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Clóvis Rossi
A paz, tão perto, tão impossível
Pela primeira vez, o Irã admite reconhecer Israel, desde que haja um acordo satisfatório para palestinos
Lançada ao ar assim, de repente, a frase dá a entender que a paz no Grande Oriente Médio é apenas uma questão de detalhes.
"Uma vez que o problema palestino seja resolvido, as condições estarão dadas para o reconhecimento de Israel", soltou, na segunda, a uma emissora alemã, o chanceler iraniano, Mohammad Javad Zarif.
Não há memória de frase parecida insinuando o eventual reconhecimento de Israel, tratado como entidade inaceitável pelos aiatolás.
Aceitar o Estado judeu, se resolvida a questão palestina, seria a pedra fundamental para a paz em toda a região.
Desarmaria o Hamas, o grupo radical que controla a faixa de Gaza e vez por outra dispara foguetes em direção a Israel. Tornaria ociosa a milícia Hizbullah, que combate Israel a partir de seus feudos no Líbano, como representante do Irã.
Tornaria insustentável o não reconhecimento de Israel por parte dos demais países de maioria muçulmana.
Do lado iraniano, devolveria o país a um convívio normal com os EUA, o grande protetor de Israel.
Seria, pois, um cenário quase idílico numa região que raramente oferece uma nesga que seja de esperança.
Resta saber, pois, se a frase de Zarif é para valer ou foi um engano.
Aqui cabe ver a coisa pelos olhos da comunidade de inteligência israelense, conforme descrição de Ben Caspit, colunista do "Pulso de Israel", do sítio "Al-Monitor".
Começa dizendo que Israel está monitorando o Irã muito de perto, para acrescentar: "Ninguém, nas Forças de Defesa de Israel, na Diretoria de Inteligência do Exército, no Mossad [o serviço secreto] ou no Ministério de Defesa planeja sair dançando pelas ruas, por enquanto. No entanto, os sons e as imagens que chegam de Teerã estão inspirando grande esperança entre os oficiais da Defesa. Alguma coisa real está em andamento".
Se essa avaliação é correta, então o passo seguinte para a paz seria um acordo entre Israel e palestinos. Zarif não falou de um acordo qualquer, mas de um que deixasse satisfeitos os palestinos.
Aqui, volta-se às sombras. As negociações de paz entre israelenses e palestinos já chegaram perto de uma conclusão satisfatória, 20 anos atrás, mas, no momento, parecem tão estancadas como sempre.
Em tese, a diferença é pequena entre as concessões territoriais que Israel demanda e aquelas que os palestinos aceitariam. O mais recente vazamento sobre as negociações diz que Israel pretende anexar 10% da Cisjordânia [território palestino, pela legislação internacional], ao passo que os palestinos aceitariam perder apenas 3% de suas terras.
Os óbvios benefícios da paz são tamanhos que, vista de longe e de fora, a diferença parece negociável.
Até pode ser, desde que os palestinos obtenham um território contínuo, não pedaços de terra cortados por assentamentos judaicos.
É isso --e um futuro de paz-- que está sendo negociado a portas fechadas pelas duas partes, com mediação dos Estados Unidos.
Impossível não usar o surrado "histórico" para designar o desfecho, para o bem ou para o mal.