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Crítica Musical - Ben Ratliff

Morrissey oscila em novo álbum

A trajetória do cantor, dos Smiths à carreira solo

O décimo álbum solo de Morrissey, "World Peace Is None of Your Business", não é um bom disco. Por outro lado, é um disco quase perfeito.

Com suas canções de arte assertivas permeadas de sons elegantes e guitarra novo-flamenca, suas letras toscas e sua condenação de tantos empreendimentos humanos, "World Peace" constitui uma espécie esdrúxula de sucesso pedante. Tanto assim que um disco melhor -como seu último, "Years of Refusal", de 2009, ou seu melhor solo, "Vauxhall and I", de 1994- pode parecer tímido na comparação.

"World Peace" é o primeiro álbum de Morrissey depois de "Autobiography", seu livro de memórias publicado no ano passado e que virou best-seller. O livro narra sua infância e juventude em Manchester, Inglaterra; o período em que foi vocalista dos Smiths e herói de estudantes e desajustados, entre 1982 e 1987, sua carreira solo e seus esforços para persistir como ser humano na tradição romântica em meio a boçais, carnívoros, hippies e monarquistas.

O fato de "Autobiography" ter vendido muito bem não chegou a surpreender: os fãs de Morrissey são vitalícios e intransigentes, pessoas cuja consciência foi transformada pela exposição precoce à dele, da mesma forma que a dele foi transformada pela exposição precoce à de Patti Smith e Oscar Wilde. Também não surpreendeu o fato de o livro conter trechos bem contundentes.

Morrissey, hoje com 55 anos, é alguém que trabalha antes de mais nada com o texto.

Sua voz de letrista parece ter gerado quase tudo a seu respeito, desde o primeiro single dos Smiths até agora: sua empatia, seu senso de isolamento e diferença, suas posições de confidente e controlador. (E possivelmente até o tom da voz com que ele canta: seu suspiro letal, seu som sedutor.) Graças a isso, suas letras expressam uma persona que foi conquistada. O sucesso "The More You Ignore Me, the Closer I Get", de "Vauxhall and I", foi um aviso, como de alguém que persegue uma vítima, disfarçado de canto sereno de amor. Ele canta: "Hoje sou uma parte central/ Da paisagem de sua mente, quer você ligue para isso, quer não".

Mas "Autobiography" também continha algumas de suas piores características, que nem sempre estiveram presentes em sua arte: o modo como Morrissey põe a culpa em outros e se retrata como mártir, seu hábito de fazer sermões farisaicos que ultrapassam o ponto em que poderiam ser úteis e instrutivos, e uma tendência a menosprezar as pessoas, observando que são gordas, por exemplo. Tudo isso vendeu, é claro, juntamente com as coisas boas. O próprio artista ficou satisfeito com a performance de "Autobiography". "O livro está fazendo mais sucesso que qualquer disco que já lancei", ele escreveu em janeiro, respondendo à pergunta de um fã no site true-to-you.net e dizendo que agora está escrevendo um romance.

Morrissey muitas vezes parece começar com um título -como "World Peace Is None of Your Business", que é também o primeiro verso de uma balada romântica ao estilo dos anos 50, com o mesmo título, que está no novo álbum-, e depois ele começa a contar a verdade. "Não atrapalhe a organização", ele prossegue, imitando a voz do Estado.

Depois canta: "Cada vez que você vota, você apoia o processo". Ele está reconhecível, mas não provoca mais -está transmitindo uma posição. Não é uma posição que seja própria dele, e talvez não seja própria de você. Ele lhe dá uma razão para parar de escutar.

Ele volta para suas queixas antigas, mas com especificidade maior. "Oboe Concerto", adágio e solene, trata do envelhecimento e da morte, com trechos de estática de sintetizador. O melhor de tudo é que contém o senso de irresolução e uma versão do suspiro.

Muitas das canções não fazem isso. Soam inflexíveis e transmitem o tipo de misantropia pouco pensada que não ilumina o homem tanto quanto lhe garante a última palavra. Talvez elas visem nosso bem. Isso é impressionante e é sinal de princípios, mas faz pensar na voz do castigo, na voz do Estado.

Isso é próprio de Morrissey?


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