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Cifras & letras

Crítica Mercados Globais

Livro de economista indica as contradições da globalização

Lançada no Brasil após 17 anos, obra serve de registro do debate sobre o tema

ELEONORA DE LUCENA DE SÃO PAULO

Imagine uma empresa XYZ que fabrica sapatos numa cidadezinha de Ohio nos Estados Unidos. Por causa da redução da margem de lucro e da concorrência com produtos importados, ela decide contratar um terceirizado em Honduras. Demite seus operários e fecha a operação norte-americana.

Para os acionistas, os negócios melhoram. Tempos depois, uma reportagem constata que crianças de 12 anos trabalham em péssimas condições fazendo os calçados da XYZ por uns trocados lá na América Central.

Exemplos assim são discutidos pelo economista Dani Rodrik em "A Globalização Foi Longe Demais?", só lançado agora no Brasil. A obra é de 1997, quando ele tinha 39 anos e era voz dissonante na avalanche neoliberal.

Nesse seu primeiro livro, o professor de Harvard (EUA) aponta as contradições das mudanças econômicas do final do século 20, focando as tensões provocadas pelo avanço do comércio mundial nas estruturas sociais.

Demonstra que a globalização coloca o Estado sob pressão para atender demandas da sociedade, ao mesmo tempo em que tolhe margens de ação e financiamento. Avalia que a abertura sem freios nos mercados provoca "golpe na coesão social", exacerbando conflitos e enfraquecendo forças democráticas.

Quase angustiado, Rodrik sugere um roteiro para os governos nacionais enfrentarem a nova onda. Pede que eles encontrem "um equilíbrio entre a abertura e as necessidades domésticas".

Roga que os Estados não negligenciem das leis que protegem os mais pobres. "A necessidade de seguro social não diminui, mas aumenta, à medida que cresce a integração global", escreve.

Em sua visão, governos não devem "usar a competitividade' como desculpa para reformas domésticas" e devem evitar "abusar dos apelos à justiça' no comércio". Para ele, "as tensões entre a globalização e a coesão social são reais e é improvável que desapareçam espontaneamente".

Quase 20 anos depois, as questões formuladas por Rodrik continuam ecoando no cenário mundial. Muita coisa se passou: a turbulência asiática, a das empresas de tecnologia e, principalmente, a crise iniciada em 2008 e que ainda faz o globo patinar.

VISÃO HISTÓRICA

No prefácio à edição brasileira, os economistas Luiz Caseiro e Glauco Arbix afirmam que o livro é "um documento histórico do debate sobre a globalização".

De fato, quando a maior parte dos acadêmicos construía versões róseas do processo, Rodrik levantava inquietações, embora sem questionar em profundidade os alicerces da transformação que ocorria no globo.

Ele buscava uma posição intermediária entre "a defesa da globalização desenfreada e o saudosismo do protecionismo arcaico", avaliam Caseiro e Arbix. Em trabalhos posteriores (como "The Globalization Paradox", de 2011), Rodrik fez um diagnóstico bem mais ácido da economia mundial, abordando a necessidade de governos adotarem políticas industriais, cambiais e de defesa da soberania.

Analisado pelos olhos de hoje, as lacunas na obra dos anos 1990 são evidentes. O avanço do mercado financeiro, na esteira do comércio internacional, é subestimado e algumas declarações soam quase ingênuas. Mesmo assim, a leitura vale e é uma pena que a edição brasileira tenha demorado tanto.

Quantas vezes não se toma conhecimento de casos de empresas como a XYZ, do exemplo hipotético do livro? Seja nas fábricas de computadores americanos na China seja nas confecções de grife de lojas no Brasil, a ferida identificada por Rodrik aparece rotineiramente.

Com alterações. No exercício do texto, a revelação de trabalho escravo em Honduras provoca muitos protestos e leva a empresa de calçados a cancelar o contrato com a terceirizada do exterior. Os acionistas reabrem a operação em Ohio e recontratam os trabalhadores locais. Um final que passa longe do noticiário de hoje.

"A GLOBALIZAÇÃO FOI LONGE DEMAIS?"
AUTOR Dani Rodrik
EDITORA Editora Unesp
QUANTO R$ 32 (162 págs.)
CLASSIFICAÇÃO Bom


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