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Ricardo Melo

Pesquisas não ganham eleições

O pessoal do Planalto parece ter sido tomado pela síndrome da mídia --aparecer por aparecer

Nada seria mais perigoso, para os governistas, do que se confortar com os resultados das últimas pesquisas eleitorais. Considerando a margem de erro e as ressalvas costumeiras, parece que tudo continua como antes. Devagar com o andor.

Verdade, a oposição permanece mais ou menos lá onde sempre esteve. Sinal de que, por enquanto, não aparece aos olhos do eleitor como alternativa confiável. Também, pudera: nem entre os adversários há consenso sobre o que dizer, muito menos sobre o que fazer. Duvida?

"Eu não vejo que o quadro econômico seja tão calamitoso quanto se divulga [...] Não há risco de descontrole inflacionário [...] Há perda de manobra na área fiscal, mas não perspectiva de descontrole na área fiscal e muito menos de calote". As palavras balsâmicas vêm de José Serra, cardeal da oposição, numa teleconferência para investidores no último dia 20.

Detalhe: o "quadro calamitoso que se divulga", citado por Serra, tem como porta-voz o candidato do seu partido, Aécio Neves. Em artigos e palanques, o mineiro repete que há "descontrole fiscal generalizado", "desgoverno tomando conta do país" e "perda de controle do governo Dilma sobre a inflação". Todos sabemos que os dois tucanos não se bicam, mas o tamanho do desencontro lembra o desempenho daquele tradutor do funeral de Mandela.

Estranhos no ninho à parte, o fato é que o pessoal do Planalto parece ter sido tomado pela síndrome da mídia --aparecer por aparecer, mas sem novidades a oferecer. Trata-se de um risco tanto maior quando se misturam eleições, Copa do Mundo e uma oposição inquieta diante da possibilidade de outra derrota.

O governo age como se bastasse viver do salto social dos anos precedentes. Tudo bem que o programa Mais Médicos tem lá suas virtudes, mas apostar nele como carro-chefe de campanha é, como se diz, falta de mercadoria. Muito mais importante que "black blocs", leis contra fogos de artifício e reações a espasmos ultradireitistas em meios de comunicação, muito mais importante que tudo isto são as condições de vida dos cidadãos.

Para quem vive de salário, entre as imagens mais impactantes do ano estão, sem dúvida, as que mostram trabalhadores disputando centímetros em vagões de trens e metrôs para chegar ao batente. A panela de pressão está ali; no entanto, quem decide as coisas finge não ouvir o apito tocar. O baixo desemprego é uma conquista inestimável, mas a renda média do trabalhador já não cresce com o vigor de antes. Os preços, para as donas de casa e os chefes de família, têm se mostrado mais salgados do que fazem supor índices oficiais.

Os juros em alta comem parcelas sempre maiores do ordenado de quem foi atraído pelo crédito fácil e a perder de vista. As taxas cobradas pelos cartões de plástico, hoje acessíveis a qualquer brasileiro, são um caso de polícia. Em dois exemplos tomados ao acaso, o cliente que for obrigado a financiar um débito é informado, em letras miúdas, que está sujeito a um custo efetivo total ao ano, o tal do CET, de 457,59% num caso, e de 268,79% no outro! Números de fazer corar até agiotas de páginas de classificados.

Respostas para problemas como estes, aos quais se somam os de moradia decente, são bem mais necessárias, e eficazes, que a retórica contra "deturpações da mídia". Ampliar o acesso a meios de comunicação é um imperativo democrático, mas, por enquanto, a imprensa que ainda pesa país afora, mal ou bem, continua a mesma. Para quem não acredita, basta viajar pelo Brasil. Salvo exceções de praxe, e elas existem, no frigir dos ovos sempre haverá um jeito de confundir interesses públicos e privados a serviço dos últimos. O principal antídoto contra isso é tomar iniciativas para melhorar a vida do povo --em atos, não em discursos. Quem não se lembra que até Collor já foi eleito?


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