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Clóvis Rossi

Violência, muito além de Joinville

Na Argentina como no Brasil, o que se está vendo é o rompimento completo de um já precário pacto social

Certeiro comentário da senadora Norma Morandini a respeito dos saques que se seguiram às greves policiais na Argentina:

"Exatamente quando ce­le­bra­mos os 30 anos de de­mo­cra­cia em paz, afastados da brutalidade re­pres­si­va da di­ta­du­ra, é muito triste que a ci­da­da­nia só acredite na ordem dos uniformizados [os policiais]. Se um vizinho que com­pra to­das as manhãs o pão e o leite volta à noite para roubar esse comércio, (...) algo fizemos de errado como sociedade e como políticos."

Mude-se o cenário para a Arena Joinville no domingo e para os saques perpetrados após legítimas manifestações populares, e a observação continua valendo.

Não basta culpar a polícia (ou a falta dela), as autoridades esportivas ou políticas pela barbárie vista domingo. Quando grupos vão a um espetáculo e resolvem, subitamente (ou não?), sair à caça um do outro, é porque "algo fizemos de errado como sociedade".

Até porque é ilusório acreditar que, controlando a violência nos estádios, poderemos todos dormir em paz. "A violência no futebol é, em parte, decorrente da violência que existe em toda a sociedade", ensinou ontem mestre Tostão em sua coluna.

É igualmente ilusório atribuir a violência à miséria e à difícil vida de parte substancial da população brasileira (e argentina também), tese que já me cativou muito mais do que hoje. Afinal, nos últimos dez anos, a vida melhorou para um nutrido contingente de brasileiros, mas nem por isso a violência diminuiu.

Ao contrário, é espantosa a facilidade com que se mata hoje.

Suspeito que vale para o Brasil a análise que fez para a Argentina o editor-geral do jornal "Clarín", Ricardo Kirschbaum: "[Há] uma sociedade cada vez mais fraturada socialmente, na qual os laços de solidariedade se debilitaram e os códigos que regiam a relação entre as pessoas, entre os vizinhos do mesmo bairro, se perderam em favor de uma nova conduta que não reconhece os limites conhecidos".

Posto de outra forma: rompeu-se o contrato social, como admite José Manuel de la Sota, o governador da Província de Córdoba, exatamente a que foi pioneira, neste ano, na greve da polícia e nos saques que a ela se sucederam.

São avaliações que valem também para o Brasil, ponto a ponto. Joinville foi claramente um momento (mais um) em que "os códigos que regiam a relação entre as pessoas" se perderam em troca do grito de "mata,mata" que o pai de uma das vítimas contou que o filho ouvira dos bárbaros com os quais lutou.

Causas? Aqui se entra em território minado. Há as drogas que induzem a comportamentos desregrados e criam, em seu entorno, um ambiente de extrema violência. Há a impunidade que faz com que a barbárie em Joinville, como nos saques no Brasil e na Argentina, seja exercida à vista até das câmeras de TV.

Impunidade também para criminosos que atacam longe das câmeras, dado o baixo índice de crimes esclarecidos e punidos.

E há o tal contrato social que precisa ser urgentemente refeito. Tarefa para lideranças que escasseiam, se é que existem.

crossi@uol.com.br


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