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Marcos Troyjo

Putin e seu 'Estado da União'

Grandiosidade do discurso de aceitação da Crimeia no território russo lembrou os pronunciamentos dos EUA

"Onde há confusão, há lucro". Putin aproveitou os tumultos em Kiev e o vácuo de poder na Ucrânia para fazer valer antiga pretensão sobre a Crimeia.

Na terça passada, anunciou a façanha no Salão São Jorge do Kremlin, repleto de grandiosos candelabros e amplo mosaico étnico. Foi ovacionado junto à bandeira com a águia de duas cabeças que, a leste e oeste, vigia o colosso territorial de nove diferentes fusos horários.

A hora do discurso foi escolhida para que europeus e americanos estivessem despertos. A transmissão lembrava os "Discursos sobre o Estado da União" proferidos pelo presidente dos EUA anualmente no Capitólio. Ocasiões que irradiam diversidade, coesão e força.

Goste-se ou não, Putin fez história. Ante ONU e Otan boquiabertas, arrebatou território do tamanho da Bélgica. Assegurou para sua Marinha de Guerra as águas quentes do mar Negro --essenciais ao ideal russo de projeção de poder.

Quando Khruschov "cedeu" a Crimeia à Ucrânia, destacando-a da Rússia em 1954, imaginava construir pilar de comunhão entre as duas mais importantes repúblicas soviéticas. Khruschov nasceu na cidade de Kalinovka, fronteira entre Rússia e Ucrânia.

Para compreender as afinidades étnico-nacionais naquela região, vale ressaltar que os eslavos gostam de definir sua "nacionalidade" menos em termos do lugar onde nasceram e mais em razão do sangue de seus ancestrais.

Por isso, após o referendo de domingo, a maioria russa da Crimeia disse estar "voltando para casa". Compartilha dos sonhos grandiosos de integrar uma "Rússia Imperial", a "Grande Rússia". Esse sentimento é percebido em todas as localidades do leste da Ucrânia em que há significativa presença étnica russa.

Comparada com conflitos étnicos recentes, a Crimeia é café pequeno. Nada do horror que predominou na antiga Iugoslávia nos anos 1990. O problema maior é que, dada a posição geográfica, a Ucrânia acaba sofrendo os efeitos perversos do cabo de guerra entre Rússia e Ocidente.

Isso se manifestou claramente na tentativa de atração da Ucrânia ao polo gravitacional europeu. Também na possibilidade de a Ucrânia vir a integrar a Otan. Ambos cenários repelidos por Moscou.

A probabilidade de agressão entre Kiev e Moscou é pequena. A Ucrânia já botou o galho dentro. Iniciou a retirada de militares da Crimeia. Politicamente estilhaçada e financeiramente quebrada, não tem condições de travar conflito armado de fôlego.

O novo governo em Kiev terá de se consolidar com ajuda política e financeira da comunidade internacional. Não veremos a reedição de um confronto como o que opôs Rússia e Geórgia em 2008.

Tampouco uma conflagração entre Otan e Moscou. A interdependência Rússia-Europa é forte. E o risco de engajamento militar do Ocidente, insuportavelmente alto.

Em termos geopolíticos, a reintegração da Crimeia à Rússia é o evento mais importante do mundo pós-Guerra Fria. A despeito de enorme custo potencial, Putin termina a semana com a sensação de que seu "Estado da União" é forte.

mt2792@columbia.edu


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