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Crítica - Drama
Longa de Eugène Green obriga público a se tornar interlocutor
Em filme do franco-americano na mostra Indie, personagens falam para a câmera
"No princípio era o verbo." Esta fórmula mítica, na qual a filosofia e a religião ocidentais fundaram suas primeiras verdades, é a fonte à qual Eugène Green retorna com seu cinema na contramão do espetáculo.
A obra relativamente breve deste cineasta nascido nos EUA e naturalizado francês é um dos destaques do Indie. O festival apresenta os cinco longas e três curtas filmados por Green, desde sua estreia tardia no cinema, aos 54 anos, em 2001.
De "Todas as Noites" a "La Sapienza", trabalho estreado há um mês em Locarno, Eugène Green aproxima-se da tradição que vê na palavra algo além de suporte da comunicação.
Como nos filmes de Manoel de Oliveira, do casal Jean-Marie Straub e Danièle Huillet ou de Marguerite Duras, o que se diz é fundamento da encenação. Neles, o espectador passa a ver na medida em que se deixa guiar pela escuta.
Em "La Sapienza", a fala começa como tagarelice, nos discursos oficiais e na vulgaridade das conversas ao celular. Seu oposto surge na incomunicabilidade de um casal que perdeu o poder afetivo das palavras. Aos poucos, a cura de uma jovem doente passa por sua capacidade de dizer.
Enquanto isso, um arquiteto maduro e um jovem aspirante descobrem em seus diálogos que saber e sabedoria são experiências distintas e até mesmo contraditórias.
A primeira impressão que "La Sapienza" provoca é de um experimento anticinematográfico. A câmera fixa registra, de modo aparentemente monótono, atores posicionados de frente. Eles dialogam olhando para a lente, o que nos desloca do lugar de "voyeur" que ocupamos confortavelmente no cinema e nos torna interlocutores.
A depuração formal, contudo, não é um fim em si, como na obra dos cineastas contemporâneos encantados pela inteligência de seus conceitos.
A redução à essência, que Green busca com tanta disciplina, faz parte de um processo para chegar a um cinema que tem o que dizer.