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New York Times

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Réu e acadêmico brilhante

Após ser preso e deportado por uma fraude colossal, aluno da elite universitária se reinventa

Por ALISON LEIGH COWAN

Quando saiu a mais recente edição da "Columbia Journal of European Law", no mês passado, com um artigo acadêmico de 31 páginas a respeito de cidadãos turcos na União Europeia, a nota biográfica do autor era a única indicação de que não se tratava de um típico integrante da elite universitária.

O autor é identificado como Orhun Hakan Yalincak, formado em direito pela Universidade de Durham e com mestrado recém-concluído na Universidade de Oxford -dois importantes celeiros de advogados britânicos.

"Ele já esteve no noticiário antes?", perguntou, intrigado, Harry Jacobs, o egresso de Columbia que editou a publicação.

Embora o autor do artigo use um prenome diferente, ele já esteve no noticiário. Yalincak (pronuncia-se "iálinchak") há pouco tempo passou três anos preso por cometer uma complexa fraude que causou prejuízos milionários a investidores, enganou uma universidade importante e deixou para trás uma nuvem de processos judiciais que ainda turva os tribunais de recursos, apesar de ele ter sido deportado dos Estados Unidos há cinco anos.

"Nada me surpreenderia", disse Paul Hinman, fiscal de serviços postais agora aposentado que participou ativamente daquela investigação criminal. "Tudo o que eu posso dizer é que ele era brilhante e provavelmente capaz de fazer qualquer coisa."

Contatado na Turquia, onde é estagiário de advocacia, Yalincak, 29, divulgou apenas declarações por escrito, por meio de seus advogados.

"Eis alguém que pagou um preço muito alto e está tentando refazer a vida", disse o advogado Ilan Reich, mentor de Yalincak, que chamou a atenção do rapaz por sua capacidade de recuperar a licença de advogado que havia perdido ao ser preso, em 1987, como parte de uma quadrilha que vendia informações mercantis privilegiadas. "Não é que ele seja avesso à publicidade e esteja tentando se esconder", disse Reich sobre Yalincak. "Mas ele está tentando sobreviver."

Na última vez em que foi notícia, Yalincak era um aluno adiantado de graduação na Universidade de Nova York, que ainda precisava de carona dos pais e dizia estar comandando um "hedge fund" (fundo de investimento de alto risco) incrivelmente bem-sucedido em Greenwich (Connecticut).

Investidores despejaram pelo menos US$ 7 milhões nas mãos do jovem Midas, especialmente depois de ficarem sabendo -pela mãe dele- do seu endinheirado pedigree na Turquia e dos US$ 21 milhões que sua família havia prometido à Universidade de Nova York, onde Yalincak cursava o quinto ano de história. Na época, segundo registros judiciais, Yalincak era conhecido como Hakan, às vezes Hagan.

Fiscais que examinavam fraudes em cartões de crédito descobriram que os computadores de Yalincak no seu escritório em Greenwich eram tão decorativos quanto as mulheres que ele contratava para deslumbrar os clientes.

A essa altura, Hinman já havia descoberto que a mãe de Yalincak, Ayfer, violara a lei em 1994, em Indiana, ao assumir a identidade de uma "dra. Irene Kelly" para praticar ilegalmente a medicina. As suspeitas surgiram depois que a "dra. Kelly" quase matou um paciente no pronto-socorro. Yalincak, Hale -sua irmã mais nova-, Ayfer e seu marido, Omer, se mudaram para Birmingham (Alabama), onde Ayfer durante algum tempo foi "Irene Imrag" e então para Boulder (Colorado), onde virou "dra. Elaine Tozman".

Após mais algumas voltas, a família foi parar em Bristol (Connecticut), onde ela foi detida e devolvida a Indiana, Estado no qual passou cerca de um ano presa.

Conforme já suspeitavam, as autoridades logo concluíram que o US$ 1,25 milhão que Yalincak havia dado com alarde à Universidade de Nova York -a única migalha do banquete de US$ 21 milhões prometido à NYU- havia, na verdade, sido roubado de investidores.

Para piorar, a escola havia brindado à família Yalincak numa cerimônia de gala e gravado o nome Yalincak num auditório.

Preso em maio de 2005, Yalincak acabou confessando os crimes de fraude bancária e fraude eletrônica, mas não saiu de cena calado. Com resultados variados, ele abriu processos judiciais contra diversas pessoas, como um senhorio a quem acusou de ter chutado Celina (sua cadela maltesa), um jornalista que o havia visitado na prisão e funcionários de uma penitenciária de Rhode Island que o atenderam depois de ele deliberadamente engolir um clipe de papel para provocar um sangramento. Ele processou a NYU por ter retido o diploma que ele estava prestes a receber.

Em 2007, ao sentenciar Yalincak a 42 meses de prisão, a juíza Janet Arterton, da Corte Distrital dos EUA, disse não duvidar do desejo de regeneração do réu, mas afirmou que a "bússola moral" dele simplesmente "não está presente ou não funciona".

Yalincak sempre quis ser advogado. "Ele tem vocação", disse Reich. Logo depois de chegar a Istambul, prestou exame para faculdades de direito britânicas e, segundo seus advogados, conseguiu vaga em várias universidades.

Entrou no programa mais disputado de Durham no segundo semestre de 2009. Tornou-se assim bacharel em direito, com louvor, por uma das mais antigas universidades inglesas.

Por intermédio dos advogados, Yalincak disse que, no formulário-padrão de admissão das universidades britânicas, não marcou o quadradinho junto ao qual deveria informar sobre condenações. Ele disse que não tinha a obrigação de fazê-lo, conforme as instruções que os candidatos recebem das faculdades sobre o que é exigido de acordo com a lei britânica. "A condenação criminal nos EUA não é considerada uma 'condenação relevante' para propósitos educacionais", segundo as declarações de Yalincak. "No entanto, ela foi revelada nas cartas de recomendação de seus advogados e também na declaração pessoal de Yalincak."

Como Yalincak estava se matriculando em uma graduação em direito, precisou apresentar apenas o histórico escolar do ensino médio, mas, conforme o seu relato por intermédio dos advogados, ele citou sua passagem pela NYU na sua redação pessoal, falando a respeito das, segundo suas palavras, "escolhas ruins" e da "perda de tudo o que prezo, inclusive de minha liberdade".

Uma vez matriculado no St. Mary's College, de Durham, ele passou a usar o nome Orhun, às vezes como prenome, às vezes como nome do meio. Após alguns meses no campus, partilhou sua história com "círculos íntimos de amigos", segundo os seus advogados e um colega de classe que era confidente seu. Outros que o conheciam apenas como Orhun não faziam nem ideia. "Isso é chocante", disse um aluno mais velho. "Ele dizia que os pais eram médicos e que ele tinha uma origem de classe média." Em geral, no entanto, Yalincak se entrosou. Foi voluntário em um serviço jurídico, entrou para a equipe da "The Durham Law Review" e digitava trabalhos acadêmicos.

Depois de Durham, Yalincak seguiu para a Universidade de Oxford, onde estudou criminologia e direito penal. Lá, diz ele, e amigos confirmam, concluiu o mestrado com mérito, em 2013.

Atualmente, Yalincak vive na Turquia, onde tem uma bolsa de pesquisa, publica artigos e faz cursos, como o de direito constitucional turco, do qual ele precisa para advogar no país.

Sua atual biografia no LinkedIn descreve malandramente o seu trabalho financeiro anterior como uma "experiência de aprendizado". Um trabalho acadêmico que ele publicou em agosto na internet, discutindo se condenações anteriores devem agravar a pena subsequente, é igualmente discreto.

A nota biográfica do autor o descreve como graduado por Durham e Oxford, antes de acrescentar: "Além dos estudos citados, o autor também estudou anteriormente em Nova York".


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