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25/12/2006 - 09h18

Paulo Lacerda admite que governo usou imagem da PF na eleição

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ANDRÉA MICHAEL
da Folha de S.Paulo, em Brasília

O diretor-geral da Polícia Federal, Paulo Lacerda, 60, reconhece, mas acha "normal", que o governo federal tenha feito uso eleitoral da atuação da PF para reeleger o presidente Luiz Inácio Lula da Silva: "Se o governo sofre críticas por eventuais erros da polícia, por que não deveria usar aquilo quando ela acerta? Acho natural". Para Lacerda, foi o contexto eleitoral que fez a mídia "exagerar" na reação quando da suposta pressão do delegado Moysés Eduardo sobre repórteres da "Veja" em depoimento à PF e quando o sigilo de dois telefones usados pela Folha foi quebrado indevidamente, durante as investigações do caso do dossiê antitucano.

FOLHA - O sr. também ficará por mais um mês no governo, como o ministro Márcio Thomaz Bastos?
PAULO LACERDA
- Meu compromisso foi de, tão logo estivesse indicado o novo diretor-geral da PF, eu sairia. Devo permanecer neste período também.

FOLHA - E se o presidente Lula pedir para o sr. ficar?
LACERDA
- O ministro me disse que o presidente iria pedir para eu ficar. Aí eu falei: "Ministro, não posso dizer não ao presidente da República. Então, o sr. mesmo tem que dizer a ele para ele não me convidar". Foi isso. Ele não vai me convidar.

FOLHA - Quem sucederá o sr.?
LACERDA
- É preciso saber primeiro quem será o novo ministro da Justiça.

FOLHA - Quais suas principais realizações e dificuldades no cargo?
LACERDA
- A administração é de um grupo de pessoas, não apenas do diretor-geral. São pessoas escolhidas com muito critério --e com acerto na maioria dos casos--, que compreenderam bem o papel da PF como um órgão importante do Estado brasileiro, bem como a necessidade de modernizar os seus métodos de trabalho, de observar todas as regras e princípios de legalidade. O que deu mais visibilidade à PF foram essas grandes operações. Entretanto houve um intenso trabalho interno, de reestruturação organizacional. Setores novos foram criados, houve aquisição de equipamentos modernos, que vieram a dar melhores condições de trabalho. Um fator importante foi o aumento do efetivo, conseguido com uma importante ajuda do Ministério da Justiça.

FOLHA - E a pirotecnia?
LACERDA
- Falou-se muito da exibição das operações. Mas nosso objetivo nunca foi esse. Buscamos sempre, dentro do possível, dar a maior transparência ao trabalho, para que a sociedade soubesse que pode contar com uma instituição que valoriza suas atribuições, tenta realizar um trabalho sem truculência, respeitando os princípios legais. É muito difícil você ter isso numa instituição que lida com setores de criminalidade violenta. A história no Brasil tem demonstrado que o policial acaba se tornando extremamente violento, e nós temos trabalhado muito na capacitação do policial para que isso não ocorra, que a gente use a técnica, a inteligência exatamente para evitar que sejamos alvos dessas críticas. Tivemos pouquíssimas situações de denúncias de abusos de policiais.

FOLHA - A PF foi usada como bandeira eleitoral pelo governo.
LACERDA
- A minha visão é de que a PF foi também muito criticada politicamente. Então, se em determinado momento setores do governo usaram as boas ações da PF em prol da imagem do governo, eu acho isso natural. Se o governo sofre críticas por eventuais erros da polícia, por que não deveria usar aquilo quando ela acerta? Acho natural. Nunca entrei nesse jogo político. O uso da imagem da PF na cena política foi com base nos trabalhos que a PF realizou. Ninguém veio aqui dentro da PF para pegar entrevista minha para dizer "este governo é muito bom". O que se usou foram trabalhos da PF que eram públicos. Percebi que foram usados na campanha como uma demonstração de um órgão no qual o governo investiu e que produziu resultados que estavam patentes.

FOLHA - O sr. recebeu pedidos ou mesmo recados em relação a investigações de interesse do governo?
LACERDA
- Nunca, jamais, de forma nenhuma. Isso aí eu faço questão de reprisar: a PF trabalhou com total independência, o que se deveu muito à postura do próprio ministro Márcio [Thomaz Bastos]. Ele sempre procurou ser informado de questões que deram repercussão, é natural. Mas nunca emitindo juízos de valor, como dizer "vocês estão errados".

FOLHA - Como o sr. avalia a atuação da PF no caso Waldomiro e no do dossiê contra políticos tucanos?
LACERDA
- O êxito do trabalho da PF vem nas investigações que começaram com um trabalho de inteligência da PF e seguem com total sigilo, até o desencadeamento das operações. Mas aí vêm aquelas investigações que, a partir de uma notícia da mídia, cobra-se a ação da PF. O Waldomiro Diniz, com toda a certeza, se [o caso] não tivesse sido iniciado com uma reportagem na qual já se conta o fato, teríamos tido uma resposta muito mais clara e positiva daquele episódio. A investigação seria conclusiva sobre se houve ou não houve alguma prática, mas hoje isso ainda não foi definido. Quanto ao dossiê, o que o antecede é um trabalho de investigação muito bem-sucedido sobre os sanguessugas. Depois, recebemos denúncias de que alguns envolvidos estariam utilizando práticas de extorsão contra pessoas, que era o dossiê. Mas, a partir do momento em que o caso se tornou público, não havia como deixar passar em branco: quase R$ 2 milhões, seria risco demais a PF dar corda naquele momento.

FOLHA - "Dar corda"?
LACERDA
- Como fazemos algumas vezes: com autorização judicial, deixamos as coisas acontecerem e continuamos investigando. Ali não teve como, porque era uma situação que a sociedade precisava saber, sob pena de hoje sermos acusados de ter dado cobertura a uma ação ilícita. Lamentavelmente, por ser às vésperas da eleição, foi algo explorado pela oposição. Se você quiser ver o valor de uma instituição, nesse caso se pode ver o lado positivo da PF: se a gente quisesse proteger o governo, sabendo que aquelas pessoas eram ligadas ao governo, era quebrar o galho ali, ninguém iria saber de nada. No entanto, a PF adotou, como sempre, uma postura de rigor, e prendeu inclusive um ex-policial nosso [Gedimar Passos].

FOLHA - O dossiê produziu dois momentos de forte atrito entre a PF e a mídia: a suposta pressão do delegado Moysés Eduardo sobre repórteres da revista "Veja" num depoimento e a quebra do sigilo de dois telefones usados pela Folha.
LACERDA
- Com todo o respeito, acho que isso faz parte desse embate de campanha, no qual alguns órgãos da mídia se posicionaram pró e contra o governo. Sem dúvida nenhuma que tudo que foi feito estava dentro dos procedimentos. No caso da "Veja", você e inúmeros outros jornalistas já foram chamados diversas vezes para falar na polícia sobre algum fato, e simplesmente invocam o direito constitucional de não falar para preservar seu sigilo profissional. Por que não fizeram isso? Preferiram falar um monte de coisas para depois dizer que o delegado... Houve um pouco de exagero daquilo, dentro do cenário político. Não fosse por isso, aqueles repórteres não teriam adotado essa postura.

FOLHA - E quanto à quebra de sigilo do telefone da Folha?
LACERDA
- Não foi uma investigação direcionada ao veículo de mídia Folha de S.Paulo. Aquilo estava num contexto de investigação dos telefones que apareceram no visor do celular de um dos investigados.

FOLHA - Já recebeu algum convite?
LACERDA
- Nenhum, e acho até estranho meu nome ter surgido como indicado para esse ou aquele órgão público. Não recebi nem convite para o Réveillon.

FOLHA - Qual seu dia pior e o melhor neste cargo?
LACERDA
- Tive dias muito positivos, com soluções administrativas, o aumento do efetivo, o reconhecimento da sociedade. O pior momento para mim é ter, em 30 anos, de processar um jornalista e um veículo de mídia irresponsáveis, que confundiram a realidade com campanha política. Chegou a um nível de irresponsabilidade de dizerem que, mesmo não tendo prova nenhuma, iriam publicar uma matéria que fazia referência a contas bancárias no exterior, quando a gente tem nos nossos compromissos de vida dificuldades para manter a família... e depois ter de dar explicações a pessoas próximas de que aquilo é uma calúnia.

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