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Uber, Google e outras empresas apostam em blogs para atrair novos funcionários

Sites apresentam a vida dentro de uma empresa e discussões sobre tarefas de programação complexas

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Jordan Teicher
The New York Times

Em 2021, Cristian Velázquez ajudou a Uber a resolver uma importante questão de software. Primeiro, ele e os seus colegas de equipe diagnosticaram uma falha de processamento de dados que poderia ter impedido o app de funcionar corretamente. Depois, desenvolveram uma forma de limpar memórias de forma mais eficiente, o que permite que a empresa economize tempo e dinheiro.

Essa é a versão resumida, pelo menos.

O público pode ler um relato mais detalhado do projeto de Velázquez no blog de engenharia da Uber, em um post intitulado "como poupamos 70.000 ‘cores’ em 30 serviços críticos para a missão". Mas é bom estar ciente de que a leitura será mais fácil se você souber o que significa jargão como Go, CPUs e coleta de lixo.

Cristian Velázquez, engenheiro de software da Uber, na sede da empresa em San Francisco
Cristian Velázquez, engenheiro de software da Uber, na sede da empresa em San Francisco - Jason Henry/The New York Times

Em sua função como engenheiro de confiabilidade de site, Velázquez compreende totalmente esses termos. Mas naquela época, ele não sabia muito sobre blogs. De fato, apesar de estar trabalhando como engenheiro na Uber há quase três anos, ele não sabia que a empresa tinha um blog de engenharia até que lhe pedissem para escrever para ele.

"Esse é o primeiro emprego em que comecei a fazer mais trabalho externo", disse o engenheiro. Ele levou alguns meses para terminar o texto de sua primeira publicação. "Aprendi muito com ela", disse Velázquez. "Fazer o texto seguinte foi muito mais fácil".

É justo que seja assim, porque muita gente descobriu o blog de engenharia da Uber por intermédio de Velázquez. Seu post gerou mais de 84 mil visitas desde que foi publicado em dezembro de 2021, de acordo com dados internos da empresa, tornando-o uma das páginas mais populares do site.

A Uber é uma das diversas grandes empresas que esperam entrar em contato com engenheiros dessa forma. Organizações como Google, Apple e Meta, cujo objetivo é construir o futuro da tecnologia, também estão no jogo dos blogs —uma relíquia do passado da Internet.

Logo da Uber - Denis Charlet/AFP

Esses sites combinam vislumbres sobre como é a vida dentro de uma empresa a estudos de caso sobre tarefas de programação complexas. Os posts tendem a ter os títulos parecidos com os de trabalhos acadêmicos de pós-graduação, e o charme editorial de manuais de instruções. Muitas vezes, o objetivo deles é aumentar a transparência, oferecer recursos à comunidade de engenharia —e atrair pessoas para empregos nessas empresas.

"Ocupam a lacuna entre a página de carreiras de uma empresa e a descrição de funções dos empregados", disse Jennifer Hindle, diretora de marketing de produto da Stack Overflow, uma plataforma online onde os trabalhadores da tecnologia podem fazer e responder a perguntas.

A Stack Overflow constatou que 48% dos desenvolvedores utilizam esse tipo de blog e outros meios de comunicação social controlados por empresas quando pesquisam sobre possíveis empregadores.

"É mais ou menos como o Instagram funciona na vida real das pessoas, para mostrar os destaques de uma coisa cool", disse Devin Riley, engenheiro que trabalhou em empresas de tecnologia como o GitHub, uma plataforma de software aberto, e a Braintree, uma empresa de processamento de pagamentos. "Há muito trabalho tedioso, tarefas cotidianas corriqueiras, que precisa ser feito, nessas empresas de tecnologia, coisas que não são particularmente empolgantes e nunca vão ser destaque em seus blogs".

Riley deixou recentemente seu cargo no GitHub, depois de mais de três anos. Ele disse que se cansou do trabalho totalmente remoto e de um novo chefe que não lhe mostrava oportunidades de crescimento na carreira. Em sua busca de um novo emprego, ele definiu remuneração, a missão da empresa e a qualidade do produto como seus principais critérios. Um blog de engenharia não influenciará a sua decisão de aceitar emprego em algum lugar mais do que um salário alto influenciaria, mas ainda tem peso. Ele os consulta para encontrar pistas sobre o que uma empresa valoriza.

O engenheiro Devin Riley lê os blogs de potenciais empregadores para entender melhor o que eles valorizam
O engenheiro Devin Riley lê os blogs de potenciais empregadores para entender melhor o que eles valorizam - Jason Henry/The New York Times

"Os blogs de engenharia oferecem alguns sinais", ele explicou. "Sobre se as empresas consideram a engenharia como parte essencial do seu negócio, e se estão dispostas a investir em textos sobre aquilo que fazem".

Algumas empresas parecem investir com mais entusiasmo do que outras. Marcas como a Uber entram em detalhes sobre projetos importantes, mas os blogs de engenharia, em sua pior forma, às vezes parecem não mais que comunicados de imprensa disfarçados, e geram rejeição da parte de potenciais candidatos a emprego.

"Se eu ler um post em um blog e perceber facilmente que foi escrito por um vendedor, faço uma careta e desisto na segunda frase", disse David Walsh, engenheiro sênior na empresa de criptomoedas MetaMask, e também autor de um blog pessoal sobre tecnologia. "Se consigo distinguir que foi escrito por um engenheiro da equipe, estamos falando de alguém que esteve nas trincheiras e teve de realizar algo importante. É alguém por quem, como engenheiro, tenho admiração, e por quem posso sentir empatia".

Publicar blogs de engenharia internos e encorajar as pessoas a escrever para eles não é uma proposta sem riscos. Para que os posts sejam eficazes, eles requerem honestidade. No entanto, as empresas de tecnologia em geral gostam de manter o sigilo sobre os seus produtos, e não querem que vazamentos de informação deem aos concorrentes qualquer vantagem potencial.

Agora, essas mesmas empresas estão revelando voluntariamente os desafios que enfrentam e trazendo mais transparência.

Não é muito caro manter esse tipo de blog, dizem as empresas, já que os engenheiros normalmente não recebem pagamento adicional por sua escrita. Mas gerenciar esse tipo de publicação tem um preço em tempo. Engenheiros tipicamente recebem salários que estão entre os mais elevados da tecnologia. Contribuir para um blog os afasta do seu trabalho principal, de construção e manutenção dos produtos de uma empresa. Como resultado, às vezes levam meses para concluir um único post.

"Não importa que sejam os editores ou os engenheiros e cientistas de dados que assumem a liderança na redação dos textos: é sempre preciso que nossos especialistas invistam tempo no assunto - tempo que eles nem sempre têm", disse Anita Clarke, editora-executiva sênior da Shopify.

As empresas têm de considerar essa equação, durante um período especialmente caótico na tecnologia. O setor continua a criar dezenas de milhares de novos empregos todos os meses, mas, ao mesmo tempo, mais de 153 mil trabalhadores foram demitidos em 2022, de acordo com o layoffs.fyi, um site que acompanha demissões.

Mesmo para empresas que precisam acomodar a possibilidade de demissões, é vital contratar engenheiros qualificados. Pesquisas mostraram que os fundadores e executivos de tecnologia acreditam que as funções de produto e engenharia são as mais difíceis de preencher.

"Isso é um desafio para os empregadores", disse Hindle, da Stack Overflow. "A tecnologia não está se desacelerando. Eles ainda estão batalhando para preencher aquela lacuna, para atender à necessidade de talento tecnológico".

Antes de começar na plataforma de comércio eletrônico Shopify como desenvolvedor, em 2020, Josh Larson visitou o blog de tecnologia da empresa, que foi concebido para engenheiros e cientistas de dados. "Isso oferece um vislumbre das ferramentas que estão sendo utilizadas", ele disse. "Eles usam o que há de mais moderno? O blog é sempre atualizado ou foi atualizado pela última vez há três anos?". Seu futuro empregador passou no teste.

Dois anos mais tarde, ele se transformou em um dos autores que respondem por posts no blog. (Larson desfruta de uma vantagem desleal: estudou jornalismo na faculdade.) Em junho, ele publicou "como construímos o Hydrogen: uma estrutura React para a criação de lojas customizadas", que analisa os bastidores de como a Shopify construiu um novo conjunto de ferramentas para desenvolvedores. Apesar de ter 2,5 mil palavras de extensão, o texto se tornou um dos mais populares do ano no site, ao expor a forma pela qual a Shopify utilizou o feedback de clientes para melhorar o seu produto.

É um bom exemplo de por que o blog tecnológico da Shopify se tornou uma história de sucesso na indústria. O tráfego anual ultrapassou um milhão de visualizações em 2022 – crescimento de 56% desde 2021, segundo a empresa – o que indica que, quando o blog é bem feito, há uma audiência significativa interessada neste tipo de informação.

"O que se ouve repetidamente sobre escrever, especialmente na internet, é que ‘isso já foi escrito sobre' ou ‘não sei do que estou falando’", disse Larson, expressando dúvidas que muitos blogueiros certamente já tiveram no passado. Ele encoraja os seus colegas engenheiros a não se desanimarem. "Sua perspectiva será útil para outras pessoas", ele disse, acrescentando: "Só não tenha medo de compartilhar o que aprendeu".

Tradução de Paulo Migliacci

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