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New York Times

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Retorno de migrantes aumenta tensão na Etiópia

Por BENNO MUCHLER

LEGUAMA, Etiópia - Mohammed Jemal deixou a Etiópia dois anos atrás. Queria ser independente, sustentar sua família e fugir do escárnio por ter desperdiçado uma grande chance de ter uma vida melhor.

"Entrei na faculdade, mas a abandonei", contou. "Fracassei." Se tivesse voltado para casa e começado a viver uma vida simples com um emprego mal pago, disse, "as pessoas teriam xingado minha família."

Assim, como muitos outros etíopes, Mohammed deixou sua cidade natal (Leguama, na Etiópia central) para tentar fazer fortuna na Arábia Saudita. Diz que entrou no país ilegalmente, depois de ter atravessado o Djibuti e o Iêmen quase inteiramente a pé. Ali, contou, trabalhou como guarda e recepcionista. A despeito das dificuldades, o dinheiro valia a pena.

Até que ele foi expulso em uma deportação em massa: de acordo com a Organização Internacional do Trabalho, quase 1 milhão de pessoas que tinham entrado na Arábia Saudita ilegalmente, vindas da África, do Oriente Médio e da Ásia, foram expulsas no ano passado.

Cerca de 150 mil etíopes foram obrigados a deixar a Arábia Saudita. Sua expulsão cria problemas para o governo etíope, porque as remessas que eles mandavam contribuíram muito para o país, que, apesar de ter uma das economias em crescimento mais acelerado do mundo, ainda é muito pobre. Em Leguama, cidade de 5.000 habitantes, muitas coisas foram construídas com dinheiro enviado por filhos e filhas na Arábia Saudita: casas, lojas, quatro mesquitas, uma escola.

"As remessas eram o pilar de nossa subsistência", falou o pai de Mohammed, Jemal Endris.

A mãe de Mohammed, Zemzem Oumer, comentou que esteve na Arábia Saudita antes de seu filho viajar para lá. Ela viveu algumas das histórias de terror contadas por muitos etíopes. Às vezes não lhe davam comida, e às vezes ela era trancafiada, sem poder sair de casa. Outros migrantes dizem que foram espancados e que, em alguns casos, não foram pagos.

Em novembro, informações sobre estupros de mulheres etíopes jovens provocaram protestos na capital saudita, Riad, contra a deportação.

O governo etíope já declarou que as relações diplomáticas e comerciais com a Arábia Saudita não vão mudar. O país é um dos maiores investidores externos na Etiópia, tirando China, Índia e Turquia. De acordo com o governo, os sauditas têm US$ 396 milhões investidos na Etiópia.

Mesmo assim, a imagem da Arábia Saudita será maculada, disse Mulugeta Gebrehiwot, diretor do Instituto de Estudos da Paz e Segurança, na capital etíope, Adis Abeba. "Essas pessoas não estavam vivendo de graça, estavam trabalhando", disse. "Estavam fazendo os trabalhos sujos para os sauditas."

A Arábia Saudita também expulsou 400 mil iemenitas, além de pessoas da Índia, do Sudão, da Somália e do Egito. Azfar Khan, especialista sênior em migração junto à OIT, disse que o governo temia outra Primavera Árabe. Nove milhões de pessoas, um terço da população saudita, são trabalhadores estrangeiros.

Khan prevê risco de tumulto social se a reintegração dos migrantes retornados fracassar. Aludindo a Mohammed Bouazizi, o jovem vendedor de frutas tunisiano que ateou fogo ao próprio corpo em dezembro de 2010, desencadeando a Primavera Árabe, ele comentou: "Do que ele estava reclamando? Basicamente, estava protestando porque não havia empregos, as pessoas não tinham como gerar renda."

O desemprego urbano na Etiópia, país de quase 90 milhões de habitantes, está em 17,5%.

Mohammed disse que não vê futuro para ele em Leguama.

"Se houver uma maneira segura de voltar para a Arábia Saudita, na legalidade, essa será uma opção", disse.


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