou da maternidade com uma miniatura de camisa do Palestra na mala. Foi a primeira de uma progressiva coleção, guardada até hoje pelos dois moleques.

Confesso que não foi coisa fácil mantê-los torcedores. Na última década, nosso time nos exigiu grandes demonstrações de fidelidade. Gostaria até de agradecer aqui ao Goiás e ao Guarani que, com suas camisas verdes, nos emprestaram alguns gols na terrível campanha de 2002. Colocávamos a TV sem som para podermos ensinar os pequenos a gritarem "gol do Palmeiras!!!".

Pode parecer traição, mas o nome disso é fidelidade.

Descobrimos também que o Papai Noel do shopping era palmeirense. "Duvida que até o Papai Noel é palmeirense? Pode perguntar."

E ainda teve o Tiaguinho, um amigo da escola, uma espécie de pastor corintiano de cinco anos de idade, que tentava aliciar nosso pequeno Pedro. Um dia, o Luiz entra no quarto com cara de tragédia: "Acho que eu vou dar uma camisa do Corinthians pra ele. Ele tá pedindo muito". Estava completamente triste, mas queria ser um bom pai. Uma leoa doida baixou em mim. "Ele não é corinthiano, ele é Tiaguinho. Você é palmeirense! Não pode dar uma camisa do Corinthians pra ele."

O time já estava mal, e eu sentia que, se abríssemos a guarda, poderíamos comprometer pra sempre nossas idas ao estádio em família.

Para nosso alívio, Tiaguinho mudou de escola, e o Palmeiras caiu pra segunda divisão. Digo alívio porque, apesar de tudo, foi gritando os gols do time rebaixado que os pequenos viraram palmeirenses de vez. Santa Segunda! Era um misto de alegria e dor vê-los pequenininhos, de uniforme, gorro e bandeiras, gritando "É campeão!" sem nem saber direito o que significava.

O Palmeiras subiu e, desde então, vamos cambaleando pelos campeonatos. Nada melhor para exercitar a esperança que ser palmeirense nos últimos anos.

Mas bons ventos sopraram, e chegamos em julho deste ano com a Copa do Brasil nas mãos e uma vaga na Libertadores. Fazia tempo que não vibrávamos tanto na arquibancada. O que aconteceu, meu Deus?! No mesmo ano!! Um sentimento de injustiça se mistura à minha tristeza. Não merecemos, não é time pra cair. Foram muitas bolas na trave, muitas chances de gol, muitos quase. Mas quase não é gol, e a vida é cada vez mais contada em números. Não acontecendo o milagre, desceremos com dignidade, nutridos pela garra de um time que vimos lutar até o fim. Meu agradecimento especial a Barcos e a Marcos Assunção. Apesar de já saberem o que é a segunda divisão, nossos filhos renovaram suas crenças em superheróis.


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