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Samuel Pessôa

O que esperar do 'abismo fiscal'?

Podemos esperar, sendo otimistas, que o crescimento da economia dos EUA será de 1,5% em 2013

Nós últimos meses o leitor deve ter se deparado com a expressão inglesa "fiscal cliff", ou abismo fiscal na tradução para a língua pátria. É o nome dado à enorme elevação da carga tributária sobre o setor privado americano que ocorrerá em 2012 em razão do término de diversas medidas legislativas temporárias tomadas pelo Congresso a partir de 2001 e que expiram neste ano.

Segundo texto publicado pelo Tax Policy Center, o tamanho do abismo fiscal, sob a hipótese de que não se renove nenhuma das leis que vencem em dezembro, será de US$ 536 bilhões, ou 3,6% do PIB americano.

Além da elevação dos impostos, o "abismo" representa redução do gasto público da ordem de US$ 64 bilhões. Esta redução foi decidida pelo Congresso na negociação, em 2011, do novo limite de endividamento do setor público americano.

Temos no total, portanto, US$ 600 bilhões, ou 4% do PIB, a menos de demanda do setor público em 2013, se nada for feito.

Em princípio, devido ao enorme deficit público do Estado, seria bom uma elevação de receita e/ou redução de gastos públicos. A redução do deficit pode estimular medidas de desoneração tributária que elevem a rentabilidade da economia, estimulando investimento e acelerando crescimento no longo prazo.

Além desse efeito de longo prazo, a redução do deficit público reduz a demanda, contribuindo para reduzir a inflação e, portanto, abre espaço para a redução dos juros, o que também pode estimular o investimento e o crescimento. E, com ele, o emprego e a renda. Todos esses efeitos são prováveis e fundamentam a visão daqueles que defendem a redução do Estado na economia.

Mas os EUA passam por um particular momento econômico que uma redução brusca de demanda do setor público pode ter impactos negativos, no curto prazo, sobre o crescimento e o emprego.

Ocorre que a economia americana se encontra em uma situação de armadilha da liquidez: os agentes econômicos, principalmente as empresas, encontram-se líquidas, com recursos em caixa e não elevam os investimentos, pois as perspectivas nos próximos dois ou três anos são de baixo crescimento.

Um sinal de que a economia americana encontra-se restringida pela carência de demanda é dada pela elevada taxa de desemprego, rodando nos últimos meses pouco abaixo dos 8%. O desemprego está desde 2011 distribuído por todos os setores da economia e todas as regiões.

Esse não é fenômeno localizado, devido a uma incompatibilidade entre a oferta de trabalho e a demanda na economia americana. Trata-se de um fenômeno generalizado.

Os excessos da década passada fizeram com que, logo após o choque de 2008, as famílias reduzissem demanda; as empresas, não enxergando perspectivas, reduziram o investimento; e o setor público, muito endividado em razão das guerras da era Bush, não teve "bala na agulha" para elevar o investimento público e ocupar totalmente o espaço deixado pelo setor privado.

O excesso de liquidez inverte toda a lógica dos efeitos benéficos da consolidação fiscal promovida pelo chamado "abismo fiscal".

Os juros, já nos menores níveis, não serão reduzidos em resposta à consolidação. Não haverá, portanto, estímulo adicional ao investimento privado. Só restará o efeito direto da consolidação fiscal sobre a demanda: a redução da demanda promovida pelo "abismo" produzirá em 2013 elevação do desemprego e redução do crescimento.

Assim, para construirmos um cenário para a economia americana em 2013, temos que trabalharmos com duas hipóteses. A primeira sobre quanto do abismo fiscal se materializará. A segunda, qual é, nas condições de armadilha da liquidez, o valor do multiplicador fiscal.

Sendo conservador, sob a hipótese de que o Congresso dos EUA renove a maior parte das isenções fiscais, o abismo fiscal será da ordem de 1% do PIB. Também sendo conservador, o multiplicador fiscal em condições de armadilha da liquidez é próximo de um. Assim, a redução da demanda pública de 1% do PIB deve ter impacto de 1% sobre o crescimento do PIB americano em 2013.

Dado que o crescimento em 2013, sem o abismo fiscal, seria algo próximo de 2,5%, podemos esperar -sendo otimistas- que o crescimento da maior economia do mundo será de 1,5% no ano que vem. Em 2013, o mundo caminhará um pouco mais lentamente do que se imaginava.


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