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Cotidiano

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Marcos Augusto Gonçalves

Princesinha do mar

Revisito Copacabana, bairro em que vivi, uma referência de cidade compacta e convívio democrático

O sol ilumina a areia branca e faz cintilar o mar de Copacabana, que vejo pela janela do lobby do hotel, enquanto escrevo, nesta manhã de sábado na Cidade Maravilhosa.

Copacabana não me engana. Passei aqui bons anos de minha infância, adolescência e juventude. Morei no Posto 6, a ponta oposta ao Leme. Gostava de seguir pelas ruas o poeta Drummond, que tinha seu apartamento na Conselheiro Lafayette. Via sempre Mário Lago pelas redondezas, e meu pai certa vez apresentou-me a dois de seus ilustres colegas de copo, do Bar dos Caixotes -o compositor Dorival Caymmi e o maestro Radamés Gnatalli. O bar ficava na Francisco Sá, uma porta, um balcão e um espaço um pouco maior aos fundos. Caixotes de madeira serviam de banco para os frequentadores.

Na mesma rua, na esquina com a Nossa Senhora de Copacabana, ficava o Bar Bico, que ainda existe. Ali, torcedores do Flamengo se encontravam de camisa e bandeiras para tomar uma cerveja e pegar o ônibus rumo ao Maracanã.

Àquela altura, Copacabana já era famosa como um caso de alta densidade populacional. Excitava minha imaginação a ideia de que se todos os moradores descessem de seus apartamentos ao mesmo tempo não haveria espaço nas ruas para tanta gente. Será verdade? Não sei, parece que sim -falava-se isso, pelo menos, naquela época.

Em 2010, o Censo do IBGE mostrou que o bairro na verdade não é tão povoado assim. Abrigava, há três anos, 150 mil residentes. Os edifícios são grudados uns nos outros, mas as quadras têm espaços internos. Deveriam servir como áreas coletivas, mas na realidade esse uso, previsto na década de 1940, nunca aconteceu direito. Os espaços foram apropriados pelos apartamentos térreos ou utilizados como garagens para os automóveis.

Esse vazio no meio dos lotes facilitou a escolha de apartamentos de fundos, que muita gente prefere para escapar do movimento e do barulho das ruas e avenidas.

Na década de 1970 acompanhei o aterramento da praia, para dar lugar aos atuais calçadões da avenida Atlântica, lindíssimos, com mosaicos de pedra projetados por Burle Marx. E também acompanhei o processo de decadência da Princesinha do Mar, que foi perdendo prestígio para Ipanema e Leblon -bairro em que ainda peguei ruazinha de chão de terra.

Depois dessa fase deprimente de Copacabana, que coincidiu com um período de deterioração mais ou menos generalizada da cidade, ela está aqui, viva. Quase que uma enseada, é a mais bela praia da cidade, pelo menos aos meus olhos, com sua curva sensual e o Pão de Açúcar ao fundo.

Hoje, quando o Rio prospera e se reconcilia com seu destino de centro irradiador e cidade símbolo do país, Copacabana também se reencontra. Uma cidade dentro da cidade, rica, pobre, classe média, cafona, bela, turística, mítica e real.

E o conceito do bairro também revive -urbanistas hoje concordam que é uma referência de cidade compacta e democrática, como a convivência dos usos residencial e comercial, os prédios com lojas no térreo, a facilidade de transporte, a convivência de classes.

São características lembradas hoje em São Paulo, em conversas sobre a revalorização do centro e a reconfiguração da cidade, que foi investindo nos "subúrbios" residenciais e na segregação dos condomínios fechados. Copa na Pauliceia. Pena que não dá pra trazer a praia.


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