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01/09/2008 - 07h56

Monges visam apoio do Brasil contra junta de Mianmar

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CLARA FAGUNDES
da Folha de S. Paulo

As decisões do Brasil terão peso na abertura política de Mianmar (ex-Birmânia), afirmam monges birmaneses exilados que vieram ao país pedir apoio ao embargo à venda de armas para a junta militar, no poder desde 1962. Para o monge Ashin Nayaka, ativista e professor visitante da Universidade Columbia (Nova York), seu país só não é palco de um novo levante popular semelhante ao de setembro último porque a repressão impede.

Falando à Folha, Nayaka disse querer que o Brasil use suas boas relações com a China e outros fornecedores de equipamentos militares da junta para pressioná-los em fóruns internacionais a aceitar o embargo. O monge agradeceu o apoio brasileiro às resoluções críticas ao regime, mas disse que, como "líder no âmbito Sul-Sul" e "aspirante à vaga permanente no Conselho de Segurança da ONU", o país pode fazer mais.

Arte Folha Online
mapa mianmar

Com os colegas Ashin Agga Dhamma e Ashin Kawwida, da IBMO (Organização de Internacional de Monges Birmaneses), na sede da ONG Conectas, disparou: a cúpula militar deveria ser julgada por "crime contra a humanidade" no Tribunal Penal Internacional --alternativa descartada pela China e Rússia, com poder de veto no CS da ONU.

Os dois países, a Índia e a Ucrânia são os principais fornecedores militares de Mianmar --um país pobre, mas de vultuoso mercado militar. As Forças Armadas consomem cerca de 40% do Orçamento, contra 3% gastos com saúde. Sem inimigos externos, a principal missão do Exército é sufocar as tentativas de desestabilizar o governo, quase sempre iniciadas nos mosteiros.

"Somos uma das organizações democráticas mais antigas do planeta", sorri Kawwida. Sustentados por doações, os monges birmaneses são responsáveis por serviços sociais básicos e estiveram à frente de grandes revoltas, como o levante contra o domínio britânico na década de 30. "Os monges também passam fome quando o povo não tem o que comer", diz Nayaka, explicando o histórico de mobilização.

Em 1988, os três Ashin participaram dos protestos pró-democracia, que culminaram nas primeiras eleições livres em quatro décadas. Vencida pela oposicionista Aung San Suu Kyi, a votação foi anulada, e uma caçada aos opositores abortou o suspiro democrático. Nayaka e Kawwida deixaram o país. Dhamma foi torturado e preso por cinco anos. "Mas tive sorte", diz. Libertado em 1995, foi sorteado na loteria do "green card" --visto que permite a imigração aos EUA.

Os monges voltaram a tomar as ruas em setembro de 2007. A repressão esvaziou mosteiros e resultou em milhares de prisões. Sob pressão da ONU, a junta escreveu uma Constituição --reservando aos militares 25% do Parlamento e a prerrogativa de dissolver o governo-- e convocou um referendo para ratificar a Carta, que prevê eleições em 2010.

Farsa eleitoral

Às vésperas do referendo, o ciclone Nargis varreu Mianmar, matando 80 mil pessoas, no temporal mais mortífero do século 21. Os militares relutaram em aceitar ajuda externa e mantiveram a votação --nas zonas mais atingidas, o pleito foi adiado por duas semanas.

Apesar da calamidade e dos milhões de desabrigados, oficialmente a vitória da junta foi esmagadora. Sem escrutínio da oposição ou de observadores internacionais, o governo divulgou a participação de quase 99% dos eleitores, com mais de 92% de aprovação à Carta. "Foi uma piada", resume o brasileiro Paulo Sérgio Pinheiro, relator especial da ONU para Mianmar de 2000 até abril último.

Denunciar a "farsa eleitoral" e conclamar o Brasil a não reconhecê-la foi uma das principais razões da visita dos monges, em agosto. "Não há uma transição democrática; as eleições de 2010 são parte do processo de consolidação do autoritarismo", concorda Pinheiro. A junta estendeu no mês passado a prisão domiciliar a Suu Kyi e, segundo a IBMO, ao menos 3.000 presos nos protestos de setembro continuam detidos.

A reação brasileira à visita dos monges foi tímida. Na terça-feira, a Câmara dos Deputados, cujo Comitê de Direitos Humanos reuniu-se com os religiosos, aprovou uma nota pública de repúdio às violações de direitos humanos. O Itamaraty não se posicionou sobre o referendo, "questão interna do país", e disse que não há previsão de sanções à junta.

 

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