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25/08/2005 - 12h04

Movimentos mundiais propõem calma contra correria no dia-a-dia

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TATIANA DINIZ
da Folha de S.Paulo

Correr, correr, correr. Acolhida em massa no final do século passado, a cultura de fazer o máximo possível num mínimo de tempo começou a enfrentar enfáticos questionamentos. Afinal, para que tanta pressa?

Colocando o pé no freio, movimentos mundiais deram largada ao culto à vagareza. Neles, desacelerar passou a ser a palavra de ordem. Em casa, no trabalho, nas relações e no ritmo interior, levar a vida com mais calma pode se transformar na tendência comportamental dos próximos anos.

A discussão é o tema principal do livro "Devagar" (ed. Record, R$ 40), do jornalista escocês Carl Honoré --que se autodefine como um "ex-viciado" em velocidade. Ele viajou o mundo rastreando indícios do movimento.

Em 350 páginas, Honoré introduz o leitor ao universo dos "desaceleradores do tempo" --organizações que decidiram combater a mania moderna de velocidade.

São grupos como o italiano Slow Food, que defende a alimentação sem pressa; o Città Slow, ou cidades do bem viver, onde diminuir o ritmo é lei; o japonês Clube da Preguiça; a norte-americana Fundação Longo Agora; e mesmo o SuperSlow, filosofia esportiva que recomenda musculação em câmera lenta.

O movimento conta até com uma conferência anual, a da Sociedade para a Desaceleração do Tempo, que usa a palavra "eigenzeit" --do alemão "tempo próprio"-- para resumir suas convicções. O evento acontece em Wagrain, cidade nos Alpes austríacos. No livro, Honoré adianta-se na defesa dos participantes:

"Os desaceleradores não são sobreviventes enferrujados da era hippie. Longe disto. São exatamente aqueles cidadãos ativos que encontramos em reuniões comunitárias em qualquer parte do mundo --advogados, consultores, arquitetos, médicos, professores."

Mas o que motivaria uma mudança de padrões tão brusca em pessoas que normalmente mantêm a urgência como marca de suas agendas? A incidência de doenças decorrentes desse estilo de vida é um dos motivos. Some-se a ela a insatisfação diante da incessante correria, sinalizam os especialistas. E, mesmo no cenário brasileiro já é possível encontrar exemplos de quem deu de ombros para a louvação à pressa e decidiu seguir seu caminho num ritmo mais tranqüilo.

A cirurgiã plástica Cristina Pires Camargo, 39, desistiu da dupla jornada. Durante quatro anos, ela trabalhou ao mesmo tempo na indústria farmacêutica e no consultório. Há três, abandonou a primeira opção. E mais: fechou a agenda às sextas-feiras, quando troca o expediente por partidas de tênis com os filhos.

"A gente não desacelera com medo de ser chamado de vagabundo, de preguiçoso. Antes eu não almoçava nunca e via meus filhos muito pouco. É legal financeiramente, mas não compensa. Se eu não estiver com eles agora, como vou querer que sejam meus amigos quando chegarem à adolescência?", diz.

Quando o publicitário José Buffo, 48, percebeu que precisava de férias, atinou que algumas semanas não seriam suficientes para reduzir o seu ritmo de vida. Desde que saiu da faculdade, a vida foi um corre-corre. "É da natureza dessa atividade. O pique sempre foi muito intenso. Eu estava, de fato, muito acelerado", diz. No ano passado, então, resolveu fazer uma pausa de 12 meses para uma "viagem interna". "Queria ficar comigo mesmo o maior tempo possível."

Além de se afastar da atividade profissional, ele também deixou de lado seus hobbies tradicionais. "Todo mundo tem uma válvula de escape, correr, nadar, mas isso também vira um compromisso sério, com hora na agenda. Não queria saber mais disso", lembra.

A primeira coisa a fazer foi... nada. "Nos dois primeiros meses, levantava cedo e fazia absolutamente nada. É uma boa maneira de meditar sobre a vida. Depois fiz algumas viagens, li alguns livros, fiz alguns cursos, mas me dava o luxo de interrompê-los quando eu bem entendia", afirma.

O publicitário também resolveu tirar o pé do acelerador, literalmente: "O carro deixou de existir para mim. As pessoas são dependentes de carro. Saía de bicicleta, de ônibus, a pé. O cenário é outro, muda completamente".

Quando voltou ao trabalho, ele diz ter experimentado a sensação de ser "um estranho no ninho". "Voltei muito mais desacelerado. Hoje, quando tenho que trabalhar até mais tarde num dia, compenso no outro. Antes eu não sabia fazer isso. Precisei sair fora para perceber que ninguém é insubstituível. O mundo não pára."

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