Descrição de chapéu

Grupo inglês Arctic Monkeys ousa em álbum irreconhecível, mas instigante

Ex-prodígio do indie e agora rockstar trintão, Alex Turner se arrisca em 'Tranquility Base Hotel & Casino'

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São Paulo

Tranquility Base Hotel & Casino

  • Preço R$ 24,90 (CD), R$ 109,90 (vinil) e R$ 49,90 (cassete)
  • Autoria Arctic Monkeys
  • Gravadora Deck

Fãs formados em pistas de inferninhos roqueiros talvez repudiem “Tranquility Base Hotel & Casino” e seu clima de decadência sarcástica.

O piano, o beat desacelerado, a harmonia meio Alpha FM, os falsetes do cantor: tudo parece estranho no novo disco do grupo Arctic Monkeys.

O espanto é ainda maior quando se compara a novidade ao disco anterior, o elogiadíssimo “AM” (2013), que levou ao ápice o musculoso rock de estádio da banda.

Guitarrista, cantor e agora pianista, Alex Turner, o gênio por trás do quarteto e prodígio de uma geração, talvez esteja enlouquecendo —ou para parecê-lo se esforça.

Permanece o fluxo sincopado com que encadeia incontáveis palavras em versos, mas sobrou pouco das guitarras sujonas em diálogos minimalistas que marcaram sucessos como “Teddy Picker” e “Fluorescent Adolescent”.

O visual, as roupas, o sorriso sarcástico que parece se dependurar do canto da boca enquanto canta e o ar meio excêntrico e chapado sugerem que Turner já não se contenta em ser apenas o mais talentoso frontman do século 21.

O compositor fez 32 anos em janeiro, e o tempo impõe novo tom à ironia, que deixa o tom pueril e superconfiante e ganha cor mais amarga, como aos que percebem que não será eterna a juventude.

No exterior, a crítica se apressou em apontar as digitais de Serge Gainsbourg (1928-91) e dos Beach Boys, mas sobressai a influência de David Bowie (1947-2016).

Em especial aquele do álbum “Diamond Dogs” (1974), inspirado, como em parte o novo disco de Turner, na ficção científica “1984”, de George Orwell (1903-1950).

“Batphone” às vezes parece cantada pelo autor de “Sweet Thing”, que também enveredou por inovadoras trilhas após completar 30 anos.

Nas letras, o que se vê é um autor em luta com a contradição maior do estrelato.

A história é antiga: o artista come e bebe do cotidiano ordinário para criar sua arte; por destreza ou sorte ou ambos, essa fórmula lhe confere fama e fortuna; como resultado, ele ou ela acabam encastelados em outra realidade.

É a vida do “Star Treatment” (tratamento de estrela, em inglês), a faixa de abertura.

Afastada a fonte de inspiração, é preciso mirar outras paisagens; como sobreviver?

“Já celebrou seu lado escuro e aí se arrependeu de ter saído de casa? Já passou uma geração inteira tentando entender isso?”, ele pergunta na faixa que dá nome ao disco.

Respondê-lo abre margem a uma nova reflexão.

Pode-se separar os artistas com relação à forma com que, por tesão ou por cálculo, eles tratam seus talentos.

Há os que encontram seu som e, a partir daí, repetem-no à exaustão para melhorar uma fórmula já desbravada —pense no maravilhoso AC/DC.

Outros se interessam por evoluir ao ponto em que se consegue identificar fases, mas sem radicalismos; bom exemplo seria o The Clash.

Existem, por fim, os que conjugam vocabulário e desapego para fazer de cada trabalho um filho absolutamente diferente, quase transitando entre gêneros; dessa estirpe seriam amostras Bob Dylan e o próprio Bowie.

Especulou-se que o novo disco traria na capa o nome de Turner, como um solo, e não o da banda; ao escolher assinar Arctic Monkeys, o quarteto se filia àquele terceiro grupo.

Este crítico paga pra ver. Mas e os fãs?

 
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