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14/06/2004 - 08h23

Crise aproxima mulheres de presos de facções rivais

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ELVIRA LOBATO
da Folha de S.Paulo, no Rio

Ao colocar integrantes do Terceiro Comando e do Comando Vermelho em um mesmo presídio, o Bangu 3, em abril deste ano, o governo do Rio conseguiu o que parecia impossível: aproximar facções inimigas no narcotráfico. Um princípio de aproximação começou pelas mulheres dos presos.

Na segunda-feira passada, 60 mulheres de presidiários das duas facções reuniram-se na Assembléia Legislativa do Rio para discutir uma agenda comum de reivindicações. Segundo a presidente da Afap (Associação de Familiares e Amigos de Presos do Estado do Rio de Janeiro), Simone Corrêa de Menezes, foi a primeira reunião com participação expressiva de mulheres de presos do Terceiro Comando. A associação tem predominância de mulheres do Comando Vermelho.

Há dois meses houve um primeiro encontro na sede da Pastoral Carcerária, segundo Vera Lúcia Alves, presidente do Movimento pela Vida. Para ela, o Estado joga uma facção contra a outra e as famílias unidas terão mais força para negociar. "A união das mulheres não vai acabar com as facções, mas ajudará a acalmar as comunidades carcerárias", opina.

O encontro na Assembléia Legislativa foi presenciado pela Folha. Muitas falaram ao microfone, mas nenhuma se identificou. No final, houve aplausos, choro e troca de números de telefones. "Não somos comadres nem parentes. Somos adversárias, porque nossos maridos o são. Mas não somos inimigas", disse uma delas.

Duas prisões

Na quarta-feira, a Secretaria de Administração Penitenciária retirou os presos do Terceiro Comando de Bangu 3 para realizar obras no local. Mas o secretário Astério Pereira dos Santos avisou que a prisão será dividida em duas, com entradas separadas para visitas, e que eles retornarão quando tudo estiver pronto.

Após o motim na Casa de Custódia de Benfica, em que uma guerra entre facções resultou na morte de 30 detentos do CV e do TC e de um agente, a Afap mandou uma carta à governadora Rosinha Matheus (PMDB) e ao secretário de Segurança, Anthony Garotinho, na qual chama atenção para a corrupção nos presídios e diz que a política do Estado em relação aos presos "só cria antipatia, ódio e escândalo".

Embora critique a política de segurança do governo, Simone Menezes diz que o Estado do Rio é o único a manter um canal formal de comunicação com as famílias dos presos. Há uma reunião mensal com o subsecretário de Administração Penitenciária, Aldney Peixoto, para discutir problemas pontuais dos presídios. As mulheres foram avisadas de que presos do Terceiro Comando seriam retirados de Bangu 3 quase dez horas antes do anúncio oficial.

Professor

Simone Menezes, 44, é mulher de um dos fundadores do Comando Vermelho, William da Silva Lima, o Professor. Ele foi condenado a 70 anos de prisão por assaltos a bancos, com base na Lei de Segurança Nacional, durante o regime militar. Já cumpriu 36. Conviveu com presos políticos no presídio da Ilha Grande, no litoral sul do Rio, onde assimilou um discurso marxista. Atualmente, cumpre pena em Bangu 3.

Nascida em uma família de políticos, em Salvador --é prima do ex-ministro da Saúde Carlos Corrêa, do governo Sarney--, Simone Menezes estudou até o quarto ano de direito e se autodefine como uma "diplomata marginal". Tem três filhos com Professor e é assessora parlamentar do deputado estadual André do PV.

A Afap foi criada em 2002 para lutar pela melhoria das condições de vida dos presos e por maior dignidade para as famílias dos detentos. A presidente da entidade refere-se às mulheres dos presos como "mulheres invisíveis", por sofrerem humilhações, em silêncio, dentro e fora dos presídios.

Ela diz que há 1,1 milhão de mulheres cadastradas como parentes de presos no país. Só no complexo penitenciário de Bangu, são 50 mil. "Somos um elefante sem consciência do nosso tamanho. Temos baixa auto-estima, aceitamos ser tratadas como escória."

Segundo ela, dos 70 mil parentes de presos que possuem carteiras para entrar em presídios no Estado, cerca de 90% são mulheres. Ela conclui que os homens abandonam os parentes presos.

Menezes defende a idéia de que o "capitalismo selvagem" e a globalização chegaram ao mundo do crime e que o tráfico de drogas virou um "posto de trabalho arriscado" para os jovens que não conseguem lugar no mercado de trabalho. Ela se refere aos traficantes como "comerciantes".

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