São Paulo, sábado, 18 de setembro de 1999


 


Procura-se doador de
trabalho especializado


BEL MOHERDAUI
da Equipe de Trainees

Não basta apenas doar o que quiser, quando puder. Entidades beneficentes valorizam cada vez mais as pessoas que utilizam sua especialização profissional no trabalho voluntário e que levem essa atuação a sério, com mais responsabilidade _até com dias e horários fixos para a doação.
Essa tendência foi observada por 14 pesquisadores e profissionais da área ouvidos pela Folha.
As instituições buscam o médico que seja voluntário do ambulatório, o administrador que ajude na gestão, o diretor de marketing que divulgue a entidade.

Funções mais requisitadas


“É muito desperdício trazer uma pessoa que tem uma habilidade específica, por exemplo, na área contábil, para ser o Papai Noel da festa de final de ano”, afirma Mário Aquino Alves, pesquisador do Centro de Estudos do Terceiro Setor da FGV, embora ele mesmo se passe por Papai Noel no Natal. “Você tem que chamar essa pessoa para arrumar o livro-caixa da entidade.”
Segundo Alves, o indivíduo que utiliza sua capacidade profissional no trabalho voluntário pode ser mais bem aproveitado do que o que faz “tudo”, porque estará doando aquilo que faz melhor.
Outra vantagem de aproveitar o voluntário profissional é evitar a alta rotatividade na instituição. Fazendo o que sabe, ele se envolve mais e colabora por mais tempo.
Além disso, de acordo com o pesquisador, o voluntário tem na instituição uma possibilidade de aperfeiçoamento profissional.
“O trabalho que ele faz na organização serve de treinamento para desenvolver habilidades que o ajudem a arranjar emprego.”
Em algumas entidades, como a Associação Monte Azul, que faz trabalhos de educação, saúde e cultura com comunidades carentes, o voluntário pode vir a ser um funcionário remunerado. “Quando o trabalho dá muito certo e a gente precisa muito daquele profissional, acabamos contratando o voluntário para que ele fique aqui por mais tempo”, diz Lia Lima, 37, coordenadora do voluntariado da associação.
É o caso de Aureliane Lira, 35, responsável pela área de crianças especiais, que ficou um mês e meio na instituição como voluntária e acabou sendo contratada.

COMPROMISSO
Há mais uma mudança que atinge os voluntários: a cobrança, cada vez mais frequente, de um comprometimento maior com a instituição. De acordo com as necessidades da organização, o voluntário deve ter uma função, estabelecer uma rotina e cumpri-la.
Na AACD (Associação de Assistência à Criança Defeituosa), a responsabilidade do voluntário é levada tão a sério que ele assina livro de ponto todos os dias em que comparece à entidade (leia texto ao lado). Se tiver quatro faltas consecutivas ou oito alternadas, sem justificativa, pode ser dispensado do voluntariado.
“O conceito de voluntário está se diversificando. Agora, há o profissional de alto nível que doa duas ou três horas por semana e capacita as pessoas da entidade. É o voluntário que as instituições não poderiam pagar”, diz Rosa Maria Fisher, do centro de estudos de terceiro setor da USP.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.