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Justiça tardia

Passados longos 21 anos do massacre do Carandiru, primeira instância do Judiciário paulista enfim condena policiais acusados

Escolhido paraninfo de uma turma de formandos em direito, Rui Barbosa elaborou, em 1920, a "Oração aos Moços", conhecido discurso no qual aparece uma de suas frases mais célebres: "justiça atrasada não é justiça, senão injustiça qualificada e manifesta".

Quase cem anos depois, a reflexão do jurista vem a propósito do julgamento do massacre do Carandiru (antiga Casa de Detenção na zona norte de São Paulo). Ocorrido a 2 de outubro de 1992, somente agora o evento abominável terminou de ser analisado pela primeira instância do Judiciário paulista.

Os 21 anos passados desde então já seriam suficientes para sustentar duras críticas à Justiça. A demora, contudo, revela-se ainda mais vergonhosa: todos os condenados recorrerão em liberdade, e não há data definida para a segunda instância examinar o caso.

Como os tribunais superiores poderão ser acionados posteriormente, é razoável supor que pelo menos mais uma década terá passado antes de o processo conhecer seu verdadeiro desfecho.

A situação é deplorável. Na sexta-feira em que se deu a chacina, 111 presos foram mortos. Pouco importa que crimes tenham cometido. Estavam sob a guarda do Estado, que deveria garantir sua custódia. Jamais poderiam ter sido trucidados por policiais militares, por difícil que fosse conter a rebelião dos detentos.

O julgamento dos que participaram da ação sanguinária foi dividido em quatro blocos, correspondentes aos andares do pavilhão 9. Começou em abril do ano passado. Levou 76 policiais ao banco dos réus e resultou na condenação de 73 deles. Por motivos diversos, 34 mortes não provocaram punições. As outras 77 geraram penas que totalizam 20.876 anos de prisão.

Há algo de simbólico, sem dúvida, nos números superlativos desse que foi o maior júri da história do país. Mas a Justiça não pode ser meramente simbólica, como lembra o promotor Márcio Friggi --e há o risco de que nem isso ela seja, seria o caso de acrescentar.

Basta lembrar que o comandante da invasão no Carandiru, coronel Ubiratan Guimarães, foi sentenciado a 632 anos de prisão, em 2001, mas o Tribunal de Justiça anulou sua pena, em 2006 (ano em que ele foi morto, em circunstâncias não de todo esclarecidas).

Além disso, o governador de São Paulo à época, Luiz Antonio Fleury Filho, e seu secretário da Segurança, Pedro de Campos, nem tiveram sua eventual responsabilidade discutida em juízo.

Apesar de tudo, o encerramento tardio desse capítulo do julgamento foi celebrado pela Promotoria --e não poderia ser de outro modo. Sinal de que a lição de Rui Barbosa ainda não foi bem compreendida pelas faculdades de direito.


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