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Trabalho é tão ideológico quanto a ideologia que quer combater

IDELBER AVELAR ESPECIAL PARA A FOLHA

O "Guia Politicamente Incorreto da História do Mundo", de Leandro Narloch, é o livro de um prosador hábil.

De Galileu a Gandhi, da Revolução Industrial a Maio de 68, o autor elege bem os moinhos de vento contra os quais lutará. Da tese de que a era medieval teria sido de trevas à de que o socialismo real fora desprovido de atrocidades, as narrativas contra as quais Narloch se insurge são caricaturas, bichos-papões.

Nessa insurgência opera uma lógica rudimentar, que isola dois elementos no tempo ou no espaço e pressupõe a conexão causal que quer demonstrar, ignorando toda a contraevidência.

Ao listar bizarrices dos regimes comunistas, o livro encontra uma de suas boas vocações, a de ser libelo satírico. Quando tenta argumentar, é de um simplismo atroz.

O livro isola casos de ditaduras africanas de seu contexto anterior de colonialismo e escravidão, lista absurdos de ditadores reais e conclui que "quem destruiu a África foram os líderes africanos".

Justapõe as expectativas de vida antes e depois da Revolução Industrial, constata o aumento, ignora o que possa perturbar a equação entre qualidade e quantidade e conclui que a mecanização foi a melhor coisa que poderia ter acontecido aos pobres.

Lista o número de pessoas a quem a comida com agrotóxicos alimenta hoje para sugerir quanta gente estaria faminta caso o mundo ainda dependesse da agricultura orgânica familiar.

Arrola superficiais coincidências na linguagem sobre o Estado nos textos nazista e comunista para propor uma equivalência entre os dois. No limite do mau gosto, lista as baixas de uma possível invasão por terra dos EUA ao Japão em 1945 e deduz quantas vidas foram "salvas" pelas bombas de Hiroshima e Nagasaki.

E assim por diante, em operações de penoso primarismo argumentativo, pelas quais o livro termina sendo tão ideológico quanto a ideologia que quer combater.

Como sempre ocorre quando o epíteto "politicamente incorreto" é usado com pretensão de heroísmo, apresenta-se uma versão dominante da história, a que confunde os interesses dos poderosos com os da humanidade, como se essa versão fosse minoritária, maldita e, ao mesmo tempo, a única sensata.

Daí não se conclua que o livro é desprovido de interesse. Pelo talento narrativo do autor, ele deve fornecer os exemplos preferidos de história universal dos comentaristas de portais da internet.


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