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Artes Cênicas

Na peça 'Tripas', filho dramaturgo e pai ator transformam vínculos

Monólogo aborda internação e viagem em busca pelo contato com as raízes judaicas

amilton de azevedo

Tripas

  • Quando Qui. e sex., às 21h30, sáb., às 19h30, dom., às 18h30. Até 8/7
  • Onde Sesc Ipiranga, r. Bom Pastor, 822
  • Preço Ingr.: R$ 6 a R$ 20

Diante de uma doença que rompeu seu intestino e levou o ator Ricardo Kosovski a um quadro grave de septicemia, uma decisão é tomada junto a seu filho, o dramaturgo Pedro Kosovski: estabilizada sua condição, eles viajariam juntos. No percurso escolhido, a busca pelo contato com as raízes judaicas da família.

Essas questões são abordadas em "Tripas", monólogo que coloca Ricardo em cena, com texto e direção de Pedro. A peça almeja mais do que o relato pessoal de uma narrativa de superação.

Na obra, uma assumida autoficção, situações reais mesclam criações fabulares, o que coloca em xeque a veracidade de certos elementos apresentados.

"Tripas" estabelece uma base fabular que mantém incerto o limite entre invenção e memória na relação de pai e filho. Esta situa a ação em Ácaba, sul da Jordânia, onde um pai está detido na fronteira e deve argumentar em favor de sua liberdade para um grupo de observadores internacionais —o público.

O jogo com as fronteiras é central na obra. Há a que existe entre o dito e o não dito dentro da dramaturgia de Pedro, que, em dado momento, insere-se em primeira pessoa na boca de seu pai.

Sobre a doença, há fronteira entre a vida e a morte. A instalação cênica de Lídia Kosovski (irmã de Ricardo), sugere um espaço que ao mesmo tempo é maciço e macio; rompido, com fissuras, é confortável mas também desequilibra.

Se o experimentalismo do espetáculo gera por vezes estranhamento, em outras revela seus procedimentos. Curiosamente, ele estabelece suas fronteiras para depois borrá-las.

Na cena, a performatividade da exibição de cicatrizes como documento da doença dá lugar a sua representação por meio do manuseio de um polvo morto. A presença daquele signo cadavérico parece mais potente que o corpo sobrevivente.

Para além de buscar nas próprias biografias memórias a serem postas em cena, é fundamental em "Tripas" a ressignificação do que é ser pai.

Partindo da percepção de que o fazer teatral é essencial dentro da relação de Pedro e Ricardo, os dois artistas entendem que é este o espaço possível para transformar o vínculo entre eles.

E o fazem não apenas no processo criativo da obra, mas também em cena. A fronteira que havia entre pai e filho passa a se tornar entre um homem e outro homem; a visceralidade das tripas que se mantém no encontro entre peles.

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