NOSSOS
COLUNISTAS

Amir Labaki
André Singer
Carlos Heitor Cony
Carlos Sarli
Cida Santos
Clóvis Rossi
Eduardo Ohata
Eleonora de Lucena
Elvira Lobato
Gilberto Dimenstein
Gustavo Ioschpe
Helio Schwartsman
José Henrique Mariante
Josias de Souza
Kennedy Alencar
Lúcio Ribeiro
Luiz Caversan
Magaly Prado
Marcelo Coelho
Marcelo Leite
Marcia Fukelmann
Marcio Aith
Melchiades Filho
Nelson de Sá
Régis Andaku
Rodrigo Bueno
Vaguinaldo Marinheiro

Carlos Heitor Cony
cony@uol.com.br
  26 de setembro
  A selva do asfalto
   
   

Um filme de John Houston, creio que dos anos 50, tinha no original o título de "Selva do asfalto". No Brasil, virou "O segredo das jóias" e foi, se não me engano, o primeiro filme em que Marilyn Monroe apareceu nos créditos.

Era um policial. No final, um inspetor mostra o rádio que recebe as mensagens das rádio-patrulhas que rondam a cidade. No painel central, as luzes piscam, as vozes se sucedem, atropelamento na rua 18, homem espanca mulher na 22, um cadáver boiando no rio, briga numa boate de travestis, mulher pedindo socorro na ponte, assalto a mão armada na loja Macy's. E por aí vai.

De repente, o inspetor desliga o painel e as luzes não piscam mais, as vozes emudecem. O silêncio é total. E ele diz: "Se desligarmos essa joça, resta o silêncio. A selva de asfalto não faz nenhum ruído. Há assassinatos, roubos, estupros, suicidas, a vida humana em seu limite de dor, mas tudo está em silêncio, a selva emudeceu mas continua viva."

A Internet tem alguma coisa a ver com essa imagem da selva emudecida. Nós entramos nela e ficamos sabendo que fulano está traindo sicrano, que Maria nos manda um beijo e o PT fará assembléia geral em Santo Amaro. Alguém reclama da taxa de água de Florianópolis e uma jovem acusa o patrão de assédio sexual. Antônio quer saber porque não fiz isso ou aquilo e Luiz me envia o seu exame de sangue, está com aids.

Desligo o computador. A tela escurece. Não emite nenhum ruído, nenhuma imagem. Mas tudo continua acontecendo, encontros e desencontros, traíções e dedicações, deslumbramentos e decepções.

A tela continua apagada, escura, um pedaço arrancado da selva misteriosa, onde a humanidade, por isso ou aquilo, geme, goza, palpita e sofre - mas tudo está parado, tudo parece morto.


Leia colunas anteriores

19/09/2000 -
O frágil lenho
12/09/2000 -
O Homem e o animal
05/09/2000 -
Salto em rede
29/08/2000 -
Mundo infanto-juvenil
22/08/2000 - Pró e contra o mundo virtual


| Subir |

Biografia
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A - Todos os direitos reservados.