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Dez anos depois, Estatuto do Idoso ainda engatinha
Envolvidos na aplicação da norma criticam a falta de políticas públicas
Apesar dos problemas, analistas dizem que foram conquistados avanços e benefícios na última década
O Estatuto do Idoso, que completa dez anos na terça, ainda é uma criança que esperneia para ser ouvida e ganhar a atenção da sociedade.
A avaliação é de protagonistas da aplicação do documento em setores como o Judiciário, o Legislativo, entidades não governamentais e representativas do grupo.
O senador Paulo Paim (PT-RS), autor do projeto de lei que se transformou no estatuto, diz que o documento "vem cumprindo seu papel", mas declara que a necessidade de avanços "é inegável".
"O estatuto foi uma grande conquista do povo brasileiro e muitos de seus aspectos têm sido aplicados. Milhões de idosos carentes passaram a receber um benefício social, nos transportes há a gratuidade e a prioridade existe em diversos setores."
Paim acredita, porém, que falta uma "reeducação da sociedade" para olhar com "mais carinho" para os idosos e também uma valorização no aspecto financeiro.
"Uma grande lacuna deixada pelo estatuto e que é causa da maioria das reclamações que recebo é a diminuição dos recursos que recebem os idosos com pensões e aposentadorias. Os salários dos mais velhos aumentam praticamente a metade do que cresce o salário mínimo."
Mas é na Justiça que o desrespeito ao estatuto mais aparece. Na Defensoria Pública de São Paulo, há diversos processos tentando garantir medicamentos, alimentação específica e itens como próteses dentárias e bengalas --todos garantidos no estatuto.
"Houve avanços, mas tudo esbarra na falta de política pública que efetive financiamentos para as demandas", afirma a defensora Aline Maria Fernandes Morais.
Coordenadora do Núcleo Especializado no Direito do Idoso, Morais alerta que também há vácuos que garantam a segurança dos idosos.
"Filhos que não trabalham e fazem uso de álcool ou de drogas estão tornando os pais idosos vítimas de violência psicológica e financeira. Eles obrigam a retirada de empréstimos consignados às pensões ou às aposentadorias e deixam o familiar endividado por longos anos."
Gerontóloga do Instituto Velho Amigo, ONG que dá residência a 1.282 idosos em São Paulo, Mayra Cristiane Tocappo afirma que uma "questão cultural" atrapalha o desenvolvimento do estatuto.
"Ainda não há um reconhecimento da velhice como um desafio social. As universidades não colocam em seus currículos, como obriga o estatuto, disciplinas para discutir a questão. Parte da sociedade e dos próprios idosos também não faz reflexão sobre esse momento da vida."
Nazareth Lemos Maldonado, 74, usa vários pontos do estatuto, e diz que os assentos reservados são mais respeitados, por exemplo. Mas alerta: "Falta divulgação de como tratar um idoso. Há filhos sem paciência com os pais, que se esquecem do ritmo mais lento".