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Bye, bye, Banespa

ALOIZIO MERCADANTE

O Banespa é um banco estratégico pela capilaridade de sua implantação, em especial em São Paulo, com mais de 500 agências e 750 postos de atendimento, um patrimônio superior a R$ 25 bilhões e um lucro líquido de R$ 1,1 bilhão em 1999.

Com 90 anos de idade, o Banespa sobreviveu à crise de 1929, ao colapso da economia cafeeira, à Revolução de 1932, às duas grandes guerras, à ditadura militar e foi decisivo na alavancagem da economia paulista ao longo de todo o século. Quase não aguentou os governos Quércia e Fleury e agora é ameaçado pela passividade de Covas e pelo desmonte nacional promovido por FHC.

Recorde-se que a crise dos bancos estatais não decorre apenas de desmandos administrativos e muita corrupção, mas do desequilíbrio econômico promovido pela política econômica irresponsável adotada ao longo das últimas duas décadas.

Sua origem vem da crise da dívida externa e das finanças públicas dos anos 80, que foi seguida por um processo de desorganização, fragilização e desnacionalização da economia brasileira, intensificado a partir do governo FHC.

No setor financeiro os números são eloquentes. Por meio de autorizações do presidente da República, que violaram abertamente o art. 52 das Disposições Transitórias da Constituição, a participação dos bancos com controle estrangeiro no total de ativos do setor passou de pouco mais de 7% em 1993 para 22% em 1998, enquanto a participação dos bancos públicos caiu de 44% para 28%. E, em 1999, dos 25 maiores bancos, 11 já estavam sob controle externo.

A promulgação de um decreto presidencial em dezembro passado permitindo ao capital estrangeiro participar com até 100% na privatização do Banespa é a continuidade dessa política, ditada pelo FMI, de que “o governo exercerá com determinação” sua política de redução do papel dos bancos públicos na economia.

À margem de visões partidárias, existem razões técnicas de peso contra a desnacionalização do sistema financeiro.

A primeira é a perda de capacidade do país para gerir o processo de financiamento interno da economia “pari passu” ao aumento do peso de agentes financeiros guiados por critérios exógenos, tanto maior quanto menores a gravitação internacional das decisões do Banco Central e a eficácia dos meios de fiscalização financeira e controle dos fluxos de capital.

A segunda é a ampliação dos mecanismos de internacionalização da instabilidade externa, seja do sistema financeiro global, seja de mercados financeiros específicos, bem como, em contrapartida, o padrão de resposta dos agentes financeiros externos diante de situações de crise interna.

A terceira é a maior competitividade dos bancos estrangeiros, em razão de seu acesso a recursos externos e a taxas de captação inferiores, que fortalece a tendência à concentração e desnacionalização crescentes do sistema financeiro nacional.

Agregue-se que os bancos estrangeiros têm restrições de suas matrizes para utilizar recursos próprios em operações com títulos públicos, especialmente aqueles com prazos mais longos, em razão do “risco Brasil”.

Finalmente, a afirmação de que a presença de bancos estrangeiros aumenta a concorrência e contribui à redução da taxa de juros não resiste aos fatos. Do mesmo modo, o eventual aumento do preço da venda que resultaria da participação estrangeira nos leilões é um argumento importante, mas não determinante, pois o ágio sobre o preço mínimo é uma antecipação da receita fiscal e será dedutível do Imposto de Renda futuro.

Apesar de toda a campanha oficial e não por acaso, a opinião pública, segundo pesquisa recente do Datafolha, manifestou-se contrária à privatização (48%) e à desnacionalização (71%) do Banespa. Mesmo assim, o presidente, “determinado”, manteve sua posição.

Diante desse quadro, os deputados José Dirceu e Ricardo Berzoini, do PT, apresentaram um projeto de decreto legislativo para sustar decreto presidencial de dezembro, por falta de base constitucional.

O deputado Gerson Peres (PPB) e outros, com o apoio de 325 deputados, apresentaram uma emenda constitucional que traz para a competência exclusiva do Congresso Nacional a autorização da entrada de capital estrangeiro no sistema financeiro. É a aliança possível entre os que querem um banco público com os que recusam sua desnacionalização.

A proposta do PT é transformar o Banespa em um banco público. Banco público com novos mecanismos de controle de fiscalização e nova composição acionária entre funcionários que já detêm, por meio da Cabesp, 15,6% das ações ordinárias e mais 3,9% pelo Banesprev e que conjuntamente com os acionistas minoritários, prefeituras e pequenos produtores rurais e urbanos deveriam ter prioridade no lote de 16% das ordinárias que criminosamente lhes está sendo oferecido com um preço três vezes superior ao de mercado e sem financiamento.

O capital privado participaria conjuntamente com o governo do novo tripé de acionistas. Banco público para manter o crédito social, como a atual participação de 50% no crédito agrícola da região, e continuar fomentando o desenvolvimento econômico.

É muito difícil saber qual o limite aceitável de desnacionalização, mas não há nenhum país importante da economia internacional que não possua um vigoroso núcleo de bancos nacionais. Alguns dos que passaram por uma reestrutura bancária profunda, como a Espanha, não deixaram os estrangeiros entrar.

Se o Banespa for desnacionalizado, o controle estrangeiro sobre o segmento privado do setor financeiro ultrapassará os 50%. A reconstrução do um sistema eficaz de financiamento do desenvolvimento reivindica o Banespa como banco público. Sua privatização é um grave equívoco. Sua eventual desnacionalização é muito mais grave e um novo passo na marcha da insensatez.

Aloizio Mercadante Oliva, economista e professor universitário licenciado da PUC e Unicamp, foi candidato a vice-presidente da República com Lula em 1994, é deputado federal e líder do PT na Câmara dos Deputados.

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