Saltar para o conteúdo principal

Publicidade

Publicidade

 
 
  Siga a Folha de S.Paulo no Twitter
23/08/2004 - 13h40

Vaz, candidato da situação na Fiesp, diz que governo é "moderado em excesso"

Publicidade

ELAINE COTTA
da Folha Online

O economista Cláudio Vaz, 56, é o candidato da situação à presidência da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo). Diz que sua candidatura foi uma "missão delegada por companheiros" e cobra do governo mais estímulo para o crescimento do mercado de trabalho.

"O governo está prudente em excesso", diz ao criticar a política moderada de redução dos juros adotada pelo Banco Central e a manutenção do elevado superávit primário que, segundo ele, freia o potencial de crescimento do mercado interno.
F.Beltramin/Folha Imagem
O economista Claudio Vaz
O economista Claudio Vaz


Em um eventual mandato na Fiesp, Vaz diz pretender intensificar a relação entre os diversos setores da economia, como trabalhadores, comércio e profissionais liberais. Acredita ainda que a tendência da indústria é migrar para o interior, o que não significa perda da importância da capital no cenário industrial.

"Não é que São Paulo perdeu a sua posição de sediar indústrias, é que todas as regiões metropolitanas do mundo a partir de um determinado momento não são mais competitivas para grande parte das operações da indústria de transformação", disse à Folha Online.

Veja os principais trechos da entrevista:

Folha Online - O que motivou a sua candidatura?
Cláudio Vaz
- A candidatura à presidência da Fiesp decorre de um conjunto de circunstâncias e da avaliação de poder cumprir a contento uma missão que é delegada por companheiros. Eu tenho uma trajetória de vida como industrial que pode-se dizer bem-sucedida, participo do meu setor, da administração da Fiesp e me considero preparado por conta da minha experiência como industrial nos dois tipos de representação, a Fiesp, que representa setores econômicos, e o Ciesp, que representa regiões do Estado.

Folha Online - Qual o futuro da indústria?
Vaz
- Nos últimos 15 anos e certamente nos próximos 15, nós teremos ainda uma maior intensidade industrial indo para o interior. É natural que isso aconteça. Não é que São Paulo perdeu a sua posição de sediar indústrias, é que todas as regiões metropolitanas do mundo a partir de um determinado momento não são mais competitivas para grande parte das operações da indústria de transformação.

Folha Online - Então São Paulo está perdendo competitividade?
Vaz
- Claro que ela [a capital] continua competitiva para inteligência, para indústrias do conhecimento, de alto valor agregado, de alta tecnologia. Mas a indústria manufatureira, que ainda é a maior parte das empresas, tem condições competitivas melhores no interior.

Folha Online - O sr. pretende fazer mudanças na forma de condução da Fiesp?
Vaz
- É impossível não haver. A atual gestão viveu os momentos mais turbulentos da história econômica recente do país e nesses momentos tivemos que fazer uma readaptação dessa federação para dar conta das demandas desses momentos. Hoje, o ambiente em que a indústria opera não é só mais estável, mas as perspectivas de futuro são melhores do que em 1998 ou 2001.

Folha Online - Então o ambiente hoje está mais favorável?
Vaz
- Claro que há um série de restrições e questões especialmente do crescimento do mercado interno, mas hoje temos uma federação que não só está pronta para subir de elevador, como dispõe de meios para isso. Essa nova gestão encontra uma entidade mais preparada que tem não só a possibilidade, mas a obrigação de acelerar sua atividade e sua atuação.

Folha Online - E como seria essa "aceleração" da atuação?
Vaz
- Essa intensidade passa por uma articulação com outros setores da economia, com os trabalhadores, com o comércio, com os profissionais liberais, que está aquém do que deveria ser.

Folha Online - Fiesp seria a articuladora desse movimento?
Vaz
- A Fiesp não se propõe a liderar isso porque esse é um tipo de entendimento que se alguém tentar ser líder não funciona. Nós nos propomos a participar junto com o comércio, com os profissionais liberais e com o trabalhadores, mantendo as divergências que a gente eventualmente possa ter, para um debate específico do que nos separa, mas procurando convergir para aquilo que nos une, que é expandir o mercado interno.

Folha Online - E há ambiente para esse tipo de articulação?
Vaz
- Temos de aproveitar. Temos um momento muito bom para as exportações e os investimentos de modo ainda muito seletivo começam a retornar.

Folha Online - Mas qual seria o ponto fraco?
Vaz
- O ponto fraco desse momento são alguns segmentos do mercado interno que estão ainda abalados por uma taxa de juros que está travando o mercado. E por políticas de emprego. O governo está prudente em excesso. Está fazendo um superávit extra ao invés de dar partida a algumas atuações da grande indústria da construção, que é o maior potencial empregador que esse país tem e que está há mais de três anos vivendo de brisa.

Folha Online - Quais serão as saídas para estimular isso?
Vaz
- Precisamos de saneamento, de reparação viária das rodovias, as federais especialmente, de toda a área de infra-estrutura, a área portuária, de habitação popular. São carências brutais que através de uma iniciativa incorpora a curto prazo muitos milhões de trabalhadores que estão aí ao léo, ao deus dará.

Folha Online - E como fazer a indústria participar disso?
Vaz
- Junto com isso, temos as questões que afetam muito a nossa indústria, referentes a participação nos acordos comerciais que estão em gestação --seja Alca, seja UE, sejam os próprios atritos no Mercosul, acordos bilaterais com China, Índia, México, Chile...

Folha Online - A Fiesp tem sido mais participativa na discussão desses temas...
Vaz
- Justamente. E para mim temos que acelerar isso. A concorrência desleal é um tema que temos que enfrentar com mais vigor. A pirataria, o contrabando, a falsificação. Antigamente, isso estava praticamente restrito a CD e a alguns similares. Hoje, afeta produtos químicos, industriais, de consumo, marcas brasileiras consagradas. Não é mais como antigamente: CD e Louis Vitton. Criou-se uma dimensão que se não for enfrentada no curto prazo vai trazer danos irreparáveis para a nossa indústria.

Folha Online - E quanto aos gargalos da produção?
Vaz
- A Fiesp tem ainda uma atuação discreta, mas as câmaras setorias são uma alternativa para discutir dentro do próprio setor os gargalos de produção e pontos de conflito que devemos tratar preventivamente e não deixar que se tornem uma realidade para tentar consertar depois.

Folha Online - Como funcionaria isso?
Vaz
- São questões que envolvem diretamente o resultado das empresas. Estamos atuando de forma intensa com as cooperativas de crédito, com os arranjos produtivos locais e a questão de compatibilização de prazo de pagamento de impostos com prazos normais de venda, além de ampliar o debate sobre desoneração dos investimentos, que ainda afetam brutalmente um país que precisa investir em quase tudo.

Folha Online - A Fiesp ampliaria seu papel de meio para discutir melhor nas condições de investimentos?
Vaz
- Pensamos em uma carteira de fomento do nossa caixa para repassar recursos do BNDES para empresas paulistas que estão em desvantagem competitiva com outros Estados que ainda tem banco de desenvolvimento. São temáticas que podemos acelerar fortemente em benefício do crescimento sustentado da economia, que beneficia todas as empresas.

Folha Online - O sr. pretende definir uma prioridade, como a queda dos juros ou do spread, para as reivindicações da Fiesp ao governo?
Vaz
- Acho que focar uma prioridade é reduzir a discussão para uma porta milagrosa de saída. A redução de juros e de spread é importante, mas só a redução de juros e spread sem uma política firme de geração de empregos e ataque a uma infra-estrutura que está cada vez mais danificada e congestionada não resolve nada.

Folha Online - Então qual será o direcionamento?
Vaz
- O Brasil está pagando US$ 1 bilhão de extra taxa por atraso de navio. A gente não investe em porto e em conseqüência tem esse custo, que prejudica toda a nossa competitividade internacional. Isso é mais de 1% das nossas exportações. Então é assim: a política de juros e spread é uma prioridade, junto com a política de emprego e renda, com o destravamento do mercado interno e todas essas questões. Eu não me satisfaço em uma entidade como a Fiesp ter uma pauta restrita. A pauta restrita é simplificar a nossa atuação.

Folha Online - Serão então vários os temas considerados fundamentais para o desenvolvimento da indústria?
Vaz
- Temos de ter uma pauta que atenda à todos os setores, sejam exportadores ou atuantes no mercado interno; vinculados a investimentos ou ao consumo popular. O crescimento tem de ser um processo amplo, não pode ser emblema de um único setor. Se a indústria automobilística, siderúrgica e exportadora está bem, o Brasil está bem? Não é verdade. Precisamos tratar bem os fabricantes que trabalham com o mercado interno e que têm dificuldade de ampliar seus negócios porque o mercado interno, na sua média, ainda está fraco.

Folha Online - Na sua avaliação, por que neste ano a disputa para a presidência da Fiesp está tão acirrada?
Vaz
- O primeiro ponto é que a gestão Piva foi muito inovadora. Ele quebrou alguns paradigmas e enfrentou algumas questões próprias do nosso tempo. Quando você não se conforma em ser mais do mesmo, de alguma maneira pode gerar divergências internas.

Folha Online - A disputa acirrada é por conta das divergências?
Vaz
- Essa é uma das razões. Existem divergências internas muitas vezes mais de caráter pessoal do que institucional decorrente de uma própria característica da gestão de não ficar limitada apenas a fazer mais do mesmo.

Folha Online - Mas há algum outro motivo?
Vaz
O segundo ponto é que é natural que uma entidade que tem a dimensão da Fiesp e que hoje reestruturada, reposicionada, financeiramente sólida, desperte legítimos interesses de vários segmentos da indústria de São Paulo. A mudança das empresas para o interior também criou alguma redistribuição de forças políticas. Alguns setores não absorveram bem e isso tudo chega em um momento que essas divergências se explicitam.

Folha Online - Essa segmentação pode enfraquecer a Fiesp como instituição?
Vaz
- Isso tudo faz bem. É bom para a Fiesp debater o seu futuro, o que fez, o que tem de mais ainda para ser feito. Eu acho que o debate é positivo. A entidade ganha com ele.

Folha Online - Era esperado que setores como o siderúrgico apoiassem a sua candidatura e no entanto há uma segmentação. Como o sr. lida com isso?
Vaz
- O processo de apoio é um processo de apresentação de argumento e de convencimento do eleitor. O meu papel é ser consistente, ter conteúdo, ter consistência de propostas. O eleitor é absolutamente soberano. O meu processo é um combate insano de apresentar idéias, propostas. Mas claro que vou respeitar qualquer decisão que um setor tomar.

Folha Online - O sr. se mostrou otimista com o futuro. Acha que o crescimento da economia se sustenta?
Vaz
- Eu creio que as exportações vão continuar crescendo. Não vejo mudança de panorama. O próprio ministro Furlan já revisou para cima as sua estimativas. Penso que no ano que vem talvez um saldo como esse --que quase US$ 30 bilhões-- a gente não consiga, mas qualquer saldo de US$ 25 bilhões é um saldo magnífico.

Folha Online - Então, as exportações seguirão sendo o "motor"?
Vaz
- Eu acredito que exportações vão ser o ponto forte da economia nesse segundo semestre e também no ano que vem. Ou seja, o crescimento e a manutenção do saldo comercial vai existir. O investimento retorna com pouco de seletividade e ainda alguma timidez, mas a gente vê investimento no setor agroindustrial, no setor exportador, telefonia, um pouco em infra-estrutura elétrica. Isso vai continuar e fica a questão do mercado interno.

Folha Online - O sr. acredita em melhora do mercado interno?
Vaz
- Acho que vai ter uma melhora, mas o governo está tendo ainda uma visão muito dogmática da questão dos juros. Na realidade, o governo está com medo de ver o mercado interno crescer porque tem receio de uma retomada do processo inflacionário e prefere segurar o crescimento potencial do mercado interno porque acredita que o recrudescimento da inflação pode acontecer.

Folha Online - E o sr. acredita que nisso?
Vaz
- Não. Eu não acredito não e acho que a gente tem que ter a seguinte visão: o crescimento econômico é sempre um processo turbulento, não existe crescimento econômico com calma. A gente cresce superando um gargalo a cada momento e isso gera realmente tensões na economia e é claro que, para superarmos essas tensões, precisamos criar um ambiente favorável ao investimento.

Folha Online - E como se faz isso?
Vaz
- Para se criar um ambiente favorável ao investimento tem que dar continuidade ao processo de desoneração dos investimentos. Os investimentos no Brasil ainda pagam uma carga de tributos --a despeito do governo ter reduzido um pouco isso--, que é proporcionalmente absurda em relação a tudo que existe no mundo. Temos que cobrar imposto não sobre investimento, mas sobre produto e consumo. Vamos ter uma ativação melhor do mercado interno, nada de explosivo. O ano que vem é um ano de perspectivas favoráveis. Vejo o ano que vem como um ano bom.

Folha Online - Mas há muitos gargalos?
Vaz
- A gente vai enfrentar alguns gargalos especialmente na área portuária, preparação de infra-estrutura que sempre exige dois três anos de antecedência, alguns setores de bens de consumo que estão muito comprometidos com exportação vão precisar dar uma refreada em exportação para atender o mercado interno. Mas eu vejo com relativo otimismo.

Folha Online - Por que?
Vaz
- O que abortou os processo de princípio de crescimento do Brasil no passado? Foi sempre o setor externo. Nós sempre crescemos com base ou em endividamento ou em alguma forma de captação de capital externo e quando isso entrava num fim de ciclo porque o juro aumentava, porque o cenário internacional mudava, o princípio de crescimento murchava.

Folha Online - E isso mudou?
Vaz
- Neste momento, o setor externo está sendo a força do crescimento. Quer dizer, nós temos hoje uma força muito grande que é o nosso saldo comercial que diminui a nossa vulnerabilidade externa e faz com que esse recurso seja fruto de algum tipo de situação fora do nosso controle porque basta manter o perfil exportador que terá acesso a US$ 25 bilhões que no passado vinham só de empréstimos ou financiamentos.

Folha Online - O Brasil cresce mais 4% no ano que vem?
Vaz
- Você não imagina o potencial que tem esse país para crescer. Ainda cresce brincando, com o pé nas costas. Claro, com dificuldades, com gargalos e com muito trabalho, mas cresce.

Folha Online - Há disponibilidade de investimentos para sustentar o crescimento nos próximos anos?
Vaz
- Há mais disponibilidade do que se imagina. A primeira fonte de investimento é o resultado da operação e os setores exportadores, por exemplo, têm resultado. O BNDES tem orçamento que é de bom tamanho. Para setores exportadores, há acesso a crédito de mercado internacional. O próprio recebível das exportações dá lastro para financiamento internacional.

Folha Online - A alta dos juros nos EUA não vai prejudicar esse acesso ao financiamento externo?
Vaz
- O juro de mercado dos EUA já subiu. A gente tem que olhar no passado. Esse nível baixo de juros não existia quando o país cresceu 6%, 7% ao ano. O juro de mercado tem vida independente do Fed.

Leia mais
  • Federação concentra 40% do PIB nacional
  • Economista, Cláudio Vaz atua na indústria desde 1970
  • Skaf, de oposição, "vende" influência junto ao governo para se eleger na Fiesp

    Especial
  • Leia o que já foi publicado sobre a Fiesp
  • Leia mais notícias no Especial sobre a eleição na Fiesp
  •  

    Publicidade

    Publicidade

    Publicidade


    Voltar ao topo da página