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Conheça Piza, o advogado com a missão de barrar a privatização

EDNILSON FERNANDES
da Folha Online


Ele traz no currículo a experiência de emperrar as maiores privatizações brasileiras no governo Fernando Henrique Cardoso. As enxurradas de liminares nos leilões do sistema Telebrás e da Companhia Vale do Rio Doce tiveram como mentor o advogado João Piza, 44, que hoje defende a luta do Sindicato dos Bancários para barrar a venda do Banespa.

Casado, pai de quatro filhos, ele “perdeu” para o governo as duas primeiras brigas. Agora, mais experiente, Piza vive um momento cômodo na disputa com o Planalto. Tem duas liminares acatadas pelo STF (Superior Tribunal Federal) inviabilizando a privatização do banco.

Na opinião de Piza, o leilão tem de ser freado graças a cerca de 30 erros jurídicos no processo comandado pelo Banco Central. Discorda do argumento do Planalto de que a oposição à privatização é política e corporativista. “Não sou contra toda e qualquer privatização. Sou contra apenas às privatizações que permitam negociatas. A maior garantia para que isso não ocorra é o comprimento irrestrito da lei”, diz.

Para ele, a tentativa da União de vender o banco desrespeita o art. 37 da Constituição e ainda a Lei de Licitações. “O governo só sabe fazer a defesa histérica da privatização, sem se preocupar com a lei”. Segundo Piza, o Planalto lançou uma campanha para destruir a imagem do banespa, dizendo que tudo vai virar cinzas se o leilão não vier.

João Piza concedeu uma entrevista exclusiva à Folha Online. Na conversa, o advogado do Sindicato dos Bancários se mostra radicalmente contra o governo de FHC, aposta no PT e na esquerda para mudar o rumo do país e ainda alertou para o processo de “emburrecimento” da juventude brasileira. “Os jovens de hoje só conhecem, em Cuba, o garoto Elián. Fidel Castro é apenas o presidente de uma ilha”, afirma.

Folha Online - A privatização do Banespa só sai daqui a dois anos como diz o governo federal?

João Piza Se o Planalto quisesse, o Banespa seria privatizado muito antes disso. Eles tem a necessidade de criar um terrorismo e dizer que o banco vai virar pó. Nunca as liminares contrárias ao leilão derrubaram as ações do banco na Bovespa. O que provoca as quedas são as declarações do Banco Central.

Folha Online - A tese para não privatizar o Banespa precisa ser carregada na ideologia e partidarismo?

João Piza Não tem nada de político e ideológico. A opção de privatizar um ente público cabe ao Executivo. Agora, a forma de privatização dentro da lei é um imperativo civilizatório. O que se discute é se o governo está respeitando esta lei, o que não vem fazendo.

Folha Online - Por quê?

O governo só faz a defesa histérica da privatização. Quer a qualquer custo e a qualquer preço. Neste caso, quer a custo da ordem constitucional.

Folha Online - Mas a pressão política pode mudar a decisão do STF de suspender o leilão?

João PizaO governo, além de pressionar ridiculamente os ministros do Supremo, porque entendemos que não são passíveis de pressão, está envolvido em uma campanha difamatória sobre o Judiciário. Diz que a privatização não caminha por picuinhas na Justiça. É uma atitude, no mínimo, destemperada e, no limite, desesperada.

Folha Online - Quais são os erros do governo?

João Piza O Ministério Público Federal elencou na ação contra a venda do banco 22 ilegalidades que ferem o art. 37 da Constituição e a Lei de Licitação. Nós localizamos outras tantas. Ao todo, são cerca de 30 violações. Portanto, que não venham falar em picuinhas e firulas jurídicas.

Folha Online - O senhor tentou barrar duas outras grandes privatizações brasileiras, Telebrás e Vale, e não conseguiu. O que mudou para garantir a vitória no caso Banespa?

João Piza Mudou tudo. Primeiro, mudou o ambiente social. Os escândalos envolvendo as outras privatizações mudaram a cabeça dos julgadores e daqueles que precisam analisar se a lei está sendo cumprida. Eu também tenho a experiência dos outros casos. Agora, joga-se para ganhar, não para marcar posição.

Folha Online - O advogado João Piza é contrário ao programa de privatização?

João Piza Primeiro, eu não advogo de modo próprio. Eu sou contratado. Segundo, eu tenho uma posição política e jurídica clara. Não sou contra toda e qualquer privatização. Sou contra à privatização que permite negociata. A maior garantia para isto é o comprimento irrestrito da lei.

Folha Online - Mas o senhor é favorável à privatização de setores estratégicos?

João Piza Não. Sou totalmente contrário à venda da Petrobras, por exemplo. Não só eu. A França também é contra e mantém suas estatais. Por que os Estados Unidos não privatizam a Nasa então?

Folha Online - Condena a globalização?

João PizaSou contra ver nossas teles sendo compradas por teles estatais de países estrangeiros. A privatização do antigo sistema Telebrás só serviu para aumentar tarifas e criar a dependência tecnológica.

Folha Online - Para quem participou das três privatizações mais polêmicas do país, qual foi a mais grave na sua opinião?

João Piza Estamos quase empatados. A privatização da Vale do Rio Doce hipoteca nossas reservas mineiras. A venda da Telebrás é uma rendição porque permitimos que as futuras gerações de brasileiros não irão controlar a sexta player de teles do mundo. Abrimos mão da soberania nacional na área mais sensível para o século 21.

Folha Online - Nesta linha de raciocínio, o que representa a privatização do Banespa?

João Piza Vamos abdicar da nossa soberania do sistema financeiro. Vamos perder instrumentos que podem nos proteger de uma eventual crise externa. Estamos ingressando no processo de globalização de forma subserviente e colonizada.

Folha Online - Para o senhor, então, é um caminho sem volta?

João Piza O Brasil só tem sorte em uma coisa. A sorte é que chegamos atrasados no processo de privatização. A Argentina foi apressadinha e hoje não tem futuro.

Folha Online - O Brasil, na sua opinião, terá um futuro sombrio?

João Piza Não necessariamente. O Brasil tem duas grandes contribuições. Temos ainda condições de construir a experiência mais rica de democracia plurirracial que existe no mundo. Temos ainda a possibilidade de construir um novo modelo de crescimento econômico. Uma terceira vocação seria colocar o país, do ponto de vista geopolítico, na direção da importância natural que tem. Mas é uma opção para o governo.

Folha Online - O governo optou?

João Piza Os vários governantes que passaram pelo país não merecem o povo que tem. O povo sempre acreditou.

Folha Online - E o governo Fernando Henrique?

João Piza Este é ainda pior porque o povo acreditava mais. Dos outros, esperava menos.

Folha Online - Quem, entre os que se apresentam para a sucessão presidencial, poderia levar o Brasil para este caminho?

João Piza Eu acho que temos muito pouco. Precisamos ver modelos de crescimento econômico mais claros. Hoje, o que se nota é que o governo não tem modelo algum. O que temos é uma postura de inserção colonizada no que se chamou de globalização, mas prefiro chamar de imperialismo unipolar.

Folha Online - O PT ainda é a grande salvação da esquerda?

João Piza Eu penso que o PT pode ser uma grande opção, mas não isoladamente. Precisa agir com conjunto com as demais forças da esquerda. Para mim, o PT perdeu nestes 20 anos a sua principal característica, que era o envolvimento nas bases com os problemas da sociedade. Hoje, o partido é mais parlamentar, priorizando as ações no Congresso.

Folha Online - Na sua opinião, o Brasil vive um processo de desprendimento às ideologias?

João Piza Há um processo em curso de emburrecimento e despolitização. A geração de hoje não sabe o que foi ditadura. Os jovens só conhecem, em Cuba, o garoto Elián. Fidel Castro é apenas o presidente de uma ilha. Isso é muito trsite. Como dizia meu falecido pai, nunca acredite em uma pessoa que não tenha intranquilidade de alma. Eu acho que as pessoas hoje vivem numa passividade incrível. É uma pena.


Aloizio Mercadante Oliva, economista e professor universitário licenciado da PUC e Unicamp, foi candidato a vice-presidente da República com Lula em 1994, é deputado federal e líder do PT na Câmara dos Deputados.

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