Junun traduz noção de devoção com música indiana em festival com Radiohead

Com Jonny Greenwood, guitarrista da banda britânica, projeto é atração de festival nesta sexta (20), no Rio, e no domingo (22), em SP

Amanda Nogueira
São Paulo

Antes de tocar com Radiohead, Jonny Greenwood mostrará por que é um dos guitarristas mais versáteis e estudiosos da música em suas diversas configurações.

Ele se apresentará com Junun, um projeto de música indiana formado também pelo compositor israelense Shye Ben Tzur e integrantes do conjunto Rajasthan Express.

As canções incorporam fragmentos de poesias e ritmos da tradição sufi, particularmente da vertente devocionista Qawwali e do folclore do Rajastão, no norte da Índia.

O compositor israelense Shye Ben Tzur, do projeto Junun
O compositor israelense Shye Ben Tzur, do projeto Junun - Divulgação

O projeto surgiu após Greenwood assistir a um concerto de Tzur. O israelense, por sua vez, chegou à música indiana de maneira semelhante, hipnotizado pelos efeitos transcendentais daquele som extremamente rítmico.

Foi um concerto do flautista Hariprasad Chaurasia e do percussionista Zakir Hussain que fez com que o compositor se mudasse para a Índia, onde morou por mais de 15 anos.

"Eles tocaram por horas de uma maneira que elevou a minha alma como nunca havia vivenciado, acho que essa é a essência da música”, diz Tzur.

Com Junun, ele diz, a intenção era transcender a música e a poesia, tocando de forma autêntica, ainda que com elementos estrangeiros adicionados por Greenwood, como bateria eletrônica e ondas Martenot (instrumento musical eletrônico com teclado).

A gravação do único álbum, homônimo, se deu no Forte de Mehrangarh, no Rajastão, e foi registrada em um filme de Paul Thomas Anderson. “A ideia era criar uma espécie de Babel criativa, uma documentação desses momentos altamente criativos”, diz o músico.

Se as origens sonoras são facilmente reconhecíveis pelos ouvintes, as letras de Junun precisam ser decifradas. Cantadas em hebraico, hindi e urdu, elas tratam da relação do homem com seu Deus.

"Algumas falam da busca pelo espírito, por Deus, que às vezes não é atingida. Outras celebram os vislumbres de momentos quando você sente o amor edificante, todas as composições são louvações a Deus”, diz o músico.

"As poesias também trazem a sensação de devoção, de se doar completamente à noção do amor”, diz, explicando que Junun significa uma loucura movida por este sentimento.

Para Tzur, a compreensão das letras elucida uma perspectiva poderosa. “Mas a música é uma linguagem que está além da linguagem.”

BOICOTE CULTURAL

Tzur frisa ter passado a maior parte da fase adulta na Índia, mas não se exime de comentários sobre os boicotes culturais a seu país como oposição aos conflitos na Palestina.

Radiohead foi criticado ao tocar em Israel em 2017 e a relação entre Greenwood e Tzur foi exposta como uma das justificativas para a proximidade da banda com o país.

Para o israelense, a música é uma maneira de fazer pessoas criarem uma unidade momentânea em torno de algo positivo e sua impedição torna a situação ainda mais amarga.

"De alguma maneira está servindo a quem quer manter pessoas distantes.” Judeu, Tzur lembra que o conjunto tem maioria de muçulmanos.

"Impor barreiras culturais é ser parte dessa visão extremista, não vejo como algo útil.”

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