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Leão Serva

Leis simples, cidade limpa

Estão tramitando na Câmara de São Paulo leis que criam exceções e permissões para publicidade na cidade

A Lei Cidade Limpa, de 2006/7, é muito elogiada por todo mundo pela redução da poluição visual na cidade de São Paulo. Mas além do avanço sobre o excesso de publicidade externa, sua maior contribuição para a sociedade talvez não tenha sido perfeitamente percebida.

O espírito da lei, por assim dizer, é a simplicidade de suas disposições. É o que faz com que todo cidadão saiba reconhecer entre certo e errado, possa cobrar dos outros o respeito à regra e identificar quando o agente público é leniente.

Normalmente as leis brasileiras são tão complicadas que é necessário grande conhecimento técnico para compreendê-las. A falta de transparência que decorre desse hermetismo torna difícil o crivo dos homens comuns e impõe a necessidade de "doutores da lei" para avaliar o seu cumprimento: como os auditores e fiscais que tão frequentemente vemos ser acusados de irregularidades.

Casos paradigmáticos de sucesso de leis simples são tão antigos quanto a própria humanidade. Pense em um exemplo bíblico: imagine se Moisés, ao descer do Monte Sinai, trouxesse sob o braço um volume como a Constituição brasileira ou mesmo o Código de Obras e Edificações da cidade de São Paulo. O Deus de Abraão não teria conquistado a maior parte da população do mundo, que estaria até hoje adorando carneiros de ouro ou deuses politeístas.

O sucesso dos Dez Mandamentos repousa exatamente em sua clareza e concisão. "Não matarás": não é necessário abrir um concurso de auditor para avaliar se essa determinação está sendo cumprida ou não; nem mesmo é preciso contratar um despachante para acompanhar o processo de avaliação.

O conjunto de regras para a publicidade externa em São Paulo em vigor até 2006 era um exemplo perfeito desse problema típico das leis feitas no Brasil, seguindo uma tradição da administração pública portuguesa. Era um cipoal de regras, em que inclusive conviviam dois tipos de direitos, conforme o ano de implantação de um outdoor. Ou seja: virtualmente impossível saber quando uma propaganda externa era legal ou ilegal.

Foi por essa razão que, ao fim de seu mandato, a prefeita Marta Suplicy, buscando combater a profusão de placas irregulares e piratas, tentou implantar umas viaturas, futuristas como os carros do Google Street View, com filmadoras sofisticadas ligadas a GPS, para localização, e sistemas de computador para fazer o cruzamento entre os alvarás de cada placa de propaganda e os complicados códigos em vigor. Eram chamadas "Tigrão" e logo ao virar piada foram esquecidas.

É essa complicação das leis que gera oportunidades para quem quer vender facilidades.

No momento em que o país acompanha tantas acusações de envolvimento de agentes públicos em irregularidades na fiscalização de leis, o espírito do Cidade Limpa deveria inspirar os legisladores. No entanto, nesse mesmo momento, tramitam na Câmara Municipal de São Paulo, à espera de segunda votação, várias leis que criam exceções e permissões discricionárias para publicidades: em ônibus, táxis, templos religiosos, clínicas médicas etc. e tal, em um conjunto já apelidado de "Lei Cidade Suja".

É como se os vereadores de São Paulo quisessem complicar exatamente a única lei que teve sucesso por sua simplicidade. Criar dificuldades para alienar o cidadão.


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