Saltar para o conteúdo principal Saltar para o menu
 
 

Lista de textos do jornal de hoje Navegue por editoria

Cotidiano

  • Tamanho da Letra  
  • Comunicar Erros  
  • Imprimir  

Minha História

Sem descanso

'Só desisto quando eu morrer e, mesmo morto, se der, continuarei procurando', afirma empresário sobre filho que sumiu há 29 anos

ELIANE TRINDADE DE SÃO PAULO

Meu coração diz que meu filho está vivo. E olha que, depois de dois infartos, ele não bate muito forte. Minha mulher desenvolveu cinco doenças autoimunes, toma 18 medicamentos por dia.

O desaparecimento do Marco Aurélio matou metade da nossa vida. Mas temos esperança. Por que vou dizer que meu filho está morto se não tenho uma única prova?

Ao longo da investigação, configuraram-se algumas hipóteses. A primeira é que teria fugido. Foi descartada, pois ele deixou dinheiro e documento. Foi morto? A polícia concluiu que não houve crime. Outra hipótese é a de que ele se acidentou. Como, se não se achou o corpo ou um fio de cabelo? Fizeram a maior busca de que se tem notícia na área.

Não me conformei quando o tenente me disse que não tinham mais o que fazer, após um mês de varredura. O inquérito tem 200 páginas e nenhuma conclusão. Começou a surgir todo tipo de história, até a de que Marco Aurélio fora levado por extraterrestres.

Imagina a cabeça da gente como fica. Pra mim só há uma possibilidade: ele está vivo. Por isso, continuamos a buscá-lo. Já espalhamos mais de 27 mil cartazes pelo Brasil. Dois livros foram escritos. Tenho caixas de reportagens.

Fizemos uma montagem fotográfica de como nosso filho seria hoje, com base na fisionomia do irmão gêmeo, Marco Antônio, de 44 anos.

Videntes disseram que Marco Aurélio estava desmemoriado. Fomos ao Chico Xavier [médium morto em 2002]. Perguntei: Meu filho está vivo ou morto?'. Chico respondeu: Eu só me comunico com desencarnados'.

Andei pelo Brasil inteiro. Uns cinco anos depois do desaparecimento, fomos a Ouro Fino (MG), onde um rapazinho dizia que era Marco Aurélio. A TV Globo mandou uma equipe junto. Chegamos lá e não é que o moleque parecia com meu filho? Ele disse: Ô, pai, ô, mãe'. Só que ele tinha uma cicatriz de cirurgia horizontal na barriga. A do nosso era vertical. Perguntei por que mentiu. Ele queria vir morar com a gente. Minha mulher ainda assim queria trazer o moleque.

Depois, apareceu um outro no interior de Minas dizendo ser sua reencarnação. Ouvi de especialistas que meu filho vive em um outro planeta. Em 1986, fui a Brasília procurar o general Alfredo Uchôa [estudioso de ufologia, morto em 1996]. Ele falou que podia se comunicar com seres de outros planetas e eles devolveriam meu filho, mas podia ser em qualquer lugar, aqui ou no Japão.

Sem falar nas tentativas de extorsão. Um rapaz queria que eu pagasse as passagens para ele ir atrás do Marco Aurélio. Outro me procurou para fazer uma marcha a pé até o Uruguai, desde que pagássemos os bilhetes de volta.

São tantas histórias que fiquei vacinado. Teve também crueldade. Na primeira noite de Natal após o sumiço, um homem de Mato Grosso telefonou: Seu filho está morto. Vocês nunca vão achar. O chefe fez picadinho dele'.

Aprendemos a fazer festa sem ele pelos nossos outros quatro filhos. A caçula, quando tinha dez anos, falou para a mãe: Será que também temos que desaparecer pra você falar da gente?'.

A vida continua, mas não posso ignorar que meu filho desapareceu da face da Terra. Só desisto quando eu morrer. E, se morto eu puder ajudar, continuarei procurando.


Publicidade

Publicidade

Publicidade


Voltar ao topo da página