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Moda bombril

Estilista Ronaldo Fraga leva seu desfile da SPFW para CEU no Butantã e explica o uso da palha de aço no cabelo das modelos

LAURA CAPRIGLIONE DE SÃO PAULO

"Toda menina sabe o que significa ser xingada de 'cabelo de bombril'", dizia a uma amiga Isabela Alves de Andrade, 10, aluna do 6º ano do Centro Educacional Unificado, CEU, do Butantã, na zona oeste de São Paulo.

"É cabelo duro, cabelo ruim", explicou a menina, dona de muitos cachinhos. E apressou-se a emendar: "Mas eu não concordo. Para mim é só uma questão de moda".

O estilista Ronaldo Fraga nem tinha saído ainda da polêmica em que havia se envolvido com o rapper Emicida -que o acusou de racista por realizar na terça-feira desfile na São Paulo Fashion Week em que todas as modelos usavam uma espécie de peruca feita de bombril- e partiu para o ataque.

À frente de um batalhão de 25 modelos, as mesmas que protagonizaram o desfile polêmico -mais maquiadores, produtores e iluminadores- Fraga aterrissou ontem em uma escola pública na periferia de São Paulo. Entre os alunos, vários fãs de Emicida.

Repetiu o desfile dentro do CEU Butantã, inclusive com o bombril da discórdia nas cabeças das modelos.

Os 450 alunos assistiram em completo silêncio à apresentação. E irromperam em aplausos ao final.

Foi a primeira vez em que um desfile da SPFW saiu do confortável prédio da Bienal, no Ibirapuera, para pegar o rumo das franjas da cidade.

Na plateia, em vez dos aficionados típicos, sempre de óculos escuros, taça de champanhe e brindes de patrocinadores nas mãos, eram estudantes do ensino fundamental, a maioria do 9º ano, uniformizados, além de pais que acompanharam a atividade, aberta à vizinhança.

Nas salas de aula transformadas em camarim das modelos, Fraga confessava o nervosismo. "Esta será a primeira vez em que explicarei o desfile antes de ele acontecer." E assim foi.

A coleção inspirou-se no futebol, esporte trazido ao Brasil por um inglês, Charles Miller, e que foi praticado por atletas da elite (os uniformes eram feitos de seda e linho), até que os negros e mestiços entraram no jogo e importaram da capoeira a ginga, transformada em drible.

"Foi a primeira vitória da mestiçagem brasileira", ensinou Fraga. Assistia à aula, entre alunos e professores, o prefeito Fernando Haddad, em rara folga dos temas de enchente e inspeção veicular.

HOMENAGEM RACISTA

O que se viu foram roupas coloridas como os uniformes de times, sapatos à moda de chuteiras estilizadas, bolsas em forma de bolas de futebol. Mas, e o tal do bombril?

"Para você que achou que pintar modelo branca de negra era o auge do racismo, olha aí outra homenagem", acusou o rapper Emicida no Twitter, referindo-se ao desfile de Fraga. Gean Oliveira, um dos muitos que repercutiram a acusação, atacou: "Não tenho palavras para comentar o desfile do Ronaldo Fraga no SPFW. Homenagem racista não precisamos".

Mas o estilista, em uma evocação que parecia propaganda das 1001 utilidades da esponja de aço, respondeu que o bombril foi fundamental para a imagem (literalmente) do futebol.

"O sinal fraco das transmissões fazia com que só graças ao bombril espetado nas antenas de TV a gente pudesse assistir às partidas." Pronto. Não era referência nenhuma aos negros ou mestiços, soube-se ontem.

Perguntado por uma aluna sobre como se sentiu com a polêmica da palha de aço, Fraga respondeu: "Uma vez que você coloca o pé para fora de casa, corre o risco do desentendimento. Isso é a cara do nosso tempo."

Convenceu Bruna Marques, 14, aluna do 9º ano. "Depois de ver o desfile e com as explicações dele, tenho certeza que foi um erro de interpretação. Estava claro que o bombril não teve a intenção de humilhar ninguém, até porque as modelos estavam todas lindas e maravilhosas."

A menina Isabela também, apesar de já ter ouvido tantas vezes a expressão "cabelo de palha de aço" ser usada como xingamento, rendeu-se à "maravilha" (a expressão é dela) de um vestido cheio de brilhos, mostrado por Fraga.

"Eu usaria um desses, com certeza". E foi embora, certa de que, quando crescer, vai trabalhar "com isso".


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