Descrição de chapéu

Mangá 'Akira' traz mundo complexo ao leitor

Após ficar 20 anos fora de catálogo, clássico de Katsuhiro Otomo ainda pode ser lido como quadrinho contemporâneo

ÉRICO ASSIS

Caso um dia se chegue a um acordo quanto ao cânone dos quadrinhos, é muito provável que Akira esteja por lá.

Lançado entre 1982 e 1990, o mangá de Katsuhiro Otomo continua lido, discutido, procurado e com estética que se sustenta três décadas depois.

Ênfase no "procurado": embora tenha saído em vários países ocidentais no fim dos anos 1980 —quando sua adaptação animada chegou aos cinemas— você tinha que penar pouco tempo depois para conseguir uma edição.

Akira passou anos fora de catálogo. No Brasil, só tinha saído em "versão ocidental" —com cores e no nosso sentido de leitura— entre 1990 e 1998. Depois, sumiu.

Dizia-se que Otomo queria redesenhar várias páginas antes de autorizar mais edições estrangeiras. Verdade ou boato, a autorização demorou.

Quadros do mangá ‘Akira’, de Katsuhiro Otomo
Quadros do mangá ‘Akira’, de Katsuhiro Otomo - Divulgação

Foi só nos 35 anos do lançamento que começou a circular por França, Estados Unidos e outros países a nova versão, em seis grossos volumes, tal como os originais japoneses, em preto e branco e sentido de leitura oriental. É a versão que sai agora no Brasil.

Akira começa com uma gangue de motoqueiros adolescentes em Neo-Tóquio no "futuro distante" de 2019. A gangue quase atropela uma criança —na verdade, um ser estranho com corpo de criança, cara de idoso e superpoderes. Um destacamento militar surge para resgatar o ser.

A partir daí, a gangue se vê envolvida no mistério. Um dos motoqueiros, Tetsuo, começa a desenvolver poderes. Kaneda, o líder da gangue, mete-se com uma organização terrorista que enfrenta os militares. Os milicos, por sua vez, coordenam o projeto de crianças com superpoderes e temem o despertar de algo ou alguém chamado Akira.

Otomo tem um mundo complexo para apresentar ao leitor, e conta mais através das imagens do que das palavras. O autor não poupava páginas --nem seus assistentes de desenho, que chegaram às dezenas-- para mostrar panoramas urbanos, apetrechos tecnológicos, linhas de velocidade, tiros, socos e feições carregadas na cara de cada personagem.

Embora com inspiração declarada em alguns ocidentais, como Moebius, Akira chegou ao Ocidente na época em que o quadrinho destas bandas ainda era denso de recordatórios de narração, pegando o leitor pela mão para explicar o que se via nos desenhos.

Otomo foi um dos que explicou que é possível se apoiar mais nas imagens --geralmente com mais desenho, mais exuberância e mais quadros para cada cena.

Com essas inovações de 30 anos atrás, hoje ainda se lê Akira como um quadrinho contemporâneo.

Para olhos ocidentais, Akira também marcava pela violência ainda pouco vista nos quadrinhos daqui. Sangue, membros decepados e adolescentes metralhando, às vezes contrastados com um humor que parecia fora de lugar, acabaram virando motivo de crítica ao quadrinho japonês.

Quadrinhos, animes e a cultura pop japonesa, porém, logo invadiram o Ocidente numa onda que só perdeu força em anos recentes. Akira foi um dos propulsores da onda.

A publicação dos seis volumes deve se encerrar nos próximos anos, contudo. A partir daí, espera-se que a obra continue à disposição para leituras e releituras.

Akira - Vol. 1 e 2

Katsuhiro Otomo. Ed. JBC. R$ 69,90 cada (362 e 304 págs. respectivamente)

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