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O rock de classe média comemora 30 anos
Paralamas do Sucesso registra show em DVD e seus integrantes falam da perda de mercado para outros gêneros
Músicos revelam que o resultado de seu álbum de estreia, 'Cinema Mudo', de 1983, foi uma decepção unânime
O trio Paralamas do Sucesso quer marcar seus 30 anos com um pacote: o especial de TV com show comemorativo sai agora em CD e DVD.
O escritório/estúdio do grupo fica em um prédio baixo no bairro carioca Jardim Botânico onde também mora o baterista João Barone. É ele quem explica o processo de criação desse trabalho.
"Foi um desafio. A gente estava preparando um show sem a premissa de um trabalho autoral novo, sem a desculpa de um álbum novo, de inéditas, que é o que normalmente orienta uma turnê", disse o músico à Folha.
A escolha do repertório deixou hits de fora, como "Óculos" e "Trac Trac". O trio organizou o show em blocos com alguma unidade, separando baladas, rock e reggae.
Segundo o baixista, o público da turnê é "misturado", com gente da geração deles que traz os filhos. O grupo vai estender mais a turnê.
"Estamos tão contentes que a gente vai dar uma de Paul McCartney e manter esse show um pouco mais na estrada", diz Barone.
A banda já trabalha em novas canções. "A gente tem se encontrado, trocado ideias e gravado um pouco", conta o guitarrista Herbert Vianna.
Barone diz que eles se reúnem para começar a dar forma às ideias iniciais de Herbert ("Ele escreve muito, sempre tira alguma coisa da cartola"), mas sem compromisso com a hora de gravar.
O trio acredita no encolhimento do público de rock. Para Barone, o rock ficou rendido com a popularização massiva de outros gêneros que os jovens consomem.
"Hip-hop, funk, música sertaneja, seja lá o que for. Com a ascensão da classe C, isso acabou pegando uma fatia do mercado que um dia o rock representou. A gente sabia que nosso sucesso era um fenômeno mais de classe média."
Bi argumenta que o rock voltou "para o tamanho que tem que ser, do tamanho que era antes de ter essa onda da qual a gente fez parte. O rock existia antes no Brasil, como um gênero pequeno. Voltou para o tamanhozinho dele".
"A gente foi a primeira banda da nossa geração que apontou para a música brasileira", prossegue o baixista. "Muitas bandas vieram atrás, como Chico Science, O Rappa. E tendeu para purificar o negócio, ir deixando o rock de lado. Hoje tem muita garotada fazendo MPB, fazendo samba."
No DVD, eles emendam um dos sucessos iniciais, "Vital e Sua Moto", com duas músicas do Police, "Don't Stand So Close to Me" e "Every Breath You Take". Fãs antigos se lembram de como a banda era insistentemente comparada ao Police no começo dos anos 1980.
Eles assumem a influência do trio inglês, mas dizem que o número de integrantes não foi inspirado no Police.
"Não era uma proposta inicial, aconteceu. A gente não conseguiu botar mais ninguém na banda e nos lançamos como trio", conta Bi. "Mas depois essa unidade se fechou mesmo. A gente se resolveu nesse tamanho."
AJUDA NOS SHOWS
Nos shows, eles introduziram, aos poucos, teclados e metais. "As composições que eu fazia estavam necessitando de um outro tipo de suporte que a gente não conseguia como trio", explica Herbert.
"Quando a gente ouve os discos antigos se surpreende com a qualidade das canções, dos arranjos que a gente determinou naquela época", diz Bi. Mas Barone interrompe para falar do disco de estreia, "Cinema Mudo". A decepção com ele é unanimidade.
O trio fez muitas concessões, sem o conhecimento de gravação que hoje gente muito jovem já tem. Barone defende que entrar no estúdio era algo assustador. "Era um lugar cheio de regras, ninguém podia encostar a mão nesse ou naquele botão."
A decepção foi tanta que eles combinaram que voltariam para a faculdade se não conseguissem gravar como queriam no álbum seguinte.
Aí veio "O Passo do Lui". "O Herbert teve a felicidade de compor aquelas músicas que acertaram na mosca", diz Barone, "Muita gente acha que esse foi nosso primeiro álbum", acrescenta Herbert.
"Fora o primeiro disco, a gente tem muito orgulho de todos os outros", resume Bi.