|
Um
filme de John Houston, creio que dos anos 50, tinha no original
o título de "Selva do asfalto". No Brasil, virou
"O segredo das jóias" e foi, se não me engano,
o primeiro filme em que Marilyn Monroe apareceu nos créditos.
Era um policial. No final, um inspetor mostra o rádio que
recebe as mensagens das rádio-patrulhas que rondam a cidade.
No painel central, as luzes piscam, as vozes se sucedem, atropelamento
na rua 18, homem espanca mulher na 22, um cadáver boiando
no rio, briga numa boate de travestis, mulher pedindo socorro na
ponte, assalto a mão armada na loja Macy's. E por aí
vai.
De repente, o inspetor desliga o painel e as luzes não piscam
mais, as vozes emudecem. O silêncio é total. E ele
diz: "Se desligarmos essa joça, resta o silêncio.
A selva de asfalto não faz nenhum ruído. Há
assassinatos, roubos, estupros, suicidas, a vida humana em seu limite
de dor, mas tudo está em silêncio, a selva emudeceu
mas continua viva."
A Internet tem alguma coisa a ver com essa imagem da selva emudecida.
Nós entramos nela e ficamos sabendo que fulano está
traindo sicrano, que Maria nos manda um beijo e o PT fará
assembléia geral em Santo Amaro. Alguém reclama da
taxa de água de Florianópolis e uma jovem acusa o
patrão de assédio sexual. Antônio quer saber
porque não fiz isso ou aquilo e Luiz me envia o seu exame
de sangue, está com aids.
Desligo o computador. A tela escurece. Não emite nenhum ruído,
nenhuma imagem. Mas tudo continua acontecendo, encontros e desencontros,
traíções e dedicações, deslumbramentos
e decepções.
A tela continua apagada, escura, um pedaço arrancado da selva
misteriosa, onde a humanidade, por isso ou aquilo, geme, goza, palpita
e sofre - mas tudo está parado, tudo parece morto.
Leia colunas anteriores
19/09/2000 - O
frágil lenho
12/09/2000 - O
Homem e o animal
05/09/2000 - Salto
em rede
29/08/2000 - Mundo
infanto-juvenil
22/08/2000
- Pró
e contra o mundo virtual
|