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manuel da costa pinto
Clássico de Stendhal é fábula sobre o calculismo da Europa pós-napoleônica
Em "A Cartuxa de Parma", a tal cartuxa (convento de uma ordem religiosa) só é mencionada na última página. É nela que Fabrice Del Dongo, herói do romance de Stendhal, refugia-se após uma sequência de peripécias, perseguições políticas, prisões e frustrações amorosas.
Entender por quê Stendhal deu esse título obscuro ao livro faz parte de um quebra-cabeça que percorre a obra de Henri Beyle -verdadeiro nome desse escritor que, ao longo da vida, utilizou centenas de pseudônimos e produziu farsas literárias que são obras-primas.
Johan Olaf Sodermark/Reprodução | ||
Clássico de Stendhal é fábula sobre o calculismo da Europa pós-napoleônica |
Exemplo dessas fraudes são suas "Crônicas Italianas", em que ele nos apresenta aventuras galantes que teria encontrado em manuscritos dos séculos 16 e 17. Ao reescrever tais histórias, Stendhal busca cultivar um estado de espírito passional e uma energia individual que desapareceram da França após Napoleão Bonaparte --e que ele só encontrava num país solar como a Itália, economicamente atrasado, porém intocado pelo materialismo da burguesia financeira parisiense.
Foi um desses manuscritos, "Origem das Grandezas da Família Farnese", que serviu de base para "A Cartuxa de Parma". A paixão proibida de Fabrice pela jovem Clélia e as intrigas das quais ele se salva, graças à intervenção da tia (a duquesa Sanseverina) e de seu amante (conde Mosca), foram inspiradas nos Farnese e aclimatadas à Era Napoleônica, duplicando a estratégia do fingimento.
Na cena mais célebre do romance, Fabrice vai ao encontro das tropas francesas e acaba no meio da batalha de Waterloo, sem compreender o que está acontecendo. A imagem de um herói movido mais pelo ímpeto do que pelo entendimento das frias manobras históricas se espraia pelo romance e é o emblema de uma nobreza que resiste aos arranjos e ao comodismo de sua própria classe.
O encanto de "A Cartuxa de Parma" está no ardor picaresco com que as personagens vivem suas desventuras afetivas, alheias às maquinações políticas, das quais só participam para conseguir que a volúpia amorosa triunfe sobre as farsas da sociedade.
LIVRO
A CARTUXA DE PARMA * * * *
AUTOR: Stendhal
TRADUÇÃO: Rosa Freire d'Aguiar
EDITORA: Penguin-Companhia das Letras (616 págs., R$ 35)
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CONEXÕES
LIVROS
O VERMELHO E O NEGRO * * * *
O protagonista desse romance, Julien Sorel, é a versão plebeia de Fabrice Del Dongo: discípulo de Napoleão, tenta ascender socialmente conquistando as mulheres, mas sem sucumbir ao calculismo.
AUTOR: Stendhal
TRADUÇÃO: Raquel Prado
EDITORA: Cosac Naify (2003, 576 págs., R$ 89)
NAPOLEÃO * * *
Biografia em que Stendhal dá ênfase ao caráter revolucionário do general francês, deixando em segundo plano o pragmatismo do estadista.
AUTOR: Stendhal
TRADUÇÃO: Eduardo Brandão e Kátia Rossini
EDITORA: Boitempo (1995, 198 págs., R$ 41)
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LIVRO
GERMINAL * * * *
Émile Zola; tradução de Mauro Pinheiro (Estação Liberdade, 560 págs., R$ 79)
Precursor do engajamento político de escritores e intelectuais, Zola (1840-1902) compôs painéis naturalistas da sociedade francesa e de seus conflitos ideológicos. Aqui, uma revolta de mineiros contra a exploração econômica ganha matizes épicos, culminando na imagem do "exército negro" de homens cobertos de carvão germinando dos sulcos da terra.
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DISCO
ARRANJADORES * * *
Orquestra Experimental de Repertório (Núcleo Contemporâneo, R$ 99,50, CD triplo)
Registro de uma série histórica de concertos de 1992, organizada pelos irmãos Myriam e Benjamim Taubkin, em que arranjos como os de Rogério Duprat e Egberto Gismonti cancelam fronteiras entre popular e erudito. A maioria das peças tem regência de Jamil Maluf, mas o álbum inclui Guerra Peixe regendo sua versão dos afrossambas de Baden Powell e Vinicius de Moraes.
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FILME
OS NOMES DO AMOR * * * *
Michel Leclerc (Paramount Home Entertainment, R$ 29,99)
Nessa comédia política francesa, a filha de um imigrante argelino transa com direitistas empedernidos para corrigi-los ideologicamente. Seu esquerdismo ninfomaníaco entra em crise quando conhece um comportado judeu socialista. Destaque para a participação do ex-premiê Lionel Jospin, que ironiza as próprias convicções multiculturais em tempos conservadores.
Divulgação | ||
Bahia Benmahmoud (Sara Forestier) e Arthur Martin (Jacques Gamblin), em cena de "Os Nomes do Amor" |
Manuel da Costa Pinto é jornalista e mestre em teoria literária e literatura comparada pela USP. É editor do 'Guia Folha - Livros, Discos, Filmes' é também do programa 'Entrelinhas', da TV Cultura. Escreve aos domingos.
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