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Antonio Carlos Pannunzio

O povo não leva

Em vez de se fazer uma reforma tributária justa, o que se verifica é uma concentração da receita dos impostos por parte da União

O projeto de lei complementar que acaba de ser aprovado pela Câmara dos Deputados e encaminhado ao Senado substituindo o indexador das dívidas dos Estados e municípios com a União chega com quase 13 anos de atraso.

A partir de 2000, o índice adotado à época da renegociação deixou de ser favorável e se tornou paulatinamente oneroso. Agora, o projeto propõe a troca do IGP-DI mais 6% a 9% anuais pelo IPCA mais 4% ou o teto da Selic, o que for menor.

Trata-se, no presente cenário, de uma proposta paliativa, aquém de solucionar o grave problema do débito das unidades federativas, pois a amortização será agravada, no mínimo, com juros de 4% além da inflação oficial, medida pelo IPCA.

Aplique-se isso sobre o montante de quase R$ 470 bilhões que constitui o total da dívida e se perceberá que o pagamento, incluindo o principal, juros e taxas, dificulta muito, ou até inviabiliza, a realização de políticas públicas eficazes.

Os orçamentos de prefeituras e governos estaduais, já comprimidos pelo endividamento, conseguirão suportar os encargos sem o sacrifício de obras e serviços?

Mesmo com índices um pouco menores de correção das dívidas, estas continuarão crescendo de maneira desproporcional, como já vem ocorrendo, pois há um erro de princípio: para atender às atribuições outorgadas aos municípios pela Constituição de 1988, grande parte das prefeituras tem de gastar acima do suportável por seus orçamentos.

Em vez de se fazer uma reforma tributária justa e condizente com as atribuições e responsabilidades de cada instância governamental (esta seria a medida eficaz e não paliativa), o que se verifica é uma crescente concentração da receita dos impostos por parte da União.

Estimula-se, assim, a política do "chapéu na mão", protagonizada por um governo federal "bonzinho", que libera verbas eventuais para projetos estaduais e municipais, numa distribuição de recursos nem sempre atrelada à equanimidade suprapartidária que deveria nortear a gestão pública. Contudo, a generosidade da mão que doa é muito menor do que o apetite pecuniário da mão que toma.

Para ilustrar o absurdo, veja o exemplo de Sorocaba. O contrato de refinanciamento da dívida do município com a União, de R$ 34,29 milhões, foi assinado em 30 de dezembro de 1999, prevendo 360 parcelas mensais, calculadas com base na tabela Price e atualização pelo IGP-DI, que pode, agora, ser trocado pelo IPCA, segundo a proposta votada na Câmara. Até setembro de 2013, foram pagas 165 prestações.

Os números referentes ao serviço desse débito, contudo, são irracionais. A cidade já pagou R$ 38,25 milhões em amortização, R$ 68,43 milhões em juros e R$ 1,98 milhão em comissão, num desembolso total de R$ 108,67 milhões. A dívida está quitada? Não! Ainda há um saldo devedor de R$ 58,18 milhões.

A atualização mensal do saldo devedor pelo IGP-DI, apesar de vantajoso à época do refinanciamento, hoje onera os municípios, pois o cenário alterou-se após 2000. A Selic acumulada entre dezembro de 1999 e o mesmo mês de 2012 foi de 493%, ante 784% do IGP-DI + 9%.

A comparação explica a gravidade do atraso na troca do indexador. Ainda tendo Sorocaba como exemplo, veja o que poderia ser feito com os R$ 108 milhões já pagos para rolar a dívida: 31 creches, ou 33 escolas, ou 43 centros esportivos, ou 30 unidades de pronto atendimento.

As prefeituras estão pagando muito, mas a sociedade leva benefícios em proporção consideravelmente menor. As administrações municipais mais eficazes fazem imenso esforço para conciliar a manutenção dos investimentos públicos prioritários com o desembolso absurdo de recursos para continuar honrando uma dívida infinita.

É necessária solução urgente, pois a população não mora no Estado ou na União; vive no município.


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