O
deslumbramento da família Suplicy
Depois de eleita, Marta Suplicy ganhou uma poderosa inimiga:
Marta Suplicy.
Ao lançar-se
candidata à Presidência da República em
2006, ela enfraqueceu um poderoso argumento de que dispunha
para obter apoio político.
Poucos
dias depois da vitória nas urnas, Marta Suplicy propôs
uma trégua, afirmando que a cidade estava destruída,
à beira do caos. Para recuperá-la, sugeria um
governo de "salvação municipal".
Em nome
dessa salvação, pediu a contenção
das "picuinhas". Tradução: nas votações
na Câmara, os vereadores não deveriam guiar-se
pelas sucessões estadual e federal.
O abandono
e ingovernabilidade de São Paulo justificariam tamanha
abnegação.
É
um discurso politicamente ingênuo, mas moralmente correto,
capaz de agradar ao cidadão comum, interessado em soluções.
Apenas
o mix de deslumbramento, inexperiência e cobiça
explica um erro político tão primário.
***
Ao transmitir
a informação de que já está de
olho no Palácio do Planalto, antes mesmo de tomar posse
na prefeitura, ela cria, sem necessidade, adversários
-- grupos também interessados em chegar lá.
Inclusive no PT.
Tradução
óbvia: apoiar Marta é apoiar um projeto presidencial.
O que vai obrigá-la sempre a explicar se, por trás
de uma decisão municipal, não se movimenta o
sonho federal.
Se a autora
do apelo de que todos deveriam se conter em nome da cidade
destruída, sai na frente e lança sua candidatura
presidencial, como pedir abnegação aos vereadores?
Por que
iriam facilitar a vida da prefeita se está em jogo,
tão precocemente, uma candidatura presidencial.
O estrago
ultrapassa as picuinhas partidárias. O fator 2006 serve
para instalar a suspeita, entre os paulistanos, inclusive
eleitores de Marta, de que a cidade está em segundo
plano.
***
Ela até
pode afirmar que, para ser presidente, tem apresentar bons
resultados.
Não
vai ser fácil convencer de que está feliz por
ser prefeita. afinal, a cidade é apresentada como um
trampolim. Se ela quer chegar ao Palácio do Planalto
em 2006, significa que não vai sequer tentar a reeleição.
Seu cronograma
parte do pressuposto de que, em quatro anos, irá deixar
a cidade em ordem -- excesso de arrogância ou falta
de experiência. Ou as duas coisas juntas.
Se levarmos
a sério suas afirmações de campanha,
com os números da crise urbana, quatro anos é
muito pouco, quase nada.
Para completar,
ela se envolve numa exótica disputa com o marido, Eduardo
Suplicy, que, deslumbrado com o apelo do sobrenome, fortificado
ainda mais com a vitória da mulher, também se
lança candidato.
Discute-se,
em tom de fofoca e frivolidade, se ela apoiaria o marido que,
se eleito, inviabilizaria legalmente a candidatura da mulher.
É
um debate totalmente dispensável e desgastante.
As enchentes
já se insinuam, os cofres estão vazios, não
se sabe o tamanho do rombo financeiro. Embalado pelas promessas
de campanha, os cidadãos estão ansiosos por
mudanças, com uma expectativa ainda envolta nas ilusões
eleitorais. Segmentos do PT mostram-se insatisfeitos por apitar
menos do que gostariam de apitar na formação
do secretariado.
Não
deveria, em tese, haver tempo para outra preocupação,
senão com a crise da cidade.
***
A prefeita
eleita derrapou numa leitura errada das urnas. O paulistano
está moralmente abatido, desesperançado, refém
de uma cidade deteriorada.
A eleição
de Marta foi apenas em parte a vitória do PT. Ela aglutinou
da direita à esquerda, empresários e trabalhadores,
com um programa moldado pela ética e pela inclusão
social --- e pela idéia de que salvar uma cidade falida
estaria acima de tudo.
Mas, sequer
tomou posse, já quer se mudar. É comum a vitória
subir à cabeça de políticos que ganham
eleições. Mas ela ganhou também para
mostrar que seria diferente e romperia a "normalidade
política" simbolizada por Paulo Maluf -- alguém
que fez de todos seus cargos trampolim para a presidência.
Marta
Suplicy tem espírito público, paixão
pela inclusão social, quer fazer o melhor que puder
pela cidade, está cercada de gente de qualidade.
Se consegue
sair do campo das intenções e fazer uma boa
administração é, por enquanto, uma incógnita
-- mas, no mínimo, atrapalha apresentar a cidade como
trampolim.
Político que não cai na real, movido mais pela
cobiça do que bom senso, costuma ver a realidade desabar
em sua cabeça.
***
PS: Vamos
reconhecer que o secretariado de Marta Suplicy é de
boa qualidade, composto por técnicos experientes. A
cidade ganha com a experiência urbanística de
um Jorge Wilheim. É alentador ver o jurista Hélio
Bicudo, que fez da sua vida a denúncia de arbitrariedades
policiais, cuidar da política de direitos humanos.
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