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Turismo

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O novo turismo gay

O mundo está se dividindo em lugares onde os homossexuais são bem recebidos e onde são rejeitados; atriz britânica trata dos desafios para esses viajantes

SOPHIE WARD DO "GUARDIAN"

Na primeira vez em que saí de férias com minha mulher e filhos, em 2005, nós reservamos, com muito entusiasmo, uma estadia no Caribe.

Já tínhamos viajado antes --para visitar parentes nos Estados Unidos e em viagens de acampamento em que carregávamos nossas barracas--, mas a visita ao Caribe seria a primeira viagem formal de férias que faríamos como uma família.

Cuidamos do assunto ao modo antigo, por meio de uma agência de viagem, e tudo no local que escolhemos parecia ideal para nós quatro.

Quando chegamos ao hotel, paramos para admirar a paisagem enquanto esperávamos para nos registrar. Entregamos nossos passaportes e ficamos aguardando.

"Mas vocês pediram um quarto de casal e uma suíte com duas camas de solteiro", a recepcionista me encarou, com a testa franzida. "São só vocês quatro?"

Estávamos todos diante do balcão da recepção. Nosso filho mais jovem tinha 11 anos. "Sim, é isso", respondemos.

A recepcionista encarou a tela de seu computador e digitou alguma coisa: "Não temos uma segunda suíte com duas camas disponível". Aproximei-me um pouco de minha mulher e sorri: "Não precisamos de outro quarto. Os meninos é que vão ficar na suíte com camas de solteiro".

A recepcionista não desviou os olhos da tela. "Receio que isso não será possível. Seus filhos podem dividir o quarto de casal. Vocês duas ficarão nas camas de solteiro."

Não foi um bom começo para férias que se provaram excelentes. Fomos aos quartos que nos foram designados, e logo trocamos de aposentos, assim que os carregadores de bagagens saíram.

Ninguém mais se pronunciou a respeito de nossos arranjos noturnos, mas sabíamos que, mesmo que o hotel tivesse aceitado nossas reservas, a comunidade e os costumes locais não conseguiam nos aceitar como família, e nos sentimos tolos por termos imaginado que as coisas poderiam ser diferentes.

Se tivéssemos pesquisado antes, como devíamos ter feito, teríamos descoberto que Antígua --é dessa ilha que estou falando--, em Antígua e Barbuda, não reconhece relacionamentos homossexuais, e que os gays podem ser sentenciados a até 15 anos de prisão por sua opção sexual.

Talvez tenhamos nos deixado embalar por uma falsa sensação de segurança, já que fizemos nossas reservas por meio de uma agência bem conhecida, mas decidimos que não cometeríamos mais o mesmo erro.

Quando planejamos férias, todos temos na cabeça uma lista de escolhas a fazer. Praia ou montanha, familiares ou românticas, descanso ou aventura.

A segurança pode ser uma questão, especialmente se você é uma mulher viajando sozinha ou se o seu destino foi alguma zona de guerra recentemente. Há informações oficiais dos departamentos do exterior de muitos países sobre a segurança de um país como destino turístico, mas poucos de nós consideramos se seremos bem recebidos no local que escolhemos para nossas férias.

Guias de turismo especializados para atender à comunidade homossexual, bissexual e transexual existem há anos. Quando comprei meu primeiro guia gay de viagem, em 1996, parecia impressionante que os autores tivessem encontrado lugares que toleravam os homossexuais em número suficiente para ocupar todo um volume.

O livro citava os oásis, em geral cidades, nos quais casais homossexuais podiam andar de mãos dadas sem medo, celebrar aniversários de relacionamento de modo tão sentimental quanto os heterossexuais ou ir a um bar e dançar com quem quisessem.

Agências de viagens para o público lésbico como a Olivia (olivia.com) e a Walking Women (walkingwomen.com) ofereciam cruzeiros e excursões de caminhadas; os homens gays podiam contar com companhias como a Damron (damron.com).

Até bem recentemente, isso era tudo o que esperávamos. É claro que existem homossexuais viajando e vivendo em toda parte, mas nem todos assumíamos.

Agora, porém, os tempos mudaram e, neste sábado, a lei que autoriza o casamento de casais homossexuais entra em vigor na Inglaterra e no País de Gales (e o mesmo acontecerá na Escócia antes do final do ano). A igualdade no casamento está transformando vidas, da Nova Zelândia ao Uruguai.

Mas a reação contra a reforma é tão forte no caso dos homossexuais quanto foi a qualquer outro movimento de defesa dos direitos civis.

A Rússia recentemente fez da "promoção" (menção/informação/existência?) da homossexualidade a pessoas menores de 18 anos um crime, e a Lituânia está debatendo projeto de lei semelhante. Nigéria e Uganda aprovaram leis que tornam ilegal saber que uma pessoa é homossexual sem denunciá-la à polícia.

O mundo está se dividindo agudamente entre países nos quais os homossexuais são bem recebidos (o casamento igual é legal em 16 países, e uniões civis em pelo menos mais sete), e aqueles em que não o são (há 82 países nos quais ser gay é um delito criminal e em pelo menos oito deles há a possibilidade de pena de morte caso alguém seja condenado por isso).

Agora, prestadores especializados de serviços como La Grande Maison --um hotel cuja especialidade é atender a lésbicas apreciadoras do vinho (e a todos os demais interessados), na França-- e o Out NYC --um hotel que atende homossexuais em Nova York-- têm a companhia de vários sites que oferecem todas as escolhas que um viajante possa desejar.

Um deles é o Further Afield (furtherafield.com), cujos proprietários selecionaram pessoalmente mais de 250 destinos de viagem nos quais os gays são bem recebidos, de casas a hotéis, passando por fazendas que podem ser alugadas para cerimônias de casamento e por locais de lua de mel no topo das árvores. Você pode até viajar com seu cachorro (ou filhos).

Há muitos lugares no mundo em que os homens gays são tolerados, em que as lésbicas são aceitas, e alguns poucos que ainda não se decidiram a respeito. Mas vote com seu passaporte quando o assunto for gastar seu dinheiro de férias. Vá a um país que queira mesmo a sua vi-sita, que tenha se dado ao trabalho de considerar a sua posição judicial e os seus direitos humanos.

Assim, você nunca mais precisará encostar camas de solteiro uma à outra para dormir com seu ou sua companheiro/a de viagem.

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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