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Obama e democratas desistem da lição de moral e voltam para 5ª série contra Trump

Com ajuda de ex-presidente, campanha de Kamala viraliza com piadas infames sobre pênis, trocadilhos e memes

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São Paulo

"Quando eles baixam o nível, a gente sobe" foi a frase da então primeira-dama Michelle Obama na convenção democrata de 2016, ano em que Hillary Clinton perdeu de Donald Trump, o rei do bullying.

Oito anos depois, os democratas parecem ter entendido uma coisa: o que viraliza nas redes sociais e ajuda a ganhar eleições é voltar para a 5ª série B, não é dar lição de moral.

Em seu discurso na noite de terça-feira (20) na convenção, o ex-presidente Barack Obama fez uma piada aludindo ao tamanho do pênis de Donald Trump, chamou o ex-presidente de mimimi, disse que ele tem mania de "dar apelidos infantis" para as pessoas e acredita em "conspirações loucas".

Ao comentar a "estranha obsessão" de Trump com o tamanho de plateias – o republicano disse, falsamente, que Kamala Harris usa inteligência artificial para aumentar seu público em fotos – Obama fez uma pausa e olhou para as próprias mãos. Foi uma referência pouco sutil à ideia (não comprovada) de que homens com mãos pequenas têm o pênis pequeno. A plateia explodiu de dar risada, e a piada viralizou.

Em 2016, quando o senador Marco Rubio, seu rival nas primárias, afirmou que Trump tinha mãos pequenas, o republicano "garantiu" que seu pênis tinha grandes proporções.

As piadas infames não se restringiram à convenção democrata.

Em comício na Pensilvânia, o vice na chapa de Kamala Harris, Tim Walz, fez uma alusão à notícia falsa de que J.D. Vance, vice de Trump, teria mantido relações sexuais com um sofá. Até ataques etaristas ganharam espaço. Em outro evento, Walz disse que Trump estava com "pouca energia" e "cansado" e que parecia o tipo de "cara que precisa descansar no final de semana", ecoando palavras usadas pelo republicano para alfinetar a avançada idade de seu então rival Joe Biden.

Na convenção e nos comícios, os discursos grandiloquentes sobre como Trump representa uma ameaça à democracia ficaram em segundo plano.

Depois de rotularem Trump e Vance como "esquisitos", os democratas dobraram a aposta no escárnio ao republicano. Não, ele não é uma ameaça, ainda que suas ações sejam perigosas –Trump é simplesmente patético.

A campanha de Kamala já havia mergulhado de cabeça na linguagem das redes. Um exército de jovens da geração Z inunda o TikTok com cortes de vídeos de Kamala e memes, muitos com referências a coqueiros ou com fundo verde limão.

Os coqueiros vêm de um discurso em que Kamala relembra como sua mãe perguntava: "Você acha que simplesmente caiu de um coqueiro? Você existe no contexto em que vive e em relação ao que veio antes de você". O vídeo originalmente foi usado pelos republicanos para ridicularizar Kamala. Eles dizem que ela se perde em meio de frases e tem conversas sem sentido. Mas sua campanha "flipou" (virou) o meme e transformou a frase do coqueiro em uma piada autodepreciativa.

O fundo verde limão remete ao álbum da cantora Charli XCX, que anunciou apoio à democrata. "Kamala é ‘brat’," disse a cantora, horas após Biden desistir da disputa. Brat, na gíria da internet, é uma mulher baladeira, que às vezes apronta, mas é independente e forte.

A se confirmarem os rumores de que Taylor Swift anunciará apoio a Kamala durante a convenção, espera-se apoteose nas redes. Vale lembrar que Trump compartilhou imagens alteradas com IA em que Swift e suas fãs supostamente apoiam o republicano.

Progressistas, que costumam perder de lavada nas redes dos políticos de direita, acertaram o tom. Segundo levantamento do Hootsuite divulgado pelo Axios, Kamala teve 46 milhões de menções em redes sociais de 15 de julho a 15 de agosto. Já Trump teve 34 milhões de menções no mesmo período, com picos no momento em que ele anunciou J.D Vance na chapa e durante sua entrevista a Elon Musk no X.

Homem de meia idade, negro, sorridente, usando terno escuro, camisa branca e gravata azu, caminha, com um cartaz com os dizeres DNC 2024 ao fundo
Ex-presidente Barack Obama caminha para fora do palco após fazer discurso na convenção democrata, em Chicago. - CHARLY TRIBALLEAU/AFP

Os memes de "Laffin' Kamala (Kamala que dá gargalhadas, apelido dado por Trump à democrata, ao ridicularizar sua risada) tiveram bem menos engajamento que aqueles com "brat" e com coqueiros.

O vice-chefe da campanha de Kamala, Rob Flaherty, disse em entrevista à CNN que há "jovens indomáveis de 25 anos" tocando as redes sociais da candidata e eles "coordenam a estratégia, pois são nativos nas plataformas". Segundo ele, nos últimos dois anos, a importância dos criadores de conteúdo digital cresceu muito "na medida em que o consumo de mídia das pessoas é cada vez mais personalizado e elas procuram seguir pessoas em quem confiam". A campanha credenciou mais de 200 criadores de conteúdo para cobrir a convenção do Partido Democrata nos Estados Unidos.

Ainda que Obama tenha criticado, em seu discurso, "políticos e algoritmos que nos ensinam a fazer caricaturas de outros e a trollar", os democratas desistiram de lutar contra o espírito das redes e adotaram os apelidos infantilizados e as piadas infames.

Kamala está à frente de Trump entre os eleitores de menos de 30 anos, tanto no voto popular nacional como nos estados-pêndulo. Trata-se do eleitorado mais mergulhado na cultura das redes –mas, também, dos eleitores com alto índice de abstenção

Em 2016, Trump conseguiu transformar a febre dos memes em votos. Obama, em uma época da protocampanha na internet, também. Resta ver se Kamala repetirá o feito.

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